por Carlos Orsi para Folha
Entre várias que circularam nos últimos dias, a crítica mais comum ao pedido do Ministério Público Federal para que o real deixe de trazer a frase "Deus seja louvado" é a de que essa solicitação seria "falta do que fazer".
Uma objeção curiosa porque, primeiro, suscita a pergunta: e quando a frase foi incluída no dinheiro, será que ninguém tinha nada mais importante a fazer? (O lema entrou na moeda com o Plano Cruzado, que acabou levando o país à falência, em 1987.)
Em segundo lugar, a alegação de "falta do que fazer", ao esquivar-se do mérito da questão, embute um reconhecimento tácito de derrota.
É como se o crítico dissesse que sim, a frase não deveria estar lá, mas será que não temos erros maiores a corrigir antes?
Só que a presença do lema no real é um erro grave — viola o princípio geral do Estado laico e a letra da Constituição — e relativamente fácil de corrigir. Então, por que não resolvê-lo, logo de uma vez?
Confrontadas com essa sugestão, muitas das pessoas que vinham argumentando que o problema era irrelevante e, portanto, não precisava ser solucionado, repentinamente convertem-se em defensoras ferrenhas da frase. O que indica que a alegação de irrelevância não passava de mera afetação.
Um pouco sobre o laicismo: ele deriva diretamente do princípio da liberdade religiosa: se todo brasileiro é livre para ter a religião que quiser (ou não ter religião nenhuma), então é errado que o governo, que representa e é sustentado pela totalidade dos cidadãos, eleja favoritos.
O artigo 19 da Constituição proíbe o Estado de "subvencionar" cultos religiosos. E usar dinheiro para mandar as pessoas louvarem a Deus me parece um caso claro de subvenção.
Da mesma forma que seria errado, porque discriminatório, o governo pôr "Vai Corinthians" ou "Sempre Flamengo" na moeda, mesmo sendo estas as nossas torcidas majoritárias, é errado fazer isso com "Deus seja louvado", "Deus não seja louvado" ou "Satanás é o senhor". Todas são frases que uma vez sancionadas pelo Estado, alienam e discriminam cidadãos brasileiros.
Há ainda quem tema que, à remoção da frase, sigam-se extinção de feriados e a mudança dos nomes de cidades, como São Paulo.
O temor ignora, porém, que os nomes de cidades seculares têm peso cultural e histórico muito maior que "Deus seja louvado" (lema adotado nos anos 1980). Sobre os feriados, quantos mantêm caráter, de fato, religioso? O coelhinho da Páscoa e Papai Noel, por exemplo, não têm culto, exceto nas lojas de chocolate ou de brinquedos.
Há ainda a objeção de que "o Estado é laico, mas não ateu". Sim, o Estado não é ateu! Só que ninguém exige que o real passe a dizer "Deus não existe", mas apenas que o dinheiro pare de falar de Deus e ponto. Confunde-se neutralidade com oposição, o que é tolice ou má-fé.
O medo de que a frase desapareça do real reflete, no fim, uma ótica de disputa de prestígio: nesse enfoque, se "Deus seja louvado" sair do dinheiro, isso significará que "os ateus estão mais fortes", ou que o sentimento religioso perdeu relevância na sociedade, o que algumas pessoas consideram intolerável.
É uma interpretação míope. Há muitos religiosos que consideram a frase inadequada, seja por respeito ao caráter laico do Estado, seja por acreditar que o vil metal, causa de tantos crimes e pecados, é indigno do nome do ser supremo.
Se realmente há algum "prestígio" em jogo, certamente não é o do suposto criador, mas apenas o que alimenta a vaidade de alguns de seus autoproclamados representantes aqui na Terra.
Direita religiosa ataca de novo o defensor do Estado laico
novembro de 2011
Religião no Estado laico
Colocar Deus nas cédulas é errado tanto quanto transcrever "Vai, Corinthians!" |
Uma objeção curiosa porque, primeiro, suscita a pergunta: e quando a frase foi incluída no dinheiro, será que ninguém tinha nada mais importante a fazer? (O lema entrou na moeda com o Plano Cruzado, que acabou levando o país à falência, em 1987.)
Em segundo lugar, a alegação de "falta do que fazer", ao esquivar-se do mérito da questão, embute um reconhecimento tácito de derrota.
É como se o crítico dissesse que sim, a frase não deveria estar lá, mas será que não temos erros maiores a corrigir antes?
