por Natália Martino, da Istoé
Em 1889, os republicanos que acabaram com a monarquia no Brasil pensaram que também haviam conseguido separar a religião do Estado com a sua nova constituição. Naquela data, o país se tornara oficialmente laico. No entanto, mais de um século depois ainda não é isto que se vê na prática. Aulas de ensino religioso são ministradas em escolas públicas, crucifixos têm lugar de honra em salas de tribunais, estudantes são obrigados a rezar antes das aulas e testemunhas são convocadas a jurar sobre a “Bíblia” em julgamentos.
É a Constituição que deve ser lida nas escolas, e não a Bíblia.
por Rogério Santos em janeiro de 2012
Respeito aos outros não pode ser amparado em divindade.
por Roseli Fischmann em março de 2011
Religião no Estado laico.
Em 1889, os republicanos que acabaram com a monarquia no Brasil pensaram que também haviam conseguido separar a religião do Estado com a sua nova constituição. Naquela data, o país se tornara oficialmente laico. No entanto, mais de um século depois ainda não é isto que se vê na prática. Aulas de ensino religioso são ministradas em escolas públicas, crucifixos têm lugar de honra em salas de tribunais, estudantes são obrigados a rezar antes das aulas e testemunhas são convocadas a jurar sobre a “Bíblia” em julgamentos.
Somente nas últimas semanas, vieram à tona casos que mostram como a questão da presença da fé em ambientes públicos está viva e suscita debates na sociedade civil, opondo setores que são contrários e favoráveis a essa intervenção.
No município de Ilhéus, na Bahia, por exemplo, os estudantes da rede municipal de ensino têm sido obrigados a rezar antes das aulas desde o dia 13 de fevereiro, o que já provocou uma reação do Ministério Público, que investiga a legalidade da “Lei do Pai-Nosso”.
Num movimento contrário, o Tribunal de Justiça (TJ) do Rio Grande do Sul retirou os crucifixos de suas salas de julgamento. Em Brasília, o Supremo Tribunal Federal (STF) avalia argumentos de instituições civis ligadas à educação e aos direitos humanos sobre a inconstitucionalidade do ensino religioso confessional, que garante espaço privilegiado para determinadas crenças, de acordo com as preferências dos alunos ou dos seus responsáveis.
“Essa possibilidade estava explícita nas Constituições de 1934 e 1946, mas foi derrubada na atual, de 1988, e isso por si só já deve ter algum significado”, diz o ministro do STF Celso de Mello. O receio é de que o espaço público sirva a pregações religiosas.
Incomodados com essa distorção, entidades estão organizando manifestações públicas pelo Estado laico em três capitais – em Porto Alegre aconteceu na quinta-feira 22, no Rio de Janeiro está marcado para 10 de abril e em São Paulo para o dia 14.
Incomodados com essa distorção, entidades estão organizando manifestações públicas pelo Estado laico em três capitais – em Porto Alegre aconteceu na quinta-feira 22, no Rio de Janeiro está marcado para 10 de abril e em São Paulo para o dia 14.
De acordo com Salomão Ximenes, advogado da ONG Ação Educativa, em muitas situações a determinação constitucional de que o ensino religioso seja facultativo (artigo 210) não tem sido respeitada. Caso do Estado de São Paulo, que permite que o conteúdo da disciplina seja transversal – com isso, a religião fica diluída em várias matérias, impedindo o aluno de escolher ou não assistir às aulas.
Há casos também de cerceamento de liberdade de crença. De acordo com a Relatoria do Direito Humano à Educação, que está investigando casos de intolerância religiosa em escolas do país, os adeptos das denominações africanas são os que mais sofrem.
Da Escola Estadual Antônio Caputo, em São Bernardo do Campo (SP), vem um dos exemplos dessa intolerância. Magno Moarcys Silveira, 15 anos, praticante do candomblé, passou a sofrer bullying depois que declarou à professora de história que não queria mais ouvir sua pregação bíblica, que acontecia durante cerca de 20 minutos antes das aulas. “Quando fui conversar com a professora, ela foi agressiva e disse que era parte da sua didática”, diz Sebastião da Silveira, pai do jovem, que fez um boletim de ocorrência na semana passada. “A diretora só se manifestou pedindo desculpas para o meu filho quando eu disse que levaria o caso às últimas consequências.”
Nos tribunais, o que se constata é uma abundância de citações cristãs em sentenças cuja base deveria ser apenas a lei. Em 2008, por exemplo, o juiz Éder Jorge, de Goiânia (GO), recomendou que Vilma Martins, condenada por sequestrar duas crianças, frequentasse durante a condicional um culto cristão, o que, segundo ele, a ajudaria a se recuperar.
Nos tribunais, o que se constata é uma abundância de citações cristãs em sentenças cuja base deveria ser apenas a lei. Em 2008, por exemplo, o juiz Éder Jorge, de Goiânia (GO), recomendou que Vilma Martins, condenada por sequestrar duas crianças, frequentasse durante a condicional um culto cristão, o que, segundo ele, a ajudaria a se recuperar.
