Estado laico é filho do republicanismo, que foi cencebido para garantir a igualdade entre todas as pessoas |
por Francisco Porfírio
para Brasil Escola
O Estado laico surgiu com republicanismo a fim de garantir que houvesse igualdade entre todos os cidadãos. Após diversas guerras e conflitos por conta de religião, as pessoas começaram a enxergar a necessidade de separar as decisões estatais da Igreja, pois ela não poderia servir como base para justificar as ações do governo.
A junção entre Estado e Igreja foi abandonada com o modo de governar do Antigo Regime pela maioria dos países porque os monarcas absolutos de antes necessitavam da suposta bênção divina para justificar as suas ações.
O republicanismo e a dissolução do poder estatal no Parlamento retiraram o peso das ações governamentais da religião e colocaram-no inteiramente no povo, na competência dos agentes públicos e no âmbito do Estado.
Afinal, o que é o Estado laico?
Estado laico ou, no âmbito religioso, Estado secular é aquele que não adota religião oficial, não interfere nos assuntos religiosos — a menos que esses estejam relacionados diretamente com questões jurídicas — e não se deixa ser influenciado por nenhum viés unilateral religioso, ou seja, é independente de qualquer religião.
A palavra secular também é utilizada para designar algo que é laico. Secular vem do latim saeculare, que significa mundano, ou seja, o que é do mundo físico e “não pertencente a Deus".
Em um Estado laico, não é vedada a prática religiosa, muito pelo contrário, as pessoas são protegidas pela Constituição para manifestarem livremente suas crenças e cultos, desde que observado o princípio de que a religião pertence à vida privada e não pode servir de parâmetro para um agente público em exercício do dever.
Em um Estado laico, não se admite qualquer ação governamental ou estatal justificada por meio de assuntos religiosos. Muito menos se admite que assuntos religiosos assumam o caráter de lei para a garantia da hegemonia de apenas um grupo religioso.
No âmbito de um Estado laico, entende-se que toda e qualquer visão religiosa de mundo deve ser respeitada e que a liberdade de culto e de crença deve ser garantida.
Para que isso seja possível, há uma Constituição e leis que garantem o culto e respeitam todas as religiões. Do mesmo modo, aqueles que se abstêm de escolher uma crença religiosa, preferindo definirem-se enquanto ateus ou agnósticos, devem ser respeitados.
Dado o fato de que o Estado deve respeitar todas as religiões, ele não pode favorecer uma em detrimento de outra. Desse modo, é vedado ao governo ou aos agentes públicos de um Estado laico deixarem que a sua fé influencie as suas decisões enquanto pessoas públicas.
Entende-se que a religião é algo pessoal, que o favorecimento de algumas vertentes em detrimento de outras pode ocasionar conflitos civis e religiosos e que o Estado, enquanto organismo que deve garantir a igualdade, não pode tomar parte em tais conflitos a menos que em defesa da pluralidade e da igualdade.
para Brasil Escola
O Estado laico surgiu com republicanismo a fim de garantir que houvesse igualdade entre todos os cidadãos. Após diversas guerras e conflitos por conta de religião, as pessoas começaram a enxergar a necessidade de separar as decisões estatais da Igreja, pois ela não poderia servir como base para justificar as ações do governo.
A junção entre Estado e Igreja foi abandonada com o modo de governar do Antigo Regime pela maioria dos países porque os monarcas absolutos de antes necessitavam da suposta bênção divina para justificar as suas ações.
O republicanismo e a dissolução do poder estatal no Parlamento retiraram o peso das ações governamentais da religião e colocaram-no inteiramente no povo, na competência dos agentes públicos e no âmbito do Estado.
Afinal, o que é o Estado laico?
Estado laico ou, no âmbito religioso, Estado secular é aquele que não adota religião oficial, não interfere nos assuntos religiosos — a menos que esses estejam relacionados diretamente com questões jurídicas — e não se deixa ser influenciado por nenhum viés unilateral religioso, ou seja, é independente de qualquer religião.
A palavra secular também é utilizada para designar algo que é laico. Secular vem do latim saeculare, que significa mundano, ou seja, o que é do mundo físico e “não pertencente a Deus".
Em um Estado laico, não é vedada a prática religiosa, muito pelo contrário, as pessoas são protegidas pela Constituição para manifestarem livremente suas crenças e cultos, desde que observado o princípio de que a religião pertence à vida privada e não pode servir de parâmetro para um agente público em exercício do dever.
