Realidade é tudo o que existe. Parece claro, não? Só que não é. Há vários problemas. O que dizer dos dinossauros, que não existem mais? E das estrelas, tão distantes que quando sua luz finalmente chega até nós e conseguimos vê-las podem já ter se extinguido?
Trataremos dos dinossauros e das estrelas daqui a pouco. Mas, afinal, como sabemos que as coisas existem, mesmo no presente? Para começar, nossos cinco sentidos — visão, olfato, tato, audição e paladar — fazem um trabalho razoável para nos convencer de que muitas coisas são reais: pedras e camelos, grama recém--cortada e café moído na hora, lixa e veludo, cachoeiras e campainhas, açúcar e sal. Mas dizemos que algo é “real” só quando podemos detectá-lo diretamente com nossos cinco sentidos?
E quanto a uma galáxia, tão distante que não pode ser vista a olho nu? E uma bactéria, tão pequena que só pode ser vista com um microscópio?
Devemos dizer que essas coisas não existem porque não as enxergamos? Não. É claro que podemos intensificar nossos sentidos com instrumentos especiais: telescópios para as galáxias, microscópios para as bactérias. Entendemos os telescópios e microscópios, sabemos como funcionam, por isso podemos usá-los para aumentar o alcance dos sentidos — da visão, nesses casos. E o que esses instrumentos nos permitem ver nos convence de que galáxias e bactérias existem.
E quanto às ondas de rádio? Existem? Os olhos não podem detectá-las, nem as orelhas, mas, também nesse caso, instrumentos especiais, como a televisão, convertem essas ondas em sinais que podemos ver e ouvir. Portanto, embora não possamos ver nem ouvir as ondas de rádio, sabemos que são parte da realidade.
Entendemos o funcionamento do rádio e da televisão, que ajudam nossos sentidos a construir uma imagem do que existe: o mundo real, a realidade. Radiotelescópios (e telescópios de raios X) nos mostram estrelas e galáxias através de outro tipo de olho — são mais um modo de expandir a nossa visão.
De volta aos dinossauros. Como sabemos que um dia andaram pela Terra? Nunca vimos nem ouvimos um dinossauro, muito menos corremos de algum. Infelizmente, não temos uma máquina do tempo para vê-los. Mas, nesse caso, nossos sentidos contam com um tipo diferente de ajuda: temos os fósseis, que podemos ver a olho nu. Fósseis não correm nem pulam, mas, porque entendemos como se formam, podem dizer algo sobre o que aconteceu milhões de anos atrás. Entendemos que a água, contendo minerais dissolvidos, infiltra-se em corpos enterrados sob camadas de lama e rocha. Entendemos que os minerais se cristalizam nela e substituem a matéria de que é feito o corpo, átomo por átomo, deixando vestígios da forma original do animal impressos na pedra.
Por isso, embora não possamos ver dinossauros diretamente com nossos sentidos, podemos concluir que sem dúvida existiram, usando evidências indiretas detectadas pelos nossos sentidos: vemos e tocamos os vestígios de vida passada gravados na pedra.
De certo modo, um telescópio pode funcionar como uma espécie de máquina do tempo. O que vemos quando olhamos qualquer coisa é, na verdade, luz, e a luz leva tempo para ir de um lugar a outro.
Mesmo quando você olha para o rosto de um amigo, o que vê é passado, pois a luz vinda do rosto dele demora uma minúscula fração de segundo para chegar até seus olhos. O som viaja muito mais devagar, e é por isso que vemos um rojão brilhar no céu pouco antes de ouvir a explosão. Se você olha um homem cortando uma árvore ao longe, ouvirá com um curioso atraso o som dos golpes do machado.
A luz viaja tão depressa que em geral pressupomos que as coisas acontecem no instante em que as vemos. Mas com as estrelas é diferente. Até o Sol está a oito minutos-luz de distância. Se ele explodisse, esse evento catastrófico só faria parte da nossa realidade oito minutos depois. E seria o nosso fim! Depois do Sol, a estrela mais próxima de nós é a Proxima Centauri. Se você olhar para ela em 2011, verá o que estava acontecendo em 2007. As galáxias são imensos agrupamentos de estrelas, e nós estamos na Via Láctea. Quando você olha para a vizinha mais próxima dela, Andrômeda, seu telescópio é uma máquina do tempo que o leva a 2,5 milhões de anos atrás. Existe um grupo de cinco galáxias chamado Quinteto de Stephan, que vemos pelo telescópio Hubble, e elas colidem espetacularmente umas contra as outras. Mas as colisões que vemos aconteceram há 280 milhões de anos. Se numa dessas galáxias houver extraterrestres com telescópios que possam nos ver, o que eles estão vendo na Terra agora são os ancestrais mais remotos dos dinossauros.
