por Carlos Orsini
CNPq, que alega não ter dinheiro nem para pagar mirradas bolsas a estudantes de iniciação científica, encontrou R$ 400 mil para investir em pesquisa sobre homeopatia.
Se fosse pesquisa sobre a eficácia da homeopatia poderia ser algo de interesse científico, ainda que meio redundante (a revista Lancet, por exemplo, deu a questão como fechada 11 anos atrás), algo intelectualmente estimulante como uma nova prova de que a Terra gira em torno do Sol ou uma nova demonstração do Teorema de Pitágoras. Mas não é disso que se trata.
De fato, o edital promete dinheiro para o trabalho de caracterização de matérias-primas e preparados homeopáticos. A caracterização dos insumos tem alguma semelhança com pesquisa científica de verdade, mas as "formas homeopáticas derivadas" citadas do edital são, suponho, vidrinhos contendo água, que esteve em contato com água, que esteve em contato com água, que esteve em contato com uma molécula de alguma coisa uma centena de iterações atrás. É a análise da potência medicinal da pura água destilada.
O edital inteiro — com suas exigências de testes estatísticos, validações múltiplas, condições analíticas, cálculos — é um exemplo magistral de "cargo cult science" ou de "tooth fairy science": aquele momento em que a forma e as ferramentas da ciência (jalecos, equipamentos, planilhas, títulos acadêmicos) tornam-se mais importante que a substância do empreendimento científico, que é a busca da verdade sobre a natureza.
Seria fascinante, de um ponto de vista antropológico, se não fosse com o dinheiro público que, segundo se diz por aí, anda tão escasso.
Esse texto foi publicado originalmente no site de Carlos Orsini, que é autor d' O Livro da Astrologia, As Dez Torres de Sangue - Kindle Edition , entre outros livros. O título acima é do site Paulopes.
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