Em um Estado laico, não se admite qualquer ação governamental ou estatal justificada por meio de assuntos religiosos. Muito menos se admite que assuntos religiosos assumam o caráter de lei para a garantia da hegemonia de apenas um grupo religioso.
No âmbito de um Estado laico, entende-se que toda e qualquer visão religiosa de mundo deve ser respeitada e que a liberdade de culto e de crença deve ser garantida.
Para que isso seja possível, há uma Constituição e leis que garantem o culto e respeitam todas as religiões. Do mesmo modo, aqueles que se abstêm de escolher uma crença religiosa, preferindo definirem-se enquanto ateus ou agnósticos, devem ser respeitados.
Dado o fato de que o Estado deve respeitar todas as religiões, ele não pode favorecer uma em detrimento de outra. Desse modo, é vedado ao governo ou aos agentes públicos de um Estado laico deixarem que a sua fé influencie as suas decisões enquanto pessoas públicas.
Entende-se que a religião é algo pessoal, que o favorecimento de algumas vertentes em detrimento de outras pode ocasionar conflitos civis e religiosos e que o Estado, enquanto organismo que deve garantir a igualdade, não pode tomar parte em tais conflitos a menos que em defesa da pluralidade e da igualdade.
A seguir, comentaremos os tipos de Estados e suas relações com a religião, também discutiremos essa relação em países específicos, como a Alemanha e a Índia.
Estado confessional
Estado confessional é aquele que adota uma religião oficial. Essa religião adotada não terá poder irrestrito e absoluto e pode não estar tão fortemente ligada às decisões governamentais e às políticas de Estado. No entanto, o simples fato da adoção de uma religião oficial pode excluir a importância das outras.
Estado teocrático
Teocracias ou estados teocráticos são aqueles em que há uma religião oficial adotada e os sistemas Legislativo e Judiciário estão sob tutela dessa religião. As atuais teocracias são os países subjugados às leis islâmicas (como o Irã) e o Vaticano, sob domínio da Igreja Católica.
Estado ateu
Um Estado ateu é aquele que combate à religião em seu interior por não enxergar nas práticas religiosas algo que reforce a ideologia e a postura de tal Estado.
Exemplos de Estados ateístas são os países socialistas do século XX, como a União Soviética, a China e a Coreia do Norte. Todos os países mencionados garantem, hoje, a liberdade religiosa, e a Rússia (integrante da extinta União Soviética) é, atualmente, um país laico.
Relação entre Igreja e Estado na Alemanha
A Alemanha nunca foi, de fato, totalmente laica, na contramão das outras repúblicas e de Estados nacionais ocidentais modernos.
Relação entre Igreja e Estado na Alemanha
A Alemanha nunca foi, de fato, totalmente laica, na contramão das outras repúblicas e de Estados nacionais ocidentais modernos.
Otto von Bismarck, o chanceler que realizou o processo de unificação da Alemanha no século XIX, tomou uma série de medidas que visava a separar os domínios estatais das igrejas, mas essas foram anuladas, em 1919, pela República de Weimar.
A República de Weimar foi o período republicano que a Alemanha viveu entre 1919 e 1933, regida por um sistema republicano democrático e constitucional.
A República de Weimar foi o período republicano que a Alemanha viveu entre 1919 e 1933, regida por um sistema republicano democrático e constitucional.
No entendimento da equipe de juristas, cientistas políticos e economistas que participaram da Assembleia Constituinte (entre eles, estava o sociólogo Max Weber), a reaproximação entre Estado e Igreja era justificável por conta da histórica participação do protestantismo nos governos alemães.
A ascensão do governo nazista na Alemanha, que colocou fim à República de Weimar em 1933, reaproximou ainda mais os domínios religiosos (cristãos) do Estado.
A ascensão do governo nazista na Alemanha, que colocou fim à República de Weimar em 1933, reaproximou ainda mais os domínios religiosos (cristãos) do Estado.
Um dos elementos pelos quais Hitler justificou os planos de perseguição aos judeus e o estabelecimento do que ele chamou de raça pura foi a religião cristã.
Segundo o líder nazista, somente a raça ariana (branca e oriunda dos povos germânicos), que fosse igualmente cristã, teria o direito a habitar e prosperar no território alemão. A intenção de Hitler era levar a cabo o seu projeto de expansão da Alemanha e intensificação de seu governo tirânico.
