Quando o astrofísico americano-canadense Lawrence Krauss publicou o livro A Universe From Nothing ("Um Universo do Nada", em tradução livre), ele causou furor entre religiosos que o acusaram de querer acabar com Deus. Krauss respondeu que essa é a ideia do livro.
Na entrevista que concedeu em Washington a Lígia Hougland, do portal Terra, Krauss, que se apresenta como antiteista, falou um pouco de sua tese — polêmica até entre os cientistas — de que tudo veio do nada e que o universo foi formado por um acidente, sem qualquer intervenção divina. Para ele, é cada um de nós que cria um significado para a vida. E é justamente por isso que a vida vale mais a pena.
Segue a entrevista.
Lígia Hougland — De acordo com sua teoria, o universo é apenas um acidente que aconteceu sem a supervisão de um ser superior. A ideia de que estamos aqui por acaso não implica que a vida não tem um sentido maior?
Lawrence Krauss — Não há propósito evidente para o universo. A vida no nosso universo pode ser apenas um acidente. Podemos tentar entender como o universo foi criado, mas não temos como identificar um objetivo evidente. Mas isso não deve nos desolar. É motivo para sermos mais felizes. O propósito e o significado da nossa vida são criados por nós. Isso nos dá mais poder. Em vez de sermos governados por um ditador universal, como meu amigo Christopher Hitchens diria, criamos nosso próprio significado. Isso deve nos empolgar, pois dá mais sentindo a tudo que fazemos.
Você não acha que sua mensagem pode fazer com que muitas pessoas percam a vontade de viver, se acreditarem que não existe nada além desta vida, que não há um ser superior que se importa com elas e que não passamos de um acidente?
Ao contrário, temos que tirar o máximo de proveito deste incrível acaso. Temos muita sorte de estarmos aqui, de termos a capacidade de pensar, experimentar o universo em toda a sua glória, poder entender até os seus primeiros momentos. Somos incrivelmente sortudos. Devemos explorar tudo que for possível, todas as aventuras que encontrarmos, intelectuais e de outras naturezas.
No seu novo livro, você fala em multiversos, ou seja, na existência de diversos universos passados, presentes e futuros, teorizando que talvez não existam leis universais da física e que as leis da física podem ser diferentes de acordo com cada universo. Como que o nada pode produzir resultados diferentes?
Talvez não exista mesmo um conjunto universal de leis da física. No caso de multiversos, é muito possível que cada universo tenha leis diferentes. O fato de o nada poder produzir universos diferentes é, na verdade, bem simples. A mecânica quântica nos mostra que tudo está acontecendo ao mesmo tempo e que todas as possibilidades são realizadas. Mesmo em um espaço vazio, há partículas saindo do nada, constantemente. Não apenas isso acontece, como é vital. Na verdade, a maior parte da massa corporal de uma pessoa é determinada pelas partículas que saltam, constantemente, para dentro e para fora do espaço, neste exato momento. A mecânica quântica nos diz que o nada vai, eventualmente, produzir algo. O nada é instável.
Qual é a probabilidade de estes multiversos estarem interagindo com o nosso universo?
Há diversos tipos de multiversos. Uma possibilidade é que existem muitos universos tão desconectados de nós que nunca interagirão com o nosso universo. Nesse caso, nunca os conheceremos empiricamente, eles sempre estarão separados de nós. No caso da teoria das cordas (string theory, o termo em inglês mais usado), há a possibilidade da existência de outros universos literalmente a um milímetro do meu nariz, em outra dimensão. Nesse caso, é possível que algo que acontece em um universo pode impactar outro universo. Portanto, algumas coisas que vemos no nosso universo podem ser fatores aleatórios que estão acontecendo em outro universo.
Considero presunçoso se dizer ateísta, pois não posso garantir que o universo não foi criado com um objetivo, apesar de não haver nenhuma evidência disso. Mas posso dizer que não gostaria de viver em um universo onde existe um Deus, um universo onde eu não passaria de um cordeiro, sem controle sobre a minha existência. Um universo no qual, no caso de algumas religiões, se você faz algo errado, você fica condenado pela eternidade. É um conceito ridículo e horrível. Prefiro viver em um universo onde conquisto um significado para a minha vida e uso minha cabeça para agir, em vez de ser mandado por um Deus que, por vezes, é muito vingativo.
> Com informação do portal Terra.