Título original: Vigília
por Luiz Felipe Pondé para Folha
Você tem baixa autoestima? Se sua resposta for "não", provavelmente se enganou.
Por quê? Porque todo mundo tem baixa autoestima por razões óbvias: falta de grana, de afeto, de saúde. E corpo e alma são feitos de grana, afeto e saúde.
Esse tripé é a chave para os aproveitadores do sobrenatural "acertarem" com frequência suas consultas sobre o destino de suas vítimas.
Resumindo a dor humana, tudo cabe nesse tripé. Basta atirar numa dessas razões óbvias, seguindo alguns critérios de como o cliente se apresenta, que a chance de acertar é grande.
Quase sempre o cliente é mulher, dizem os especialistas. Os homens seriam mais céticos. Por quê? Porque, dizem, "almas femininas" são mais dadas a crenças ingênuas. Eu cá tenho minhas dúvidas sobre isso porque conheço mulheres que deixam qualquer assaltante de banco assustado pela frieza com a vida.
Se for jovem, menos chance de ser doença, a menos que seja na família (neste caso, a menina tem que ter uma carinha de madre Tereza de Calcutá, do contrário, o que é mais provável, é quase sempre amor, porque meninas só pensam em meninos, graças a Deus).
Se for mais velha, saúde pode ser uma boa pedida. Mas, se estiver mal vestida, grana pode ser a causa também. Quando falta grana, a saúde normalmente falta também. Ou faltará.
Mas divago. Voltemos à miséria da baixa autoestima.
O mercado da autoestima cresce com livros e treinamentos e conferências para motivação e assertividade. O efeito dura uns dois dias, dependendo do estado de espírito. Se a dor for muito grande, a dependência da autoajuda poderá se tornar um vício.
Eu, que sou um medieval em matéria de natureza humana (afora alguns trágicos modernos), confio mais nos antigos e medievais, justamente porque não temiam ver o ser humano como um miserável em termos de autoestima.
Como o pensamento moderno e contemporâneo é um pensamento "para um mundo melhor", só pode virar autoajuda.
Entre outros, adoro santo Agostinho (354 d.C.-430 d.C.). Meus alunos, moçada de 18 ou 19 anos, da elite econômica, lêem santo Agostinho. Eles discutem pecado, graça, inferno, o Mal, Deus, mito de Adão e Eva e afins.
E sem qualquer um desses "recursos didáticos" inventados para o professor não ter que dar aula ou não ter que entender do assunto.
Quase toda a pedagogia "moderna" é blá-blá-blá. E grande parte dos problemas da sala de aula é fruto da baixa vocação dos professores e do fato de que grande parte dos estudantes não tem nenhuma vocação para aprender qualquer coisa além do que interessa para garantir um lugar no mercado de trabalho.
Inteligência sempre foi uma maldição de poucos e isso nada tem a ver com grana ou com você ser uma pessoa moralmente legal. A falta de grana apenas ajuda a esmagar você mais rápido, o que piora se você for uma pessoa mais sensível.
Baixa autoestima é a regra do mundo. Todo adulto sabe disso. No trabalho, no corpo, na alma. Mas ficou na moda dizer que todo mundo é "maravilhoso!".
Voltando a um dos meus santos favoritos, santo Agostinho. Segundo dizem, ele não era um cara fácil. É sempre assim com os santos: nunca são santinhos.
Entendia de ser humano. Sabia que no fundo da alma habita o medo da tristeza e do fracasso, inevitáveis quando se é mortal (em todos os sentidos do termo).
Ao contrário do que se diz, quando acreditamos nesse blá-blá-blá de "amar a si mesmo", afundamos na miséria da baixa autoestima, porque conhecemos no silêncio de nós mesmos as baixarias que compõem a substância de nossa alma. Dentro de cada um de nós habita um demônio em vigília.
"Autoestima" é um termo contemporâneo, mas cabe bem na reflexão agostiniana sobre a vaidade como prisão psicológica.
Existe coisa mais brega do que querer amar a si mesmo? Amar a si mesmo é vão.
Uma pérola de santo Agostinho para começar sua semana: se você quiser ser livre, ame. Isso aí: não é buscando ser amado que escapamos da miséria da baixa autoestima, mas amando. Qualquer egoísta pode ser amado. Os melhores dias da minha vida são aqueles em que eu não lembro que existo.