Existem alienígenas no espaço cósmico?
Nunca vimos nem ouvimos nenhum. Eles são parte da realidade? Ninguém sabe. Mas sabemos que tipo de coisa nos ajudaria a identificá-los. Se algum dia chegarmos perto de um extraterrestre, nossos sentidos poderão nos alertar. Talvez um dia alguém na Terra invente um telescópio potente o bastante para detectar vida em outros planetas. Talvez nossos radiotelescópios captem mensagens que só poderiam vir de inteligência alienígena.
A realidade não consiste apenas nas coisas que já conhecemos. Ela inclui o que existe mas ainda ignoramos — e que só viremos a conhecer no futuro, talvez quando tivermos construído instrumentos melhores para auxiliar nossos cinco sentidos.
Sempre existiram átomos, mas só recentemente tivemos certeza disso, e é provável que nossos descendentes saibam muitas outras coisas que hoje desconhecemos. É o fascínio e o prazer da ciência: ela revela coisas continuamente. Isso não quer dizer que devemos acreditar em tudo que se possa imaginar. Há inúmeras coisas que podemos imaginar cuja existência é improvável demais para ser real: fadas, duendes, hipogrifos.
Devemos ter sempre a mente aberta, mas a única razão para acreditar que algo existe é ter evidências reais dessa existência.
Modelos: imaginação à prova
Examinamos atentamente o modelo e predizemos o que teríamos de ver (ouvir etc.) com os nossos sentidos (auxiliados talvez por instrumentos) se o modelo fosse correto. Por fim, averiguamos se as predições estão certas ou erradas. Se estiverem certas, isso aumenta nossa confiança de que o modelo representa mesmo a realidade; passamos então a criar novos experimentos, talvez refinando o modelo, para testar novamente as conclusões e confirmá-las. Se nossas predições estiverem erradas, rejeitamos o modelo, ou o modificamos e fazemos uma nova tentativa.
Vejamos um exemplo. Hoje, sabemos que os genes, as unidades da hereditariedade, são feitos de uma substância chamada dna. Temos bons conhecimentos sobre o dna e como ele funciona. Mas não podemos ver detalhadamente como ele é, nem mesmo com um microscópio. Quase tudo o que sabemos sobre o dna provém, indiretamente, de modelos que foram imaginados e testados.
Na verdade, muito antes que alguém tivesse ouvido falar em dna, os cientistas já tinham descoberto várias coisas sobre os genes testando predições de modelos. No século xix, um monge austríaco, Gregor Mendel, fez experimentos na horta de seu mosteiro, cruzando ervilhas em grandes quantidades. Ao longo de gerações dessas plantas, ele contou quantas tinham flores de várias cores e quantas tinham grãos enrugados ou lisos. Mendel nunca viu ou tocou um gene. Viu apenas ervilhas e flores, e usou seus olhos para contar os diversos tipos. Ele inventou um modelo, que envolvia o que nos dias de hoje chamamos de genes (embora Mendel não usasse esse termo), e calculou que, se o modelo fosse correto, em dado experimento de cruzamento deveriam nascer três vezes mais ervilhas lisas que enrugadas. E foi isso mesmo que ele viu ao fazer a contagem. Deixando de lado os detalhes, o importante é que os “genes” de Mendel foram produto de sua imaginação: ele não os via, nem mesmo ao microscópio, mas via ervilhas lisas e enrugadas, e pela contagem delas encontrou evidências indiretas de que seu modelo de hereditariedade era uma boa representação de algo no mundo real. Tempos depois, cientistas usaram uma modificação do método de Mendel, trabalhando com outros seres vivos, como drosófilas, em vez de ervilhas, para mostrar que os genes se encadeiam em uma ordem definida ao longo de filamentos chamados cromossomos (nós, humanos, temos 46 deles; as drosófilas têm oito). Foi possível até calcular, testando modelos, a ordem exata na qual os genes se dispunham. Tudo isso foi feito muito antes de sabermos que os genes eram feitos de dna.
