Leio estarrecido no Estadão que o Jaguar e o Ziraldo, por serem censurados no Pasquim na época do regime militar, também serão beneficiados pelo que vem sendo chamado de bolsa-ditadura. Os dois receberão em parcelas a indenização de R$ 1 milhão. Além disso, vão ter pensão mensal de R$ 4 mil.
Cresci lendo o Pasquim. Eu chegava me plantar na banca de jornais à espera do semanário carioca que escrachava os ditadores. Ziraldo e Jaguar, entre outros que faziam o jornal, de fato foram perseguidos pelos milicos – chegaram a ser presos.
Mas o Pasquim vendia tanto que encheram de dinheiro os bolsos dos seus donos, entre eles Ziraldo e Jaguar. Se souberam administrá-lo é outro problema. Parece que Ziraldo soube. É um jornalista rico. Não precisava de indenização. É um escritor de sucesso de livros para crianças. Ele poderia ter a dignidade de resistir à bolsa-ditadura.
Não sou contra a indenização a quem foi perseguido pelos militares, mas o benefício só deve ser concedido a quem realmente precisa de ajuda financeira – e esse não é o caso da maioria dos beneficiados, incluindo o presidente Lula, que, se me lembro bem, ficou um ou dois dias na cadeia, e hoje ganha por mês cerca de R$ 5 mil.
As pensões aos perseguidos pela ditadura custam aos cofres públicos cerca de R$ 28 milhões por mês e em indenizações já foram pagos aproximadamente R$ 3 bilhões. Por enquanto, porque existem milhares de pedidos em tramitação.
Eu também participei de passeata contra a ditadura. Até levei uma cacetadas nas costas, em uma passeata que saiu do Largo São Francisco. Será que devo pedir um indenização?
Falando sério: esse pessoal não tem a grandeza de Anita Leocádia, filha do líder comunista Luis Carlos Prestes e Olga Benário. Ela nasceu em uma prisão nazista, na Alemanha, e foi impedida de trabalhar no Brasil na época da ditadura militar.
Pois bem. Anita foi contemplada por uma indenização de R$ 100 mil em 2004 (não tenho certeza desse ano), mas ela a recusou porque achou imoral receber dinheiro por ser fiel às suas convicções. Ela só aceitou a contagem de tempo de serviço para se aposentar como professora da Universidade do Rio de Janeiro.
Prestes com certeza sentiria orgulho de sua filha.
Para mim, Jaguar e Ziraldo significam mais uma decepção das tantas que já tive com as esquerdas brasileiras.
Os outrora defensores das causas populares hoje querem é mamar nas tetas gordas alimentadas pelo dinheiro público. Que merda de gente!
> Bolsa-ditadura pagou R$ 2,4 bi nos últimos 8 anos. (Consultor Jurídico)
> Carta colhe assinaturas em repúdio às indenizações imorais.
Atualização em 8/4/2008: Maurício Azêdo, presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), afirma que a indenização ao Jaguar e Ziraldo é justa. "Quarenta anos de sofrimento não tem preço", disse. Peraí, a ditadura militar não durou tanto tempo! No mais, se não tem preço, por que se pagou R$ 1 milhão? A questão é outra: tem havido exagero na concessão de indenização e pensão aos perseguidos pelos milicos. Parte dessa grana deveria ser investida em planos sociais. Mas hoje parece que as esquerdas não se preocupam tanto com isso, não é mesmo Jaguar e Ziraldo?
> Informações sobre a ditadura militar brasileira.
Comentários
Olha aí, as palavras são do próprio Jaguar:
"Parece que é brincadeira, mas foi o melhor período da minha vida. Eu ficava o dia inteiro lendo Guerra e paz, aquele calhamaço do Tolstoi, que você só lê na prisão. Subornava os guardinhas que me compravam cachaça, bebia o dia inteiro, e ainda era considerado herói, entendeu? Tortura, não houve."
http://portalliteral.terra.com.br/Literal/calandra.nsf/0/BE8329D7BE53FD7F032573060004C06E?opendocument&pub=T&proj=Literal&sec=Entrevista
Vídeo da entrevista:
http://portalliteral.terra.com.br/Literal/calandra.nsf/0/470A08100B0DBAAC032573E0006A3967?opendocument&pub=T&proj=Literal&sec=TV%20Literal2
O Bolsa Ditadura tornou-se uma indústria
por Elio Gaspari
Se alguém produzir um veneno capaz de desmoralizar a esquerda sexagenária brasileira dificilmente chegaria a algo parecido com o Bolsa Ditadura.
