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‘Só gay e mentiroso não têm problema com mulher’

Título original: Marketing de comportamento

por Luiz Felipe Pondé para a Folha

Uma frase típica de jantares inteligentes é: "Hoje temos outra cabeça!". Eu digo que não. Não temos "outra cabeça". Somos mais tagarelas sobre nossas mentiras. A mentira virou ciência: virou marketing.

Ninguém é bem resolvido.Acho, sim, que muitos profissionais das ciências humanas afirmam que existe essa "outra cabeça" (no sentido de sermos mais bem resolvidos) simplesmente para justificar seu lugar de gurus de uma vida melhor. Pretendem seduzir as pessoas dizendo para elas palavras bonitas.

Principalmente as mulheres. Enganam-se porque as mais interessantes entre elas detestam bajulação. A praga da "autoajuda" não é privilégio de magos decadentes, bruxas loiras e gurus desdentados. Essa praga assola tudo, fazendo da vida inteligente um marketing da autoimagem.

Progredimos, sim, em remédios, repelentes de mosquitos e cirurgias (tecnologias médicas), aviões, computadores e celulares (tecnologias de transporte e comunicação). Mesmo a democracia eu julgo sobrevalorizada em muitos casos devido à inequívoca vocação para a retórica e para a tirania da opinião pública.

Mas a má-fé se esconde no fato de que todos esses avanços técnicos implicam o tipo de vida (degradada, instrumental, apressada) que temos. Como diz o filósofo francês André Comte-Sponville, o "progresso" em escala global é uma ameaça à vida.

Sem dúvida que algumas coisas "mudam". Hoje, por exemplo, muitas mulheres podem ser "mais" do que secretárias, elas podem ser médicas, engenheiras, cientistas. E negros podem ser presidentes. Mas nada disso (de antibióticos a médicas negras) implica em "outra cabeça": continuamos invejosos, manipuladores, inseguros, traiçoeiros e podemos destruir muita gente dando uma de "defensores dos mais fracos". Os "ganhos sociais" só se instalam quando se acomodam e passam a servir às velhas mazelas humanas.

Uma leitora, irritada, pergunta: "Você não acredita que existam mulheres sozinhas e bem resolvidas? Você deve é ter problemas com as mulheres". Dou duas respostas.

Primeira: não acredito em pessoas bem resolvidas, acho que todo mundo que se diz bem resolvido é um mentiroso contumaz, mulher ou homem. No fundo, o que existe hoje é um marketing de comportamento que se apoia no consumo crescente de antidepressivos e hábitos macabros como conversar com gatos, cachorros, plantas ou extraterrestres.
 
Só eremitas conseguem viver bem sozinhos. Amar a solidão sempre implica alguma forma de trauma ou desencanto com a vida.

Segunda: sim, tenho problema com as mulheres, quem não tem? Só os mentirosos. Vou contar uma história. No maravilhoso livro "Contraponto", de Aldous Huxley, existem duas personagens femininas, entre outras, Marjorie e Lucy. A primeira é aquele tipo clássico da mulher que se faz vítima do homem, grávida e traída. A segunda é o outro tipo clássico de mulher (e oposto à Marjorie), o ideal de toda mulher moderna: a devoradora de homens, que transa com quem quer.

Lucy, em sua vivência de mulher livre, descobre um tesouro de sabedoria: só os gays não têm problemas com as mulheres porque são indiferentes a elas. Ser bem resolvido com as mulheres é ser gay. Para o gay, a mulher é obsoleta. Exigir dos homens "afetos corretos" para com as mulheres é querer que todos sejam gays. O mesmo vale para as mulheres: toda mulher tem problema com os homens. Quando se trata da relação entre homens e mulheres, estamos num pântano de medo, insegurança, baixa autoestima e jogos de manipulação. O inferno do desejo.
 
Conhece?

E por que existe tanta gente que faz uso desse marketing de comportamento dizendo por aí que "hoje temos outra cabeça"? De novo, dou duas respostas.

Primeira: eu me vendo como bem resolvido para fazer os outros se sentirem mal e com isso elevo minha autoestima. Nunca subestime a delícia que é fazer o outro se sentir mal mesmo que você não esteja se sentindo tão bem assim.

Segunda: como derivação da primeira, eu me vendo como bem resolvido para elevar meu preço no mercado dos afetos e das relações.

As duas se resumem no velho pecado da vaidade. Esse é apenas um dos sete pecados capitais (caso a cara leitora queira saber mais, leia são Tomás de Aquino). Melhor do que todo o papo de luta de classes, ideologia, política dos corpos, sexismo e blá-blá-blás associados, experimente usar os sete pecados capitais para ver se eles não iluminam a chacina cotidiana em que você vive.

> Artigos de Luiz Felipe Pondé.