Hoje temos esse conhecimento, e sabemos exatamente como o dna funciona, graças a James Watson e Francis Crick, além de muitos outros cientistas que vieram depois deles. Watson e Crick não puderam ver o dna a olho nu — também fizeram suas descobertas imaginando modelos e testando-os. Eles construíram modelos de papelão e metal representando uma possível estrutura do dna e calcularam quais teriam de ser as medidas se tais modelos fossem corretos. As predições de um dos modelos, chamado de dupla hélice, corresponderam exatamente às medições feitas por Rosalind Franklin e Maurice Wilkins usando instrumentos especiais que projetavam raios X em cristais de dna purificado. Watson e Crick também perceberam imediatamente que seu modelo da estrutura do DNA produziria exatamente o tipo de resultados encontrado por Gregor Mendel na horta de seu mosteiro.
Portanto, temos três modos de saber o que é real. Podemos detectar diretamente com nossos cinco sentidos; indiretamente, com instrumentos especiais como telescópios e microscópios auxiliando nossos sentidos; ou ainda mais indiretamente, criando modelos do que poderia ser real e fazendo uma série de testes para ver se eles predizem corretamente o que podemos ver (ouvir etc.), com ou sem a ajuda de instrumentos. Em última análise, de um modo ou de outro tudo será confirmado por nossos sentidos.
Isso quer dizer que a realidade contém apenas coisas que podem ser detectadas, direta ou indiretamente, pelos nossos sentidos e pelos métodos da ciência? Mas e coisas como ciúme e prazer, felicidade e amor? Não são também reais? Sim, são reais. Mas para existir dependem do cérebro: do cérebro humano, com certeza, e provavelmente também do cérebro de outras espécies animais avançadas, como chimpanzés, cães e baleias. Pedras não sentem alegria nem ciúme, montanhas não amam. Essas emoções são intensamente reais para quem as sente, mas não existiam antes de o cérebro existir. É possível que emoções desse tipo — e talvez outras com as quais nem sonhamos — existam em outros planetas, mas apenas naqueles que contenham cérebros, ou algo equivalente a eles, pois quem sabe que estrambóticos órgãos pensantes ou máquinas providas de sentimentos podem existir em outras partes do universo?
A ciência e o sobrenatural: a explicação e seu inimigo
Então essa é a realidade, e é assim que podemos saber se uma coisa é ou não real. Cada capítulo deste livro tratará de um aspecto específico da realidade — o Sol, os terremotos, o arco-íris ou os muitos tipos de animais. Agora quero falar sobre a outra palavra-chave do meu título: magia. É uma palavra ardilosa. Costumamos usá-la em três sentidos diferentes, e a primeira coisa que preciso fazer é distingui-los. Chamarei o primeiro de “magia sobrenatural”, o segundo de “magia de palco” e o terceiro (que é o meu sentido favorito e o que eu tinha em mente no meu título) de “magia poética”.
Magia sobrenatural é aquela descrita nos mitos e contos de fadas. (E também nos “milagres”, mas deixarei estes para examinar no último capítulo.) É a magia da lâmpada de Aladim, dos feitiços de bruxa, das histórias dos irmãos Grimm, de Hans Christian Andersen e de J. K. Rowling. É a magia ficcional da bruxa que transforma um príncipe num sapo, ou da fada madrinha que faz uma abóbora virar uma luxuosa carruagem. Essas são histórias da nossa infância que recordamos com ternura, e muitos de nós ainda apreciam quando são representadas em um espetáculo de Natal. Mas todos sabemos que esse tipo de magia é apenas ficção e não acontece na realidade.
A magia de palco, em contraste, realmente acontece e pode ser muito divertida. Ou, pelo menos, alguma coisa realmente acontece, embora não seja o que a plateia está pensando. Um homem num palco (costuma ser um homem, não sei por quê, então usarei “ele”; mas você pode trocar por “ela”, se preferir) nos ilude, fazendo-nos pensar que algo espantoso (talvez até sobrenatural) aconteceu, quando o que realmente houve foi uma coisa bem diferente. Lenços de seda não podem ser transformados em coelhos, do mesmo modo que sapos não podem virar príncipes. O que vemos no palco é apenas um truque. Nossos olhos nos enganam — ou melhor, o mágico se empenha em iludir nossos olhos, às vezes usando palavras com astúcia para nos distrair do que ele está fazendo com as mãos.
