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‘Ninguém vive em harmonia com a natureza’

Título original: O romantismo idiota de "Avatar"

por Luiz Felipe Pondé para a Folha

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O filme "Avatar", de James Cameron, é melhor do que "2012". "Avatar" também tem um ar apocalíptico, mas reúne elementos estéticos e de conteúdo mais elaborados do que "2012" e seu besteirol maia.

Mesmo assim, "Avatar" acaba sufocado por outro tipo de besteirol que é seu romantismo para idiotas: a fé no povo da floresta que vive em harmonia com a natureza. Nenhum povo vive em harmonia com a natureza. A diferença na relação com a natureza sempre se definiu pela maior ou menor capacidade técnica de cada cultura em controlá-la.

Os índios brasileiros que cá estavam quando chegaram os portugueses ("nossos libertadores") só viviam "em harmonia com a natureza" porque eram tão atrasados que nem conheciam a roda. Preste atenção: a relação com a natureza é de vida ou morte, ou ela ou nós. A expressão "lei da selva" não foi inventada pela avenida Paulista e seus bancos, mas sim como descrição da natureza e seu horror.

Isso não significa que não existam limites para a exploração da natureza, mas isso tampouco significa que exista uma coisa que seja "a doce Natureza". Serpentes e barbeiros (os besouros da doença de Chagas, não seu cabeleireiro unissex) e câncer são tão naturais quanto os passarinhos.

O romantismo é uma escola literária de peso. Último grande grito contra a vida brutalizada pela fúria mercantil, ele reúne uma crítica contundente ao capitalismo tecnicista e sua crença brega na ciência - "a ciência é o grande fetiche da burguesia", dizia o filósofo Adorno. Em "Avatar", o romantismo degenera em conversa de retardado.

Revolucionários românticos sonhavam com uma vida que recuperasse "valores pré-modernos" identificados com uma vida em comunidade onde as pessoas não seriam monstros interesseiros. O problema desses revolucionários é que "comunidade pré-moderna" não é uma comunidade de hippies legais, mas um tipo de sociabilidade onde o padeiro da esquina sabe que sua mãe é amante do padre, que seu pai é brocha, e que nem você nem ninguém têm pra onde ir. A idealização do que seria uma comunidade é uma das marcas dos idiotas utópicos.

Ninguém está disposto a abrir mão da liberdade individual moderna em nome de qualquer comunidade, por isso toda tentativa de "re-fundar" comunidades fracassa, apesar da admiração de muito pós-moderno bobo por culturas que não conheciam a roda. Não basta ter um filtro de barro em sua casa na Vila Madalena pra você conseguir viver em paz na comunidade da deusa natureza.

O filme se passa num planeta (Pandora) tipo Amazônia, onde existe uma enorme riqueza mineral escondida sob o solo coberto por uma floresta tropical cheia de "monstrinhos e plantas que ascendem ao toque das mãos", habitada por uma população linda de seres que muito se parecem com índios americanos. Pandora já remete à narrativa da "caixa de Pandora" e suas maldições.

O nome da raça que habita Pandora, os Na'vi, soa muito próximo da palavra hebraica para "profeta", "navi" ou "nabi". Os humanos gananciosos não são capazes de perceber como os Na'vi são seres em contato com a deusa cósmica. Os índios de Pandora são profetas da deusa.

O personagem humano principal é paraplégico, mas ao se tornar um Na'vi recupera as pernas: eis a metáfora da condição humana vista pelas lentes do romantismo degenerado.

Somos uns aleijados em comparação aos belos índios místicos donos da verdade cósmica. E qual é essa verdade? Que a natureza é um grande cérebro pensante e que devemos nos dobrar a ela porque assim a vida será bela.

Meu Deus, como ter paciência com esses aleijados mentais? Ninguém leu Darwin? Ninguém nunca observou a natureza de perto? Nunca sentiu o odor de sua violência? Numa cena, nosso herói escapa de uma fera. Esta mesma fera se oferecerá em seguida como montaria dócil para a heroína Na'vi a fim de combater os humanos gananciosos. Hipótese do filme: se um leão come a cabeça de uma mulher, isso é "bem cósmico", mas diante da ganância humana, ele se oferecerá como montaria dócil e fará discernimento entre sua crueldade "do bem" e a "maldade humana".

Noutra cena, na qual a heroína Na'vi salva o mocinho, ela dirá: "Eu tive que matar essas belas criaturas porque você fez barulho".

Moral da história: se você não respirar e não andar, a natureza o amará pra sempre. Caso apareça um porco capitalista, os leões virarão gatinhos. Só um idiota pensaria isso.

Só ingênuos e mentirosos podem confiar na bondade das crianças.
janeiro de 2011

> Artigos de Luiz Felipe Pondé.

Comentários

Uau. Como eu podia nunca ter te lido antes? Sensacional o blog, seus textos. Absolutamente encantada...
Unknown disse…
sinceramente uma bosta de texto, totalmente egocentrico e generalizado.