> Traição feminina cresce e a masculina cai.
novembro de 2008

Comentários

Anônimo disse…
Somente um cara bem resolvido com sua própria incapacidade de ser bem resolvido, como Pondé, pode dizer o que diz.
A coragem não é ausência de medo, senão a capacidade de mensurar as imposturas. Não para corrigí-las. Inexiste correção para tudo(principalmente para os afetos). Ela, a coragem, serve para lidarmos com o medo, para aceitá-lo com parte constituiente de nossa condição: seres marcados pela falta, inatamente incompletos. Dai, talvez, nasça esse sentimento, no mínimo, desagradavél.
Anônimo disse…
As palavras escondem muitas inaptidões. Proliferam os discursos, onde inexistem obras. Não são os homens que têm problemas com mulheres, nem as mulheres que têm problemas com homens, mas todos têm problemas com todos. Quem disse que mulher, por exemplo, não tem problema com as outras? E que os homens, com seu corporativismo, sua homoafetividade e até homossexualidade sublimadas no esporte, na amizade, não tem problemas consigo mesmos? Eles todos competem inconscientemente entre si pelo falo maior...O que o texto do autor demonstra, embora não seja politicamente correto, como bem recorda o comentarista de acima, julgar a crítica alheia que nasce da própria admissão da incompetência; mas fazemo-lo aqui só para elucidar pela lógica do discurso o que está oculto; É QUE SEU FRACASSO COM AS MULHERES PRECISA DE RAZÃO E JUSTIFICATIVA; SÓ GAYS E ALGO MAIS com o que se desidentifica, ou diferencia, ou seja , TUDO QUE É NÃO ELE, é que não tem problema com mulher. Postura tipicamente machista ou feminista, não importa, seu discurso é misógino e sexista. Em outras palavras, EU NÃO SOU GAY, EU NÃO SOU MENTIROSO, estou justificado por ter problema com as mulheres. Poderia ser, por acaso, por ter disfunção erétil, pênis pequeno, ejaculação precoce, ser feio, derrotista, tirânico benévolo, egocêntrico, narcisista? Claro que não, isto são coisas de autoajuda...Ha , ha, ha, ninguém subestime a delícia de encontrar um monstro pior para analisar, que sua própria barafunda mental!
Concí Sales disse…
Só gay e mentiroso não tem problema com mulher.

Negativa Universal.

Em se tratando da boa e velha lógica, convêm desconfiar das afirmativas ou negativas universais, exatamente por serem ou totalmente inclusivas ou exclusivas, levando-nos a incorrer nos erros ou vícios do pensamento, tanto de generalização, quanto do monismo, e exceção. Tomar uma única coisa, particular, como universal e geral, eis um vicio próprio dos preconceitos humanos, sempre bem fundados numa razão...própria. O contrário, deduzir dos universais coisas peculiares, pessoais, e tomá-las como princípios únicos, a partir dos quais tudo pode ser explicado: vício característico dos preconceitos de linguagem, pois a linguagem é nosso modo de ser no mundo.
O que quer dizer alguém que..."só gay e mentiroso não tem problema com mulher"? O comentador ou comentadora acima, evidenciou pontos interessantes, aos quais eu gostaria, com o perdão da intromissão não solicitada, de acrescentar outros: 1o. Alguns mentirosos, ou alguns gays, não têm problema com mulher. 2o. Alguns não mentirosos, não gays, também NÃO TÊM PROBLEMAS com mulheres! Agora, diz a lógica que de premissas falsas, não podemos extrair conclusões verdadeiras...então, eu pergunto: evidencia o texto, ou pretende evidenciar, que o autor: não tem problema com mulheres? Posto que dialeticamente, admitir que só gays e mentirosos não os tem, e se ele tem, é porque não tem problema algum com isso, não é mesmo? Ou porque não é gay ou porque não é mentiroso? Mas se ele fosse (não gay) mentiroso?
Fica a dúvida no ar...ou melhor, na virtualidade.
Anônimo disse…
Que silogismo hein...
Anônimo disse…
Quantos sofismos, meu Deus! Quanta fertilidade infértil em "modos de ser no mundo". Hermenêutica, pretensa hermenêutica: Quê dó!
Anônimo disse…
Enquanto homens e mulheres continuarem disputando o poder no plano das representações simbólicas eles fatalmente continuarão sim a ter problemas uns com os outros (provavelmente indefinidamente). Qual o problema nisto? Resta saber apenas realmente a efetiva relevância do que fatalmente já faz parte essencial da "natureza" do convívio humano.
Concí Sales disse…
A comentadora está corretíssima, quanto à questão do gênero, da qual só me parece estar bem fundamentada, o que não ocorre com os seus críticos, que tropeçam nele, a partir do próprio gênero gramatical. Sofismos no masculino, e outras derrapagens comuns, que revelam uma matriz verbolinguística deficitária, biopsicossocial pobre, compreensível em se tratando de aspectos ontofilogenéticos da sociabilidade. É brilhante o texto da comentadora, sob os aspectos da lógica e da dialética, que seus críticos confundem impropriamente, obviamente por serem leigos, com hermeneutica...Elucida o ideário do autor, seus dissimulados preconceitos, e sem nenhum juizo de valor pessoal, pois todos nós temos nosso próprio viés sociopsicológico e literário; desmistifica seus ardis inteligentes, irônicos, com os quais banaliza a violência simbólica, porém não menos real, contra as mulheres. O texto mistura os conceitos, desqualifica o feminismo enquanto confunde-o pela profusão de terminologias em miscelânea, anfibologias, retorsões de argumentos; estratégia bem peculiar, que caracteriza o estilo próprio desse autor, eclético, aparentemente livre-pensador; pseudocrítico, porém defendendo um ponto fundamental, quiçá dogmático: pecado do qual nenhum de nós está isento, quando se trata de opinião, ou verdade pronta, para dar a discussão por encerrada. Parabéns à comentadora, e quanto aos seus críticos, também parabéns, que leiam mais, mais bons livros e mais leituras!
Anônimo disse…
Nunca li tanta merda. O Pondé se supera quando o assunto é mostrar-se conservador.

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