Só que a presença do lema no real é um erro grave — viola o princípio geral do Estado laico e a letra da Constituição — e relativamente fácil de corrigir. Então, por que não resolvê-lo, logo de uma vez?
Confrontadas com essa sugestão, muitas das pessoas que vinham argumentando que o problema era irrelevante e, portanto, não precisava ser solucionado, repentinamente convertem-se em defensoras ferrenhas da frase. O que indica que a alegação de irrelevância não passava de mera afetação.
Um pouco sobre o laicismo: ele deriva diretamente do princípio da liberdade religiosa: se todo brasileiro é livre para ter a religião que quiser (ou não ter religião nenhuma), então é errado que o governo, que representa e é sustentado pela totalidade dos cidadãos, eleja favoritos.
O artigo 19 da Constituição proíbe o Estado de "subvencionar" cultos religiosos. E usar dinheiro para mandar as pessoas louvarem a Deus me parece um caso claro de subvenção.
Da mesma forma que seria errado, porque discriminatório, o governo pôr "Vai Corinthians" ou "Sempre Flamengo" na moeda, mesmo sendo estas as nossas torcidas majoritárias, é errado fazer isso com "Deus seja louvado", "Deus não seja louvado" ou "Satanás é o senhor". Todas são frases que uma vez sancionadas pelo Estado, alienam e discriminam cidadãos brasileiros.
Há ainda quem tema que, à remoção da frase, sigam-se extinção de feriados e a mudança dos nomes de cidades, como São Paulo.
O temor ignora, porém, que os nomes de cidades seculares têm peso cultural e histórico muito maior que "Deus seja louvado" (lema adotado nos anos 1980). Sobre os feriados, quantos mantêm caráter, de fato, religioso? O coelhinho da Páscoa e Papai Noel, por exemplo, não têm culto, exceto nas lojas de chocolate ou de brinquedos.
Há ainda a objeção de que "o Estado é laico, mas não ateu". Sim, o Estado não é ateu! Só que ninguém exige que o real passe a dizer "Deus não existe", mas apenas que o dinheiro pare de falar de Deus e ponto. Confunde-se neutralidade com oposição, o que é tolice ou má-fé.
O medo de que a frase desapareça do real reflete, no fim, uma ótica de disputa de prestígio: nesse enfoque, se "Deus seja louvado" sair do dinheiro, isso significará que "os ateus estão mais fortes", ou que o sentimento religioso perdeu relevância na sociedade, o que algumas pessoas consideram intolerável.
É uma interpretação míope. Há muitos religiosos que consideram a frase inadequada, seja por respeito ao caráter laico do Estado, seja por acreditar que o vil metal, causa de tantos crimes e pecados, é indigno do nome do ser supremo.
Se realmente há algum "prestígio" em jogo, certamente não é o do suposto criador, mas apenas o que alimenta a vaidade de alguns de seus autoproclamados representantes aqui na Terra.
Direita religiosa ataca de novo o defensor do Estado laico
novembro de 2011
Religião no Estado laico
Comentários
Será por que algum legislador determinou que elas tenham o que fazer?
E o que o legislador tem pra fazer?
Determinar aquilo que os outros vão fazer?
A lei determina que se um ato do governo levar benefícios econômicos, é justo que os beneficiados paguem a contribuição de melhorias. Não seria o caso de cobrar pela publicidade ? aposto que se o governo acenar com tal possibilidade, haverá levas de crentóides exigindo a retirada da frase
Postar narrativa com conotação sexual, ohhhh aí tem que censurar, pois é sexual, então que horror, não é?
Depois, com toda essa aversão sexual, ainda não quer ser chamado de histérico puritano ...
Sarney o expôs em toda sua pequenez, em letras miúdas, onde era o seu lugar, abaixo de uma enorme efígie de Minerva, DEUSA DA PÁTRIA E DA EXCELÊNCIA, que representa a constituição e o estado secular!
As cruzadas mataram milhares de cristãos que viviam na palestina, a igreja perseguiu judeus durante a Idade das Trevas e durante a Segunda Guerra (serviu de inspiração para Hitler).
A soberba era tão grande que, enquanto o papa lambia as bolinhas de Luis XV, ignoraram o exército, este passando a abraçar a miséria junto com a população. Napoleão não deixa por menos, e persegue menos a nobreza que ao clero. Vai até a Espanha para expor a inquisição.