Nada mais brega do que acreditar que você tem virtudes.
dezembro de 2010
Artigos de Pondé.
por Luiz Felipe Pondé para Folha
Você tem baixa autoestima? Se sua resposta for "não", provavelmente se enganou.
Por quê? Porque todo mundo tem baixa autoestima por razões óbvias: falta de grana, de afeto, de saúde. E corpo e alma são feitos de grana, afeto e saúde.
Esse tripé é a chave para os aproveitadores do sobrenatural "acertarem" com frequência suas consultas sobre o destino de suas vítimas.
Resumindo a dor humana, tudo cabe nesse tripé. Basta atirar numa dessas razões óbvias, seguindo alguns critérios de como o cliente se apresenta, que a chance de acertar é grande.
Quase sempre o cliente é mulher, dizem os especialistas. Os homens seriam mais céticos. Por quê? Porque, dizem, "almas femininas" são mais dadas a crenças ingênuas. Eu cá tenho minhas dúvidas sobre isso porque conheço mulheres que deixam qualquer assaltante de banco assustado pela frieza com a vida.
Se for jovem, menos chance de ser doença, a menos que seja na família (neste caso, a menina tem que ter uma carinha de madre Tereza de Calcutá, do contrário, o que é mais provável, é quase sempre amor, porque meninas só pensam em meninos, graças a Deus).
Se for mais velha, saúde pode ser uma boa pedida. Mas, se estiver mal vestida, grana pode ser a causa também. Quando falta grana, a saúde normalmente falta também. Ou faltará.
Mas divago. Voltemos à miséria da baixa autoestima.
O mercado da autoestima cresce com livros e treinamentos e conferências para motivação e assertividade. O efeito dura uns dois dias, dependendo do estado de espírito. Se a dor for muito grande, a dependência da autoajuda poderá se tornar um vício.
Eu, que sou um medieval em matéria de natureza humana (afora alguns trágicos modernos), confio mais nos antigos e medievais, justamente porque não temiam ver o ser humano como um miserável em termos de autoestima.
Como o pensamento moderno e contemporâneo é um pensamento "para um mundo melhor", só pode virar autoajuda.
Entre outros, adoro santo Agostinho (354 d.C.-430 d.C.). Meus alunos, moçada de 18 ou 19 anos, da elite econômica, lêem santo Agostinho. Eles discutem pecado, graça, inferno, o Mal, Deus, mito de Adão e Eva e afins.
E sem qualquer um desses "recursos didáticos" inventados para o professor não ter que dar aula ou não ter que entender do assunto.
Quase toda a pedagogia "moderna" é blá-blá-blá. E grande parte dos problemas da sala de aula é fruto da baixa vocação dos professores e do fato de que grande parte dos estudantes não tem nenhuma vocação para aprender qualquer coisa além do que interessa para garantir um lugar no mercado de trabalho.
Inteligência sempre foi uma maldição de poucos e isso nada tem a ver com grana ou com você ser uma pessoa moralmente legal. A falta de grana apenas ajuda a esmagar você mais rápido, o que piora se você for uma pessoa mais sensível.
Baixa autoestima é a regra do mundo. Todo adulto sabe disso. No trabalho, no corpo, na alma. Mas ficou na moda dizer que todo mundo é "maravilhoso!".
Voltando a um dos meus santos favoritos, santo Agostinho. Segundo dizem, ele não era um cara fácil. É sempre assim com os santos: nunca são santinhos.
Entendia de ser humano. Sabia que no fundo da alma habita o medo da tristeza e do fracasso, inevitáveis quando se é mortal (em todos os sentidos do termo).
Ao contrário do que se diz, quando acreditamos nesse blá-blá-blá de "amar a si mesmo", afundamos na miséria da baixa autoestima, porque conhecemos no silêncio de nós mesmos as baixarias que compõem a substância de nossa alma. Dentro de cada um de nós habita um demônio em vigília.
"Autoestima" é um termo contemporâneo, mas cabe bem na reflexão agostiniana sobre a vaidade como prisão psicológica.
Existe coisa mais brega do que querer amar a si mesmo? Amar a si mesmo é vão.
Uma pérola de santo Agostinho para começar sua semana: se você quiser ser livre, ame. Isso aí: não é buscando ser amado que escapamos da miséria da baixa autoestima, mas amando. Qualquer egoísta pode ser amado. Os melhores dias da minha vida são aqueles em que eu não lembro que existo.
