por Margarida Telles, da Época São Paulo
Em Mudança de Hábito, famoso filme de 1992, a cantoria de um coral gospel comandado por Whoopi Goldberg traz alegria para a vizinhança e aproxima a igreja da comunidade que a cerca. Na vida real, a história é diferente. No último ano, pela primeira vez os templos religiosos lideraram o ranking das queixas por barulho feitas ao Ministério Público Estadual de São Paulo, posto antes ocupado pelos bares.
Isso significa que muita gente tem ligado para o Programa de Silêncio Urbano (Psiu) para reclamar da prece de seus vizinhos, já que existem cerca de 22 mil templos na capital paulista, contra os mais de 55 mil restaurantes, casas noturnas e similares, segundo o jornal O Estado de S. Paulo.
O designer Valter de Oliveira Silva (foto) é um dos incomodados pela cantoria alheia. Mesmo morando no décimo andar, consegue ouvir em alto e bom som a música que vem da Assembléia de Deus próxima à sua casa, na Vila Gumercinda. A igreja possui todo um aparato de amplificadores, coral, orquestra e até um mezanino próprio para os músicos, mas a isolação acústica deixa a desejar. “Não é que a música seja ruim, mas é péssimo não ter a opção de ficar em silêncio”, diz o designer, que acompanha religiosamente os cultos nas noites de sexta, sábado e domingo, independente de sua vontade.
Valter não está sozinho. Além de seus vizinhos, muitas outras pessoas querem falar sobre os incômodos gerados por alguns templos religiosos. O site Deus não é surdo (www.deusnaoesurdo.com.br), criado em 2006, é um exemplo. Com o slogan "Seja um crente decente, não grite no ouvido da gente" e mais de um milhão de acessos, o endereço reúne relatos de pessoas obrigadas a conviver com o barulho gerado pelas igrejas.
Os criadores do site, o analista de sistemas Leandro Zavitoski e seu irmão, Mário Luis Zavitoski Júnior, sabem exatamente como é morar ao lado de uma igreja que supera os 65 decibéis permitidos por lei para áreas mistas da cidade - que abrangem estabelecimentos comerciais e residências.
Os irmãos mudaram-se para uma casa no bairro do Limão, na zona norte de São Paulo, em 2006. Mas logo no primeiro final de semana, descobriram que qualquer traço de simpatia da nova moradia acabava assim que os membros da igreja ao lado ligavam os amplificadores para o culto. “As coisas próximas à parede que separava a nossa casa da igreja tremiam com o barulho. Não dava pra conversar ou trabalhar, era um inferno”, conta Leandro.
Os irmãos Zavitoski tentam abaixar o tom da reza conversando com os membros da igreja. Sem um acordo com os religiosos, Leandro ligou para o Psiu diversas vezes, mas não teve as suas queixas ouvidas. “A solução que encontramos foi criar o site, e vimos que existe muita gente na nossa situação”, afirma o analista de sistemas.
O Deus não é surdo tem um ranking das igrejas mais barulhentas, atualmente liderado pela Universal do Reino de Deus, e uma seção dedicada às “igrejas legais”, para valorizar os templos que respeitam os ouvidos do próximo e praticam uma política da boa vizinhança. Mas a área com maior participação dos internautas é a dos desabafos. E a reclamação mais comum nos relatos está ligada à falta de iniciativa do poder público em multar estes estabelecimentos. Muitos falam que já reclamaram com a prefeitura, mas as queixas não foram levadas à diante, e os alvarás das igrejas, que por vezes não estão de acordo com o número de eventos realizados semanalmente no local, não foram cassados.
Questionada pela Época São Paulo, a Prefeitura de São Paulo afirma que a fiscalização continuará a ser feita do mesmo modo. “Cumprimos o que está na legislação, e nela não há nenhum tipo de diferenciação entre bares e igrejas”, afirmou a Prefeitura, por meio de sua assessoria de imprensa. Para os irmãos Zavitoski, a fiscalização não foi boa o bastante. Cansados de rezar por um pouco de silêncio, mudaram de casa recentemente. E desta vez, certificaram-se de que não havia nenhuma igreja próxima ao novo endereço, graças a Deus.
Igrejas evangélicas fazem mais barulho que bares em São Paulo.
maio de 2010
Barulho de culto.