Alguns mágicos são honestos e fazem questão de que a plateia saiba que eles simplesmente executaram um truque. Estou falando de pessoas como James “o Incrível” Randi, Penn e Teller, ou Derren Brown. Embora esses admiráveis artistas não costumem explicar exatamente como fizeram um truque (até porque poderiam ser expulsos do Círculo Mágico, o clube dos mágicos), eles asseguram ao público que nenhuma magia sobrenatural aconteceu. Outros não dizem com todas as letras que tudo não passa de um truque, porém não ficam alardeando o que não fizeram; simplesmente deixam a plateia com a prazerosa sensação de que algo misterioso aconteceu, sem mentir. Infelizmente, existem alguns mágicos que são desonestos de propósito e fingem possuir poderes “sobrenaturais” ou “paranormais”; por exemplo, dizem que são capazes de entortar
metais ou parar relógios apenas pelo poder do pensamento. Alguns desses farsantes (“charlatães” é um bom adjetivo para eles) recebem altas remunerações de companhias mineradoras ou petroleiras porque se dizem capazes de descobrir, usando “poderes psíquicos”, onde estão os bons lugares para fazer sondagem. Outros homens desse tipo exploram pessoas que vivem o luto dizendo-se capazes de entrar em contato com os mortos. Quando essas coisas acontecem, não se trata de divertir ou entreter, mas de abusar da credulidade ou do desespero das pessoas. Sejamos justos: é possível que nem todos esses indivíduos sejam charlatães. Alguns talvez acreditem sinceramente que são capazes de falar com os mortos.
Vejamos um exemplo. Hoje, sabemos que os genes, as unidades da hereditariedade, são feitos de uma substância chamada dna. Temos bons conhecimentos sobre o dna e como ele funciona. Mas não podemos ver detalhadamente como ele é, nem mesmo com um microscópio. Quase tudo o que sabemos sobre o dna provém, indiretamente, de modelos que foram imaginados e testados.
Na verdade, muito antes que alguém tivesse ouvido falar em dna, os cientistas já tinham descoberto várias coisas sobre os genes testando predições de modelos. No século xix, um monge austríaco, Gregor Mendel, fez experimentos na horta de seu mosteiro, cruzando ervilhas em grandes quantidades. Ao longo de gerações dessas plantas, ele contou quantas tinham flores de várias cores e quantas tinham grãos enrugados ou lisos. Mendel nunca viu ou tocou um gene. Viu apenas ervilhas e flores, e usou seus olhos para contar os diversos tipos. Ele inventou um modelo, que envolvia o que nos dias de hoje chamamos de genes (embora Mendel não usasse esse termo), e calculou que, se o modelo fosse correto, em dado experimento de cruzamento deveriam nascer três vezes mais ervilhas lisas que enrugadas. E foi isso mesmo que ele viu ao fazer a contagem. Deixando de lado os detalhes, o importante é que os “genes” de Mendel foram produto de sua imaginação: ele não os via, nem mesmo ao microscópio, mas via ervilhas lisas e enrugadas, e pela contagem delas encontrou evidências indiretas de que seu modelo de hereditariedade era uma boa representação de algo no mundo real. Tempos depois, cientistas usaram uma modificação do método de Mendel, trabalhando com outros seres vivos, como drosófilas, em vez de ervilhas, para mostrar que os genes se encadeiam em uma ordem definida ao longo de filamentos chamados cromossomos (nós, humanos, temos 46 deles; as drosófilas têm oito). Foi possível até calcular, testando modelos, a ordem exata na qual os genes se dispunham. Tudo isso foi feito muito antes de sabermos que os genes eram feitos de dna.
Hoje temos esse conhecimento, e sabemos exatamente como o dna funciona, graças a James Watson e Francis Crick, além de muitos outros cientistas que vieram depois deles. Watson e Crick não puderam ver o dna a olho nu — também fizeram suas descobertas imaginando modelos e testando-os. Eles construíram modelos de papelão e metal representando uma possível estrutura do dna e calcularam quais teriam de ser as medidas se tais modelos fossem corretos. As predições de um dos modelos, chamado de dupla hélice, corresponderam exatamente às medições feitas por Rosalind Franklin e Maurice Wilkins usando instrumentos especiais que projetavam raios X em cristais de dna purificado. Watson e Crick também perceberam imediatamente que seu modelo da estrutura do DNA produziria exatamente o tipo de resultados encontrado por Gregor Mendel na horta de seu mosteiro.
Portanto, temos três modos de saber o que é real. Podemos detectar diretamente com nossos cinco sentidos; indiretamente, com instrumentos especiais como telescópios e microscópios auxiliando nossos sentidos; ou ainda mais indiretamente, criando modelos do que poderia ser real e fazendo uma série de testes para ver se eles predizem corretamente o que podemos ver (ouvir etc.), com ou sem a ajuda de instrumentos. Em última análise, de um modo ou de outro tudo será confirmado por nossos sentidos.
