Prefeito evangélico não gostou deste desenho que faz parte de uma HQ para adultos |
Funcionários da Secretaria de Ordem Pública da Prefeitura do Rio de Janeiro realizaram nesta sexta-feira (6 de setembro de 2019) uma fiscalização na Bienal do Livro da capital.
Na quinta-feira, Crivella disse em um vídeo publicado em redes sociais que havia determinado o "recolhimento" da história em quadrinhos, que, segundo ele, trazia "conteúdo sexual para menores".
Na visão do prefeito, esse tipo de material precisava "estar embalado em plástico preto e lacrado" e com um aviso sobre o conteúdo. "A prefeitura está protegendo os menores da nossa cidade", afirmou.
No entanto, o suposto conteúdo sexual denunciado por Crivella — que é bispo da neopentecostal Igreja Universal do Reino de Deus — não passava de uma imagem isolada com dois homens se beijando, completamente vestidos, em meio a dezenas de páginas da história.
A organização da Bienal do Rio disse que recebeu ainda na quinta-feira uma notificação da prefeitura para que os exemplares da HQ fossem lacrados e viessem com uma classificação indicativa e um alerta sobre conteúdo impróprio. O documento não citava o recolhimento mencionado pelo prefeito.
Os organizadores do evento responderam que não pretendiam recolher ou embalar os exemplares, argumentando que o conteúdo não é impróprio e nem mesmo pornográfico.
Horas depois, os fiscais da prefeitura apareceram. Segundo o G1, o subsecretário de operações da prefeitura do Rio, coronel Wolney Dias, disse que pretendia "apreender material" que não seguisse as "recomendações de estar lacrado e com a orientação quanto ao conteúdo".
No entanto, segundo a organização, já não havia mais exemplares da HQ que pudessem correr o risco de apreensão, já que todo o material foi vendido nos primeiros minutos após a abertura da Bienal nesta sexta-feira, diante da repercussão da censura promovida pelo prefeito.
Os fiscais visitaram alguns estandes, folhearam alguns títulos, mas deixaram o local cerca de duas horas depois, sem apreender qualquer material. Questionado se havia encontrado algo, Dias respondeu: "Muitos livros."
Nas redes sociais, vários usuários denunciaram o caso como censura e acusaram o prefeito de homofobia. Duas das maiores editoras do país também repudiaram a atitude da prefeitura.
O editor Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras, disse que Crivella tenta "colocar a sociedade brasileira em tempos medievais, quando as pessoas não tinham a liberdade de expressar suas identidades".
Ele ainda afirmou que a ação contra a Bienal, somada à decisão recente do governo federal de suspender um edital para a produção de filmes com temática LGBT, "indica uma perigosa ascensão do clima de censura no país — flagrantemente inconstitucional — e que traz a marca de um indesejável sentimento de intolerância discriminatória".
O Grupo Editorial Record disse, em nota, que repudia "qualquer tipo de censura e reitera a importância da representatividade na literatura jovem como forma de combate ao preconceito". Também afirmou que cabe ao Estado "incentivar a leitura e não criar barreiras que marginalizem uma parcela da população que já sofre com a intolerância".
Já o escritor e crítico literário Sérgio Rodrigues disse no Twitter que a ação dos fiscais e da prefeitura do Rio é "inaceitável". "Impróprio é Crivella ser prefeito. Pornográfica é a censura. O Brasil é melhor do que isso."
O escritor Paulo Coelho chamou os fiscais de "neotalibãs" que estavam ali para confiscar livros "pecaminosos". Ele também provocou o prefeito afirmando que sua obra "Onze minutos", que aborda prostituição e sadomasoquismo, estava sendo vendida na feira "sem estar lacrada". "Vai lá, Crivella", disse o escritor.
Pessoal, precisamos proteger as nossas crianças. Por isso, determinamos que os organizadores da Bienal recolhessem os livros com conteúdos impróprios para menores. Não é correto que elas tenham acesso precoce a assuntos que não estão de acordo com suas idades. pic.twitter.com/sFw82bqmOx
— Marcelo Crivella (@MCrivella) September 5, 2019
Luiz Schwarcz, CEO e fundador da Companhia das Letras, afirma: “Ficamos orgulhosos com a posição da organização da Bienal do Rio em defesa da liberdade de expressão e da diversidade. Ela mostra com dignidade a vocação e vontade dos editores. Posturas como a do prefeito (+)
— Companhia das Letras (@cialetras) September 6, 2019
"Era uma vez uma prostituta chamada Maria." (11 Minutos). Sexo, Sadomasoquismo, e outros horrores.
— Paulo Coelho (@paulocoelho) September 6, 2019
No stand da @cialetras e sem estar lacrado.
Vai lá, Crivella! https://t.co/xfXTV44KJL
Fiscais vão à Bienal do Livro no Rio após críticas de Crivella a beijo gay em quadrinhos
— UOL Notícias (@UOLNoticias) September 6, 2019
🎥 @fernandapsol pic.twitter.com/AlRktQu2mY
A Deutsche Welle é a emissora da Alemanha que produz jornalismo em 30 idiomas.
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