Em Mudança de Hábito, famoso filme de 1992, a cantoria de um coral gospel comandado por Whoopi Goldberg traz alegria para a vizinhança e aproxima a igreja da comunidade que a cerca. Na vida real, a história é diferente. No último ano, pela primeira vez os templos religiosos lideraram o ranking das queixas por barulho feitas ao Ministério Público Estadual de São Paulo, posto antes ocupado pelos bares.
Isso significa que muita gente tem ligado para o Programa de Silêncio Urbano (Psiu) para reclamar da prece de seus vizinhos, já que existem cerca de 22 mil templos na capital paulista, contra os mais de 55 mil restaurantes, casas noturnas e similares, segundo o jornal O Estado de S. Paulo.
O designer Valter de Oliveira Silva (foto) é um dos incomodados pela cantoria alheia. Mesmo morando no décimo andar, consegue ouvir em alto e bom som a música que vem da Assembléia de Deus próxima à sua casa, na Vila Gumercinda. A igreja possui todo um aparato de amplificadores, coral, orquestra e até um mezanino próprio para os músicos, mas a isolação acústica deixa a desejar. “Não é que a música seja ruim, mas é péssimo não ter a opção de ficar em silêncio”, diz o designer, que acompanha religiosamente os cultos nas noites de sexta, sábado e domingo, independente de sua vontade.
Valter não está sozinho. Além de seus vizinhos, muitas outras pessoas querem falar sobre os incômodos gerados por alguns templos religiosos. O site Deus não é surdo (www.deusnaoesurdo.com.br), criado em 2006, é um exemplo. Com o slogan "Seja um crente decente, não grite no ouvido da gente" e mais de um milhão de acessos, o endereço reúne relatos de pessoas obrigadas a conviver com o barulho gerado pelas igrejas.
Os criadores do site, o analista de sistemas Leandro Zavitoski e seu irmão, Mário Luis Zavitoski Júnior, sabem exatamente como é morar ao lado de uma igreja que supera os 65 decibéis permitidos por lei para áreas mistas da cidade - que abrangem estabelecimentos comerciais e residências.
Os irmãos mudaram-se para uma casa no bairro do Limão, na zona norte de São Paulo, em 2006. Mas logo no primeiro final de semana, descobriram que qualquer traço de simpatia da nova moradia acabava assim que os membros da igreja ao lado ligavam os amplificadores para o culto. “As coisas próximas à parede que separava a nossa casa da igreja tremiam com o barulho. Não dava pra conversar ou trabalhar, era um inferno”, conta Leandro.
Os irmãos Zavitoski tentam abaixar o tom da reza conversando com os membros da igreja. Sem um acordo com os religiosos, Leandro ligou para o Psiu diversas vezes, mas não teve as suas queixas ouvidas. “A solução que encontramos foi criar o site, e vimos que existe muita gente na nossa situação”, afirma o analista de sistemas.
O Deus não é surdo tem um ranking das igrejas mais barulhentas, atualmente liderado pela Universal do Reino de Deus, e uma seção dedicada às “igrejas legais”, para valorizar os templos que respeitam os ouvidos do próximo e praticam uma política da boa vizinhança. Mas a área com maior participação dos internautas é a dos desabafos. E a reclamação mais comum nos relatos está ligada à falta de iniciativa do poder público em multar estes estabelecimentos. Muitos falam que já reclamaram com a prefeitura, mas as queixas não foram levadas à diante, e os alvarás das igrejas, que por vezes não estão de acordo com o número de eventos realizados semanalmente no local, não foram cassados.
Questionada pela Época São Paulo, a Prefeitura de São Paulo afirma que a fiscalização continuará a ser feita do mesmo modo. “Cumprimos o que está na legislação, e nela não há nenhum tipo de diferenciação entre bares e igrejas”, afirmou a Prefeitura, por meio de sua assessoria de imprensa. Para os irmãos Zavitoski, a fiscalização não foi boa o bastante. Cansados de rezar por um pouco de silêncio, mudaram de casa recentemente. E desta vez, certificaram-se de que não havia nenhuma igreja próxima ao novo endereço, graças a Deus.
Igrejas evangélicas fazem mais barulho que bares em São Paulo.
maio de 2010
Barulho de culto.
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