Durante a Guerra Fria (conflito político-ideológico iniciado após a derrota do nazismo e o fim da Segunda Guerra Mundial), sobretudo após a construção do Muro de Berlim (que separou Berlim Oriental de Berlim Ocidental), houve uma disputa ideológica entre religiosos e políticos muito forte. Berlim Oriental, de governo marxista, não admitia a participação religiosa dentro do governo e desestimulava a religião entre a população, assim como fez a União Soviética. A Berlim Ocidental, de orientação política liberal e capitalista, mantinha um sistema de aproximação do governo com lideranças cristãs católicas e protestantes.
Atualmente, a Alemanha é um país oficialmente laico, apesar de apresentar uma espécie de flerte com a religião cristã nas políticas educacionais, por exemplo. O ensino religioso de tradição cristã é obrigatório nas escolas alemãs e, geralmente, é ministrado por professores com formação para atuarem no ensino religioso, geralmente oriundos da vertente católica ou protestante do cristianismo. Na Baviera, como em outros Estados alemães, a fixação de crucifixo na sala de aula é obrigatória por lei.
Relação entre Igreja e Estado na Índia
O caso indiano é bastante complicado, pois o antigo Estado hindu (denominação para o modo de governar indiano predominante no país até o século XIX) deixou como sequela o sistema de castas, extremamente excludente. Também eram comuns, como resultado do antigo sistema político-religioso, os casamentos infantis.
Durante a Guerra Fria (conflito político-ideológico iniciado após a derrota do nazismo e o fim da Segunda Guerra Mundial), sobretudo após a construção do Muro de Berlim (que separou Berlim Oriental de Berlim Ocidental), houve uma disputa ideológica entre religiosos e políticos muito forte. Berlim Oriental, de governo marxista, não admitia a participação religiosa dentro do governo e desestimulava a religião entre a população, assim como fez a União Soviética. A Berlim Ocidental, de orientação política liberal e capitalista, mantinha um sistema de aproximação do governo com lideranças cristãs católicas e protestantes.
Atualmente, a Alemanha é um país oficialmente laico, apesar de apresentar uma espécie de flerte com a religião cristã nas políticas educacionais, por exemplo. O ensino religioso de tradição cristã é obrigatório nas escolas alemãs e, geralmente, é ministrado por professores com formação para atuarem no ensino religioso, geralmente oriundos da vertente católica ou protestante do cristianismo. Na Baviera, como em outros Estados alemães, a fixação de crucifixo na sala de aula é obrigatória por lei.
Relação entre Igreja e Estado na Índia
O caso indiano é bastante complicado, pois o antigo Estado hindu (denominação para o modo de governar indiano predominante no país até o século XIX) deixou como sequela o sistema de castas, extremamente excludente. Também eram comuns, como resultado do antigo sistema político-religioso, os casamentos infantis.
Hoje, a Índia é um país laico, porém com sequelas do Estado teocrático que permanecem na cultura do povo indiano.
Educação laica e educação confessional
A ideia de uma educação laica advém do iluminismo francês. Os teóricos iluministas acreditavam que o avanço político poderia ser alcançado com o avanço científico e que, quanto mais amplificado fosse o alcance do conhecimento na sociedade, melhor. Daí surgiu a necessidade de se pensar em uma educação pública, gratuita, universal e laica.
Durante a Idade Média até a Modernidade, as instituições de ensino eram somente confessionais, ou seja, adotavam concepções religiosas por serem mantidas por ordens religiosas e igrejas.
Qual é a importância do Estado laico?
A história da humanidade presenciou diversas formas de conflitos religiosos e políticos causados ou sustentados pela religião. Na Antiguidade, por exemplo, Sócrates foi executado após ser julgado por denúncias de, entre outras coisas, professar a fé em outros deuses que não os gregos.
A condenação do filósofo, considerada mais tarde uma injustiça por Platão e Aristóteles, deu-se por conta da contrariedade causada por Sócrates em políticos poderosos de Atenas.
Até hoje não existe qualquer indício de que Sócrates realmente tenha professado a fé em outros deuses. No entanto, o que está em jogo não é a culpa ou não do pensador, e sim a postura do júri e da Assembleia de Atenas ao julgar um homem por sua suposta crença religiosa contrária.
Ao vermos a utilização da religião como arma para condenar um ser humano por causa de atritos políticos, fica evidente a importância de preservar-se o direito de todos de professarem e cultuarem os seus deuses.
Até hoje não existe qualquer indício de que Sócrates realmente tenha professado a fé em outros deuses. No entanto, o que está em jogo não é a culpa ou não do pensador, e sim a postura do júri e da Assembleia de Atenas ao julgar um homem por sua suposta crença religiosa contrária.
