por Vera Guimarães Martins
para Folha
Morreu pagã, sem receber o batismo das ruas, a campanha publicitária contra o preconceito que a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea) previa para este mês.
Com frases como "se Deus existe, tudo é permitido"; "a fé não dá respostas, só impede perguntas" e "somos todos ateus com os deuses dos outros", foi recusada em São Paulo, Salvador e Porto Alegre, as três cidades do país em que estava programada.
Aqui, como na Austrália, foi vetada pelas empresas de ônibus, que estampariam os outdoors ambulantes. Nenhuma quis meter a mão num vespeiro que envolve fé e religião.
Menos mal que a censura não tenha vindo do governo, como na Itália. Pena ter perdido a oportunidade de despertar a polêmica vivida na Inglaterra e Espanha. Sem entrar no mérito do conteúdo, a campanha poderia jogar os holofotes no postulado que prega a superioridade moral daqueles que creem em algum deus.
Estimados em 2% ou 3% da população, os ateus foram, ao longo dos tempos, uma minoria silenciosa e quase invisível. Invisibilidade conveniente, tendo em conta a inquisição sociorreligiosa que fez -e faz- da condição um insulto.
Mas a minoria descrente cansou de apanhar em silêncio.
Há dois meses, quando Frei Betto escreveu na Folha que os torturadores da ditadura eram ateus militantes, choveram protestos à ombudsman, no "Painel do Leitor", em blogs. Curioso é que os sem deus entraram no artigo como Pilatos no Credo, uma menção lateral num texto cujo intuito era atestar a religiosidade da candidata Dilma Rousseff.
O frade dominicano tentou explicar depois, em entrevistas, seu conceito de "ateu militante", mas a emenda não colou -retórica à parte, por crença ou obrigação religiosa, seu discurso só ajuda a reforçar a ladainha de que o mal é monopólio de quem não crê.
Ironicamente, é o mesmo ponto de vista do apresentador José Luís Datena, que em seu programa de TV tascou na conta do ateísmo a existência de crimes hediondos, bandidos, estupradores e assassinos. E elaborou: "Ateus são pessoas sem limites, por isso matam, cometem essas atrocidades. Pois elas acham que são seu próprio Deus".
Que duas figuras tão ideologicamente distintas comunguem o mesmo preconceito simplório revela o quanto ele está arraigado. E convém ressaltar que elas são só duas vozes do coro, mas o mantra é de uso geral e consagrado.
A campanha publicitária dos ateus e agnósticos era a chance de desafinar, levando às ruas mensagens que a maioria religiosa provavelmente encararia com desconforto ou até como ofensa pessoal. Seria no mínimo divertido assistir. Com muita sorte, poderia até ser educativo.
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Comentários
então pq o ateismo teria algum incentivo se é considerado inimigo da elite podre?
O regime político que mais matou pessoas no séculos XX (o comunismo) era ateu. Os homens sempre tiveram o costume de matarem uns aos outros, com Deus ou sem Deus. Eu fico admirado com a ingenuidade dos ateus alegrinhos de hoje, que acham que um mundo onde todos fossem ateus seria, automaticamente, um mundo melhor. Eles possuem a mesma mentalidade dos militantes de esquerda dos anos 70.
Enquanto o Anônimo 18:19 usou um comentário de tendência moral (ainda assim, o que ele fala não é inverídico), você, utilizou-se de um comentário de excessiva carga proselitista política e popular. Na falta de uma crítica racional, culpa-se "a esquerda", "a direita", o regime x, o regime y... e tudo volta-se ao ataque pessoal. Não seria você um egocêntrico ideológico?
É. Falta mesmo aos brasileiros uma boa dose de escola, raciocínio e discernimento antes de soltarem disparates.
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