Mas o que tem a ver os direitistas com a igreja. Basta ver o que o vaticano anda fazendo hoje em dia. Não está preocupado com os ateus, que dilapidam a fé de seus fieis; nem com os evangélicos, que esvaziam suas igrejas.
Estão preocupados com a Teologia da Libertação, que se espalhou pela América Latina, que ajuda a Índios e camponeses a reconquistarem seus territórios, que parte em defesa dos mais pobres indo contra os tentáculos dos poderosos opressores; mas que não seguem à risca a doutrina da fé (leia-se inquisição), confiável aos poderosos.
Dizem que promovem o paraíso na Terra, dizem que seguem uma doutrina marxista (considerada demoníaca), isso porque lhes dilapida o poder, ao menos é o que pensam.
Oras, quem leu Marx sabe que este se preocupava menos com a fé do que com a instituição igreja, tentáculo do poder manipulador de massas. Marx entendia que não ter ideologia era seguir a ideologia do patrão, não ter senso crítico é aceitar tudo que se fala como senso comum, e permanecer na ignorância é ser marionete do poder. Tudo o que o clero precisa.
E não é isso o que a TL prega. Mas ainda assim é perseguida, para a sorte de outros "inimigos" da igreja, como cientistas, filósofos materialistas, humanistas seculares, and so on, que tristemente não conseguem respostas a suas argumentações de uma instituição de dois séculos de existência.
http://logosantropolatria.blogspot.com.br/
do colonialismo para seus próprios
interesses, para servir a uma força
externa..Quem é bom entendedor que entenda.
Ruggero
ihihihihihih.
Pelo visto, funcionou. Totalmente efetivo.
Muito bom texto o do Orsi!! Perfeito!
Só lembrando que aqui nesse site mesmo, já foi mostrado uma pesquisa que mostra que ateus não são afetados pela neurose sexual imposta pela religião. Crentes se sentem culpados depois do sexo, ateus não.
Pqdrocha.
A questão da tradição cultural de um povo não deve ser abstraída ou excluída. Selos contêm imagens e citações, notas são objetos de troca - por que não poderiam contê-las?
Deus não é um ente de uma única religião! O argumento do MPF é falso ao dizer que o uso dessa palavra privilegia uma religião.
E a citação positivista na bandeira? Também tem que retirar porque o positivismo está superado? kkkkk
Extraí este trecho do texto, porque ele reflete bem o sentimento que domina as massas religiosas, uma vez que as religiões já perderam suas bases há muito tempo atrás, quando, se não estou enganado Auguste Comte, esclareceu que a crença em mitos pode ser considerada a infancia da humanidade, conforme esta amadureceu, foi compreendendo certos fenomenos, os mitos e os deuses passaram a ser desnecessários ao preenchimento das lacunas que a ignorância não era capaz de explicar.
A mim pouco importa se a frase seja retirada ou não, mas a discussão é importante e boto lenha na fogueira, porque é preciso que se faça um debate maior sobre as influências das religiões no estado, também é importante ressaltar que o estado ao utilizar esta frase no dinheiro ou no preâmbulo das leis, nada mais faz do que esconder a sua verve dominadora, por trás de uma falaciosa humildade cristã, ou de qualquer outra religião.
Se não cuidarmos, toda a legislação será teocrática, com base nos 10 mandamentos, logo sem sustentabilidade nenhuma, a não ser por força de mílicias religiosas... que deus nos livre disso (é uma piada).
Quanto a tirar expressões e símbolos religiosas de selos, ou mesmo mudar o nome de certos estados, isso é um fomento argumentativo dos defensores da frase infame, utilizada para esfervecer a loucura dos súditos fiéis. Fosse assim, também deveríamos propor a troca dos nomes de todas as pessoas que tem origem em livros sagrados.
(...)
Deus seja Louvado*
(...)
(...)
[no pé da nota]:
*contanto que você não seja ateu, politeísta, satanista...
Mesma coisa para a bandeira do Brasil:
(...)
Ordem e Progresso*
(...)
[rodapé]:
*Se possível
---------------------------------------------
Desnecessário, pra não dizer desesperado, foi o texto do 'dotô Ives' e laicismo necessário e muito oportuno, inoportuno é continuarmos alimentando e realimentando mitos.
Batman responde: "Se não respeitam as pequenas leis, como vão respeitar as grandes?"
Diego
12 de outubro é o dia das crianças.
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