Voce pode sim expor sua opniao, mas julgar a opnião dos outros é muita ignorancia de sua parte.
Anônimo disse…
Gostei do texto.. achar que a natureza é boazinha é ser muito ingenuo! kkk
Anônimo disse…
Eita...
A carapuça serviu pro Govoni.
Anônimo disse…
Como sempre, o tragicômico Luiz Felipe Pondé mostra, não como as coisas são mas, como ele é. Ele é tão ridiculo quanto suas idéias e no dia em que ele elogiar alguma coisa teremos a vinda do Seu messias num apocalipse cósmico.
Concordo em que, Avatar é um filme próprio dessa moda sensasionalista pan-eco-lógica. Mas Pondé é isso: Um deprimido infeliz que não vê graça em nada e pra tudo faz "cara feia".
É bom divulgar as idéias dele, só quero saber quem vai pagar o terapêuta para os leitores desavisados...
Anônimo disse…
Lendo o texto lembrei-me de um filme: 'Na Natureza Selvagem', a natureza nada tem de boazinha mesmo...
Anônimo disse…
É,Pondé.
Você está bem desgostoso com a vida mesmo, não é ?
Sua observações acerca deste belíssimo filme são nauseantes.
Sinto muito por você.
Fique em paz.
jpbochi disse…
Concordo com a idéia geral do texto, mas falta embasamento para a argumentação. Dizer que ninguém vive em harmonia com a natureza é erro de generalização.

De alguma forma, todas as espécies na Terra influenciam a natureza. Para citar um exemplo, foi a existência de insetos possibilitou a existência de plantas com flores. Após o surgimento de novas espécies, o equilíbrio de um ecosistema sempre é alterado. Com o tempo, a tendência é que um novo equilíbro aconteça. Na prática, essas alterações são tão constantes (embora muito lentas para padrões humanos) que a verdade é que a natureza nunca está em equilíbrio. Ela está em alteração constante enquanto as espécies evoluem.

A espécie humana pode até parecer uma exceção a esta regra, mas não é. Obviamente, ela também influencia a natureza. A diferença que é no grau dessa influência. A velocidade das mudanças proporcionadas pelo surgimento da nossa espécie só se compara a apenas 5 outros eventos [de extinção em massa] que já ocorreram na história da Terra.

Enfim, o meu ponto é que o ideal romântico de convívio pacífico com a natureza é realmente impossível. Entretanto, é perfeitamente possível que os seres humanos consigam viver próximos a um equilíbrio com a natureza. Aliás, esse equilíbrio vai acontecer de qualquer forma. Ou nós encontramos um logo, ou ele só vai aparecer depois da nossa extinção.
Anônimo disse…
Excelente, Pondé. Você como filósofo atingiu mais uma vez a meta: provocar seus leitores a pensar, a debater. O resultado é um ganho para todos.
Anônimo disse…
Nojo.
Bruno Eleres disse…
Darwin, apesar de ter dado várias contribuições mais do que interessantes para as ciências biológicas, não estava de todo certo e nem foi o único a chegar nessas conclusões. Acredito, então, que a opinião dele não é suprema para você acreditar apenas na opinião dele, tendo você lido (o que eu não acredito veementemente), ou não.

Acho que, em certa parte, você está certo quanto a visão romântica extrema do filme, e tudo o mais comentado; porém, falar sobre a falta de harmonia é um tanto quanto desprover de significado tanto a palavra quanto qualquer conhecimento que foi construído por naturalistas e biólogos ao longo de suas carreiras.

1. Harmonia se refere a ordem, proporção e beleza, e não ao bem estar do ser humano ou a falta de problemas ou perigos em uma vida.

2. Você fala da constante luta entre a natureza e o ser humano, mas acredito que mais da metade da população tenha mais medo que um lunático suícida mate todo mundo com uma bomba ou que um cara na rua lhe dê um tiro do que um tubarão faminto surja dos filmes do Spielberg para devorar suas criancinhas (ou assim deveria ser, comprovado por dados estatísticos).

3. Mesmo que isso seja uma guerra, os humanos já estão ganhando de lavada: pegando como exemplo os tubarões já citados, eles atacam por volta de 100 humanos por ano. São mortos 100.000 milhões de elasmobrânquios por ano, e a maioria nem por se aproveitar de sua carne, sendo mortos apenas por medo e ignorância de grande parcela da população, que se restringe a pensar de um modo egoísta e fechado quanto a superioridade de sua espécie.

4. Em avatar, os Na'vi interagem com a natureza, submetem alguns de seus integrantes a sua tecnologia (mesmo que primitiva), mas ainda assim estão expostos a seus perigos.

5. Sim, a relação com a natureza é de vida ou morte, eu acho. Ou você é forte o suficiente para sobreviver, tanto com outras espécies quanto contra os competidores de sua própria espécie. Porém para 'vencer' competição intra/inter-específica não é necessário apenas com desmatar uma área inteira pra criar gado ou sair matando outras animais (no caso, nao humanos) que você ACHA que são perigosos. Pode-se utilizar a outra parte da natureza a seu favor, e deixar que ela seja sem tomar todo o espaço dela.

6. E ainda tem pessoas que acreditam em humanidade? Se o que você fala é real, certamente não existe essa humanidade cheia de um bando de sentimentos que os tornam superiores aos outros seres. Se for tudo preto e branco da maneira que você fala, os humanos iguais a qualquer outro animai a partir do pensamento da maioria da população de falta de consciência e sentimento de outros táxons.

o_o
Carla Sales disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse…
Não custa tentar não é Pondé?
Esse texto: mais uma asneira que você cometeu ;}
Leandro Correia disse…
Ele acha que a mesma natureza de seleção natural que Darwin descreveu em seu livro a Origem das Espécies, é a natureza que imperana na sobrevivência neste sistema criado por humanos, a tempos "burlamos" a natureza ...
Anônimo disse…
em que mundo voçê vive? nâo existe pessoa que nâo precise de outra pessoa ou da natureza, afinal voçê respira em que mundo ,serà que o mesmo que o meu?

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