Nada mais brega do que acreditar que você tem virtudes.
dezembro de 2010
Artigos de Pondé.
Comentários
Eu penso como um medieval também. Os romances de cavalaria (medievais e portugueses) diziam muito mais sobre os seres humanos que duzentos anos de psicanálise e bla bla bla humanistas.
E pelamordedeus, reencarnação de Schopenhauer?! hehehe. Schopenhauer era um asceta que, se pudesse, viveria numa bolha.
E ele tem algo de equivocado, para além de superficial, quando ele vem com esse papo de que 'vou encerrar esse assunto descobrindo qual é o seu fio da meada e atacando ele'. Como se ele pudesse dizer algo assim, bem superficialmente: bem, Antonio Negri é um spinozista. Ele entorta o Espinoza para justificar sequestros e assassinatos. PAra, daí em diante, destruir o edifício, ou a obra do cara.
Cá entre nós, pode ser um caminho para não se perder tempo com muitas bobagens que são vistas na Academia. MAs, em contrapartida, pode degenerar em ignorância.
Hoje, pela primeira vez (ora que vergonha!), li o seu artigo, que me chegou pelas mãos de um amigo, logo no café da manhã. Na hora, exclamei: Eu queria ter escrito isso! Agora sou sua "seguidora", mas não pagarei o dízimo, senao o da fidelidade. Quando tiver um tempo, passe no meu blog. Se gostar, terei prazer em recebe-lo como "seguidor" (eita palavrinha danada de feia, né?) Um abraço e parabéns!!!
O que você quis dizer? Que o público da Folha Ilustrada aceita qualquer merda? Se for assim, então os textos deles são mesmo ótimos e estão bem de acordo com o público alvo. Pensando bem, deve ser isso mesmo, pois é difícil acreditar que um cara com a bagagem intelectual dele possa escrever tão mal e com ideias tão rasas.
Pondé bem resolvido? Você deve estar brincando. Ele é o primeiro a admitir que NINGUÉM é bem resolvido, que isso não passa de balela do "marketing de comportamento". Quanto à questão da profundidade ele também já admitiu que se acha extremamente profundo, pois disse que tem poucos amigos e gente que tem muitos amigos é superficial. Para um bom entendedor um pingo é letra, como diz o ditado.
Você não tem feito sua lição de casa direito, hein menino!
Nada imitei de ninguém
E ainda ri de todo mestre
Que não riu de si também.
"Epígrafe de A Gaia Ciência"
obs: lembrando que minha versão é os Pensadores- tradução e notas:Rubens Rodrigues Torres Filho.
Literatura e Filosofia- existem fazer com que o indivíduo faça uma reflexão de si mesmo, e não para expelir frustrações"
Gostei em parte de seu texto, mas me pergunto sobre a bréguice de amar a si mesmo, concordo que nos últimos tempos os livros de autoajuda são alienantes e enfadonhos, pois não ensinam a amar as partes degradantes de nosso ser, apenas tentam nos iludir dizendo que nos somos feitos apenas de coisas bonitinhas. Ou quando não é isso o homem conclui que ele é um ser desprezível desprovido de esperança ou de conduta moral.
Acreditava que eram os brasileiro todos uns hiperbólicos, mas vejo que é a humanidade como um todo, sempre se apegando aos extremos, nunca consegui vislumbrar o quadro geram, pois é mais fácil colocar-se um cabresto de negatividade mórbida ou positividade purpurinada, baixa auto estima afeta todos os seres? “sim” e todos os seres tem auto auto estima? “sim” a vida não é como uma roxa parada e estática, o equilíbrio da vida é dinâmico estamos lá em cima depois descemos e voltamos a subir e novamente... Áh vocês sabem todo o resto pois são seres vivente e isso afeta a todos dês da barata que você matou na cozinha, o seu cachorro, ao babaca que passa perto da sua casa com o som do carro no ultimo volume em plena 3h da madrugada!
Me chamou a atenção o conformismo humano, sempre buscando encaixar tudo em sua visão limitada de livro de autoajuda ou de romances romântico (isso não parece redundante?) de terceira faze putrefata .
Luiz Felipe Pondé é a roda do carro na beira do abismo
enquanto muitos ja cairam!!!
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