Isso quer dizer que a realidade contém apenas coisas que podem ser detectadas, direta ou indiretamente, pelos nossos sentidos e pelos métodos da ciência? Mas e coisas como ciúme e prazer, felicidade e amor? Não são também reais? Sim, são reais. Mas para existir dependem do cérebro: do cérebro humano, com certeza, e provavelmente também do cérebro de outras espécies animais avançadas, como chimpanzés, cães e baleias. Pedras não sentem alegria nem ciúme, montanhas não amam. Essas emoções são intensamente reais para quem as sente, mas não existiam antes de o cérebro existir. É possível que emoções desse tipo — e talvez outras com as quais nem sonhamos — existam em outros planetas, mas apenas naqueles que contenham cérebros, ou algo equivalente a eles, pois quem sabe que estrambóticos órgãos pensantes ou máquinas providas de sentimentos podem existir em outras partes do universo?
A ciência e o sobrenatural: a explicação e seu inimigo
Então essa é a realidade, e é assim que podemos saber se uma coisa é ou não real. Cada capítulo deste livro tratará de um aspecto específico da realidade — o Sol, os terremotos, o arco-íris ou os muitos tipos de animais. Agora quero falar sobre a outra palavra-chave do meu título: magia. É uma palavra ardilosa. Costumamos usá-la em três sentidos diferentes, e a primeira coisa que preciso fazer é distingui-los. Chamarei o primeiro de “magia sobrenatural”, o segundo de “magia de palco” e o terceiro (que é o meu sentido favorito e o que eu tinha em mente no meu título) de “magia poética”.
Magia sobrenatural é aquela descrita nos mitos e contos de fadas. (E também nos “milagres”, mas deixarei estes para examinar no último capítulo.) É a magia da lâmpada de Aladim, dos feitiços de bruxa, das histórias dos irmãos Grimm, de Hans Christian Andersen e de J. K. Rowling. É a magia ficcional da bruxa que transforma um príncipe num sapo, ou da fada madrinha que faz uma abóbora virar uma luxuosa carruagem. Essas são histórias da nossa infância que recordamos com ternura, e muitos de nós ainda apreciam quando são representadas em um espetáculo de Natal. Mas todos sabemos que esse tipo de magia é apenas ficção e não acontece na realidade.
A magia de palco, em contraste, realmente acontece e pode ser muito divertida. Ou, pelo menos, alguma coisa realmente acontece, embora não seja o que a plateia está pensando. Um homem num palco (costuma ser um homem, não sei por quê, então usarei “ele”; mas você pode trocar por “ela”, se preferir) nos ilude, fazendo-nos pensar que algo espantoso (talvez até sobrenatural) aconteceu, quando o que realmente houve foi uma coisa bem diferente. Lenços de seda não podem ser transformados em coelhos, do mesmo modo que sapos não podem virar príncipes. O que vemos no palco é apenas um truque. Nossos olhos nos enganam — ou melhor, o mágico se empenha em iludir nossos olhos, às vezes usando palavras com astúcia para nos distrair do que ele está fazendo com as mãos.
Alguns mágicos são honestos e fazem questão de que a plateia saiba que eles simplesmente executaram um truque. Estou falando de pessoas como James “o Incrível” Randi, Penn e Teller, ou Derren Brown. Embora esses admiráveis artistas não costumem explicar exatamente como fizeram um truque (até porque poderiam ser expulsos do Círculo Mágico, o clube dos mágicos), eles asseguram ao público que nenhuma magia sobrenatural aconteceu. Outros não dizem com todas as letras que tudo não passa de um truque, porém não ficam alardeando o que não fizeram; simplesmente deixam a plateia com a prazerosa sensação de que algo misterioso aconteceu, sem mentir. Infelizmente, existem alguns mágicos que são desonestos de propósito e fingem possuir poderes “sobrenaturais” ou “paranormais”; por exemplo, dizem que são capazes de entortar
metais ou parar relógios apenas pelo poder do pensamento. Alguns desses farsantes (“charlatães” é um bom adjetivo para eles) recebem altas remunerações de companhias mineradoras ou petroleiras porque se dizem capazes de descobrir, usando “poderes psíquicos”, onde estão os bons lugares para fazer sondagem. Outros homens desse tipo exploram pessoas que vivem o luto dizendo-se capazes de entrar em contato com os mortos. Quando essas coisas acontecem, não se trata de divertir ou entreter, mas de abusar da credulidade ou do desespero das pessoas. Sejamos justos: é possível que nem todos esses indivíduos sejam charlatães. Alguns talvez acreditem sinceramente que são capazes de falar com os mortos.