“É um argumento preconceituoso”, diz Daniel Sottomaior, presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos. Para Naiara Malavolta, da Liga Brasileira de Lésbicas, que fez uma representação junto ao Tribunal de Justiça (TJ) do Rio Grande do Sul para tirar os crucifixos, o primeiro passo para diminuir essa distorção seria retirar os símbolos. “Eles dão legitimidade aos agentes do Estado para seguir os preceitos daquela crença”, diz. Mas nem dentro do TJ-RS há unanimidade. O desembargador Carlos Marchionatti, por exemplo, defende a presença do crucifixo. “Ele nos lembra do mal que um processo às margens da legalidade, como o de Cristo, pode causar”, diz.
Enquanto o ensino religioso não é julgado, o ministro Celso de Mello adverte: “Precisamos vigiar para que a laicidade do Estado seja mantida se não quisermos que heresia volte a ser crime.”
por Rogério Santos em janeiro de 2012
Respeito aos outros não pode ser amparado em divindade.
por Roseli Fischmann em março de 2011
Religião no Estado laico.
Comentários
Caro Paulo,
Vivemos um momento único em nosso país onde o interesse por temas que eram deixados de lado, como questões como aborto, direito dos homossexuais; estado laico; passam a fazer parte das preocupações das pessoas comuns.
De algum modo, acredito eu, resultado de uma estabilidade econômica que permite o acesso a informação e a observação mais primitiva de que, qualquer coisa que possa afetar esta estabilidade, causa medo.
Afloram a religiosidade midiática com enorme força e o conflito de ideias entre diversos grupos de pensamento e suas reações mais primitiva de imposição de suas crenças pessoais aos outros, sem o necessário cuidado com o frágil tecido das relações sociais.
De algum modo, os grupos humanistas e os livres-pensadores necessitam firmar seus ideais como soluções viáveis a convivência harmônica de crenças e filosofias em oposição ao debate raivoso.
Precisamos mostrar antes, a utilidade do estado laico e chamar as pessoas a reflexão. Nos apoiar na história e nos erros cometidos no passado que podem ser evitados se seguirmos esses modelos de estado.
Cabe a manifestação. Mas antes de tudo é dever dos secularistas levar seu pensamento de forma quase proselitista as camadas menos sensíveis ao seu entendimento. O que é estado laico? Estado laico é contra minha fé? Quais os limites de minha crença?
Se nos fizermos isso, toda essa discussão torna-se abstrata demais e restrita a grupos intelectuais acadêmicos.
Luiz – Rio de Janeiro
Vinde a min as criancinhas ... para ver o que há debaixo da túnica!
Ah sim, me esqueci dos Direita Católica: Yves Gandra, Olavo de Carvalho, Reinaldo Azevedo (Tio Rei), Pe. Paulo Ricardo (aquele assim, meio de lado), o bispo de Guarulhos, José Çerra, Geraldo Chayote Alckmin (Opus Dei)...
No mais, muito bom artigo mesmo! Seria interessante ressaltar que a Constituição de 1891 foi expressa em dizer que o ensino seria laico, não prevendo a modalidade de ensino religioso em escolas públicas (facultativo ou não, confessional ou não). Era um avanço que foi sendo perdido nas constituições seguintes...
Eu tive da quinta até a oitava série, mas nada que se comparasse a atitude dessa professora que obrigava os alunos a orar. Me lembro que eles chegaram a distribuir bíblias pequenas para os alunos, mas foi só.
Quanto ao ensino religioso não sou a favor, pois são muitos os credos e isso sem dúvida prejudicaria as crianças. O bom exemplo, o equilíbrio e o amor nas crises é o melhor ensino religioso.
"Nos tribunais, o que se constata é uma abundância de citações cristãs em sentenças cuja base deveria ser apenas a lei. Em 2008, por exemplo, o juiz Éder Jorge, de Goiânia (GO), recomendou que Vilma Martins, condenada por sequestrar duas crianças, frequentasse durante a condicional um culto cristão, o que, segundo ele, a ajudaria a se recuperar.
As leis estão aí para que com base nelas um cidadão ou cidadã que tenha cometido crimes seja absolvido ou condenado, mas elas não podem ajudar na recuperação desse mesmo individuo.
A palavra de Deus quando ministrada e recebida com amor recupera o indivíduo.
O que acontece realmente é que muitos dos que são contra o evangelho, são contra porque este condena as suas práticas pecaminosas.
Acho q existe um certo exagero tanto da parte de quem defende o estado laico DE FATO, quanto de quem defende que permaneça como está e mais ainda de quem defende que se torne confessional.
Porém, discordo do fim. Muitas pessoas são contra o "evangelho", inclusive cristãos que não o praticam ou praticam somente o que consideram agradável, porque o consideram injusto ou defasado. Mas de qualquer modo, a questão não é essa, o ponto é que qualquer livro (ou prática) religioso pode considerar determinada coisa como errada, ou pecado como vcs chamam, mas o estado não pode se basear nisso para nada pq o que deve reger o estado é a CF.