Ao vermos a utilização da religião como arma para condenar um ser humano por causa de atritos políticos, fica evidente a importância de preservar-se o direito de todos de professarem e cultuarem os seus deuses.
Em outro momento da história, a humanidade presenciou as Cruzadas, que consistiu em um conflito político com interesses políticos e territoriais que se fez passar por uma guerra santa (guerra motivada por questões religiosas).
Outro momento que chocou a humanidade foi o holocausto, provocado pelo governo nazista na Alemanha.
Outro momento que chocou a humanidade foi o holocausto, provocado pelo governo nazista na Alemanha.
O genocídio perpetrado pelos nazistas tinha, em sua superfície, uma justificativa religiosa (a crença antissemita de que os judeus eram responsáveis pela ruína alemã). No entanto, a intenção nazista era colocar no inimigo político (aparentemente pela religião) a culpa pelas mazelas sociais para unir a população em torno de uma ideologia e, consequentemente, em apoio ao líder (no caso, Adolf Hitler)
A importância do Estado laico centra-se no fato de que a liberdade religiosa é um direito humano fundamental, o qual que deve ser garantido.
A importância do Estado laico centra-se no fato de que a liberdade religiosa é um direito humano fundamental, o qual que deve ser garantido.
Somente um Estado laico pode resguardar o respeito e a igualdade entre toda e qualquer religião, sem privilegiar algumas ou depreciar outras. Deve-se lembrar que o ato de não professar fé em Deus (ateísmo) e o de não optar por religiões ou se abster de decidir acerca de uma religião (agnosticismo) também devem ser respeitados.
Quando surgiu o Estado laico no Brasil?
Em 7 de janeiro de 1890, foi promulgado o decreto 119-A, que tornava o Brasil (já republicano desde o golpe de 1889) um país laico. No ano seguinte, foi promulgada a Constituição Federal de 1891, a primeira da República. Esse documento também garantia a liberdade religiosa e retirava do governo e do Estado a adoção de uma posição religiosa oficial.
O decreto 119-A trouxe uma série de mudanças para a vida civil e para a organização governamental brasileira. Nessa ocasião, foi criado o casamento civil, tornando o casamento religioso opcional e a união civil a forma reconhecida pelo governo. Os cemitérios, antes administrados por igrejas, passaram a ser geridos pelo poder público.
A opção pelo Estado laico faz parte do pensamento republicano e do positivismo, ideais que moveram as ações dos militares responsáveis pela Proclamação da República e pelo governo provisório do Marechal Deodoro da Fonseca.
Martinho Lutero e o Estado laico
A Reforma Protestante, iniciada por Lutero, ocasionou o início de uma revisão da relação entre Estado e Igreja. Muitas das críticas do reformador contidas em suas 95 teses não eram apenas erros da Igreja Católica, mas erros da Igreja Católica cometidos sob a permissão estatal ou em conluio com governantes.
Lutero entendia que os dois domínios, da religião cristã e do Estado (que ele chamou domínio da Espada), eram criações divinas, porém distintas. O domínio da religião cristã era o primeiro e mais natural.
Lutero acreditava que, se todos fossem verdadeiramente cristãos, haveria ordem e respeito, não sendo necessário o domínio da espada.
Como eram poucos os cristãos verdadeiros, isto é, que seguiam os ensinamentos de Cristo, foi necessário, segundo Lutero, que Deus criasse o domínio da espada para manter o funcionamento de tudo em sua perfeita ordem.
Francisco Porfírio é professor de sociologia. O texto foi publicado originalmente com o título "Estado laico". Texto está ilustado por uma litografia de Alfredo Roque Gameiro, do início da década de 1900.
Como eram poucos os cristãos verdadeiros, isto é, que seguiam os ensinamentos de Cristo, foi necessário, segundo Lutero, que Deus criasse o domínio da espada para manter o funcionamento de tudo em sua perfeita ordem.
Francisco Porfírio é professor de sociologia. O texto foi publicado originalmente com o título "Estado laico". Texto está ilustado por uma litografia de Alfredo Roque Gameiro, do início da década de 1900.
Estado laico brasileiro foi criado em 1890, mas ele ainda é frágil
Religiosos não entendem que Estado laico beneficia a todos
Ensino confessional enfraquece Estado laico, afirma Karnal
Governo de Estado laico tem de se afastar de toda e qualquer religião, escreve Lafer
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Art 19 da Lei 8112/90. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 8.270, de 17.12.91)
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