'Nós [evangélicos] temos de mudar este país" |
O bispo Marcelo Crivella (PRB) se declara formalmente “licenciado” da Igreja Universal do Reino de Deus, mas usa o cargo de prefeito do Rio de maneira clientelista, para ampliar a participação de evangélicos na política.
Este projeto não chega a ser desconhecido, mas poucas vezes se teve uma prova tão evidente do uso ilegal de cargo público para beneficiar alguma religião, como a testemunhada pelo GLOBO, na quarta-feira, no Palácio da Cidade, no evento “Café da Comunhão”, em que o preceito constitucional da separação entre Estado e Igreja, uma conquista do Iluminismo, no Século XVIII, foi solenemente descumprido.
No encontro, estavam 250 pastores, entre eles Rubens Teixeira, do PRB de Crivella, pré-candidato a deputado federal. Teixeira passou pela Transpetro, subsidiária da Petrobras, entre 2008 e 2015, e foi atingido pelas investigações da Lava-Jato sobre a gestão do presidente da empresa, Sérgio Machado, que gravou conversas nada republicanas com Renan Calheiros, Sarney, Romero Jucá e outros.
Teixeira, pastor da Assembleia de Deus em Madureira, é denunciado pelo Ministério Público por peculato e dispensa ilegal de licitações. Secretário de Conservação e Meio Ambiente de Crivella, foi presidir a Comlurb, mas terminou afastado por liminar, porque disputou assento na Câmara de Vereadores, em 2016. Quem atuou em campanha eleitoral não pode ser nomeado para cargo na administração em empresas públicas, durante os três anos.
Mas Crivella está mesmo disposto a usar a máquina da prefeitura para ajudar “irmãos” na campanha. Deu dicas: para cirurgias de cataratas, procurem “Márcia”, a fim de agendar sem as dificuldades que encontram os cariocas comuns, que pagam impostos para sustentar o governo do “bispo licenciado”; varizes, o caminho também Márcia, há 15 anos com Crivella, segundo o próprio, e que conhece diretores dos hospitais municipais. Ou “Marquinhos”.
Para outro problema que aflige pastores, a isenção de IPTU de imóveis que abrigam suas igrejas, procurar “doutor Milton”. Não importa que a prefeitura esteja em crise e precise arrecadar, principalmente no mais importante imposto do município.
Crivella foi objetivo: “nós (evangélicos) temos que mudar esse país (...). É esse Brasil evangélico que vai dar jeito na pátria”. Nada impede Crivella ou quem seja de fazer esta pregação ou outras. O direito constitucional à livre expressão o garante. Mas não pode usar a prefeitura ou qualquer segmento do Estado com este objetivo.
O Brasil viveu a experiência do aparelhamento lulopetista, na administração direta e em estatais. Resultou em processos criminais, prisões e repúdio. O Rio de Janeiro é a ponta mais visível de um outro projeto de poder. Os dois são inaceitáveis.
Esse texto foi publicado originalmente com o título "Crivella usa prefeitura em projeto de poder".
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