As práticas religiosas são opção das pessoas, não devem ser impostas.
Deixa de ser um desonesto intelectual (se isso for possível). Vc está desviando do assunto em questão.
Esse post é sobre a laicidade do estado, sobre a imposição forçada (e inconstitucional) de uma determinada religião feita em prédios públicos e instituições do governo por alguns de seus funcionários que seguem essa religião.
Não tem nada a ver com o kit anti-homofobia.
Isso não me choca mais. Na minha cidade de Divinópolis-MG, acontece um absurdo: Há missa dominical dentro do Pronto Socorro Regional!
Ou seja, um espaço de domínio do estado (município), que é frequentado por todas as crenças (a frequência não é opcional, pois não há outro). e além da Missa Dominical, a várias visitas de pessoas ligadas ás igrejas católicas oferecendo orações e benções....
O que me espanta é o oportunismo de angariar mais fieis, pois que está em um pronto socorro, se encontra com problemas de saúde para ele mesmo ou um ente querido, ou seja, está muito fragilizado. Mesmo que a pessoa não acredite na crença oferecida, não há forças para dizer não! E o que pior, não tem condições de se retirar do local.
Gostaria de denunciar essa pratica, mas não sei como!
É um absurdo!
Isso fatalmente terá o efeito contrário : rejeição.
O exemplo da união soviética querendo empurrar o ateísmo goela abaixo do povo, é verdadeiro.
A única diferença era que na união soviética não se podia recorrer a justiça, aqui pode.
O Brasil é laico sim, mas essa laicidade está sendo ameaçada graças à bancada religiosa no congresso e à atitudes de alguns religiosos como aquela professora que fazia proselitismo religioso em suas aulas e que ameaçava dar zero aos alunos que não rezassem (e que - como resultado - fez com que um aluno praticante de candomblé sofresse de bullying graças à "tolerância" dela em relação às diferentes crenças) e aquela psicóloga Maria do Bairro.
Vemos projetos de leis sendo criados por políticos da bancada religiosa baseados unicamente nos dogmas da religião deles; a bancada evangélica inventar um projeto de lei onde eles terão poder de vetar qualquer lei ou projeto de lei que eles acham que é inconstitucional; marchas para Jesus sendo bancadas com dinheiro público; políticos rezando antes da sessão no plenário começar; símbolos de apenas uma religião em prédios de instituições governamentais; placas dizendo "Tal cidade pertence ao Senhor Jesus" sendo construidas com o dinheiro dos contribuintes em vez de construir passarelas nas rodovias ou qualquer outra melhoria na cidade que beneficie todos os moradores; projetos de parques evangélicos cuja construção seria custeada com o dinheiro do contribuinte; pastores (como Edir Macedo, Valdermoney e Cia Ilimitada) se achando acima da lei, como fez o Valdermoney ao desobedecer com a maior cara lavada uma decisão da justiça ao abrir aquela mega-church na Dutra depois daquela confusão no mês de dezembro onde pessoas perderam seus vôos graças aos 3.000 ônibus estacionados de qualquer jeito na rodovia, atrapalhando o trânsito (e daí se várias pessoas perderam seus voôs e a oportunidade de passarem as festas de fim de ano com seus entes queridos; o que importa é o mega-templo do "ungido" pastor Valdemiro atraindo um número de fiéis 10x maior que o combinado para idolatrar Chessuis <= insira sarcasmo); a ICAR usando o fundo da Copa para construir um hotel em Aparecida do Norte (que nem sequer é uma cidade-sede dos jogos da Copa); etc.
Evangélicos obrigando pessoas à ouvirem suas pregações (aka gritarias) religiosas em ônibus, hospitais, metrôs (ou seja, em qualquer ambiente fora da igreja) e não nos dando o direito de reclamar e de mostrar o nosso desinteresse e de não dando o direito das pessoas que não são cristãs/evangélicas de terem o direito de exercer o credo religioso de sua escolha ou o direito de não ter nenhuma crença religiosa (alegando "perseguição e opressão religiosa" praticamente todas as vezes que alguém não mostra interesse na religião deles).
Nós - ao contrário de alguns religiosos que parecem querer estabelecer uma teocracia no país - não queremos que o Brasil deixe de ser laico e vire uma "ateocracia (como eu já vi algumas pessoas delirantes e com manias de teorias da conspiração que aqui postam insinuarem isso). O que queremos é que o estado laico seja mantido e respeitado. Que a liberdade de crença e a liberdade de falta de crença sejam respeitadas; que as religiões sejam tratadas igualmente perante à lei, sem mais nem menos; que a crença religiosa - independentemente qual for ela - seja um direito individual e não um dever coletivo; que as religiões fiquem apenas no âmbito que cabem à elas em vez de meterem o bedelho em assuntos do governo, ameaçando a laicidade do estado. Apenas isso.
Será que é pedir muito que a laicidade do estado garantida pela Constituição seja respeitada?
Como assim? O que vc quis dizer com isso?
Postar um comentário