Aquilo que em 2002 foi uma iniciativa destinada a reparar danos impostos durante 21 anos a cidadãos brasileiros transformou-se numa catedral de voracidade, privilégios e malandragens. O Bolsa Ditadura já custou R$ 2,5 bilhões à contabilidade da Viúva. Estima-se que essa conta chegue a R$ 4 bilhões no ano que vem.
Em 1952, o governo alemão pagou o equivalente a R$ 11 bilhões (US$ 5,8 bilhões) ao Estado de Israel pelos crimes cometidos contra os judeus durante o nazismo.
O Bolsa Ditadura gerou uma indústria voraz de atravessadores e advogados que embolsam até 30% do que conseguem para seus clientes. No braço financeiro do pensionato há bancos comprando créditos de anistiados. O repórter Felipe Recondo revelou que Elmo Sampaio, dono da Elmo Consultoria, morderá 10% da indenização que será paga a camponeses sexagenários, arruinados, presos e torturados pela tropa do Exército durante a repressão à Guerrilha do Araguaia.
Como diria Lula, são 44 "pessoas comuns" que receberão pensões de R$ 930 mensais e compensações de até R$ 142 mil. Essa turma do andar de baixo conseguiu o benefício muitos anos depois da concessão de indenizações e pensões aos militantes do PC do B envolvidos com a guerrilha.
O doutor Elmo remunera-se intermediando candidatos e advogados. Seu plantel de requerentes passa de 200. Ele integrou a Comissão da Anistia e dela obteve uma pensão de R$ 8.000 mensais, mais uma indenização superior a R$ 1 milhão, por conta de um emprego perdido na Petrobras. No primeiro grupo de milionários das reparações esteve outro petroleiro, que em 2004 chefiava o gabinete do advogado Luiz Eduardo Greenhalgh na Câmara. O Bolsa Ditadura já habilitou mais de 160 milionários.
É possível que o ataque ao erário brasileiro venha a custar mais caro que todos os programas de reparações de todos os povos europeus vitimados pelo comunismo em ditaduras que duraram quase meio século. Na Alemanha, por exemplo, um projeto de 2007 dava algo como R$ 700 mensais a quem passou mais de seis meses na cadeia e tinha renda baixa (repetindo, renda baixa). Na República Tcheca, o benefício dos ex-presos não pode passar de R$ 350 mensais.
No Chile, o governo pagou indenizações de 3 milhões de pesos (R$ 11 mil) e concedeu pensões equivalentes a R$ 500 mensais. Durante 13 anos, entre 1994 e 2007, esse programa custou US$ 1,4 bilhão. No Brasil, em oito anos, o Bolsa Ditadura custará o dobro. O regime de Pinochet matou 2.279 pessoas e violou os direitos humanos de 35 mil. Somando-se os brasileiros cassados, demitidos do serviço público, indiciados ou denunciados à Justiça chega-se a um total de 20 mil pessoas. Já foram concedidas 12 mil Bolsas Ditadura e há uma fila de 7.000 requerentes.
Os camponeses do Araguaia esperaram 35 anos pela compensação. Como Lula não é "uma pessoa comum", ficou preso 31 dias em 1979 e começou a receber sua Bolsa Ditadura oito anos depois. Desde 2003, o companheiro tem salário (R$ 11.239,24), casa, comida, avião e roupa lavada à custa da Viúva.
Mesmo assim embolsa mensalmente cerca de R$ 5.000 da Bolsa Ditadura. (Se tivesse deixado o dinheiro no banco, rendendo a Bolsa Copom, seu saldo estaria em torno de R$ 1 milhão.)
O cidadão que em 1968 perdeu a parte inferior da perna num atentado a bomba ao Consulado Americano recebe pelo INSS (por invalidez), R$ 571 mensais. Um terrorista que participou da operação ganhou uma Bolsa Ditadura de R$ 1.627.
Um militante do PC do B que sobreviveu à guerrilha e jamais foi preso, conseguiu uma pensão de R$ 2.532. Um jovem camponês que passou três meses encarcerado, teve o pai assassinado pelo Exército e deixou a região com pouco mais que a roupa do corpo, receberá uma pensão de R$ 930.
Nesses, e em muitos outros casos, Millôr Fernandes tem razão: "Quer dizer que aquilo não era ideologia, era investimento?"
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