Revista reproduz concepção artística anatômica de uma jovem de 70 mil anos atrás |
por Teresa Sofia Serafim
para o jornal português Público
Há cerca de 70 mil anos uma jovem denisovana vivia numa gruta do Sul da Sibéria. Pensa-se que se adaptava bem às elevadas altitudes e ao frio. Mas como seria esse membro de uma espécie de humanos já extinta?
para o jornal português Público
Há cerca de 70 mil anos uma jovem denisovana vivia numa gruta do Sul da Sibéria. Pensa-se que se adaptava bem às elevadas altitudes e ao frio. Mas como seria esse membro de uma espécie de humanos já extinta?
A revista científica Cell divulgou em 19 de setembro de 2019 a primeira reconstituição anatômica do esqueleto desta jovem. Para podermos perceber melhor como seriam esses humanos, a equipe — que inclui cientistas de Israel e de Espanha — também os retratou.
Desaparecidos há cerca de 30 mil anos, os denisovanos viveram no Norte, Leste e Sudeste da Ásia.
Desaparecidos há cerca de 30 mil anos, os denisovanos viveram no Norte, Leste e Sudeste da Ásia.
“Não se sabe bem qual era o seu ambiente, mas alguns humanos modernos [a nossa espécie] receberam deles fragmentos de ADN que hoje os ajudam a adaptar-se a altitudes elevadas — no caso dos tibetanos — e ao frio — nomeadamente os inuítes”, realça ao PÚBLICO Liran Carmel, geneticista da Universidade Hebraica de Jerusalém e coordenador do trabalho.
“Portanto, podemos supor que os denisovanos estavam adaptados a viver nessas circunstâncias.”
Sabia-se muito pouco sobre a anatomia dos denisovanos. Até agora, tudo o que tínhamos deles eram dentes, uma falange e uma mandíbula. Os dentes e a falange foram descobertos na gruta de Denisova — que dá o nome a estes humanos —, nos montes Altai, na Sibéria.
Sabia-se muito pouco sobre a anatomia dos denisovanos. Até agora, tudo o que tínhamos deles eram dentes, uma falange e uma mandíbula. Os dentes e a falange foram descobertos na gruta de Denisova — que dá o nome a estes humanos —, nos montes Altai, na Sibéria.
Em 2010, as análises ao ADN desses ossos reconheceram oficialmente os denisovanos como uma espécie humana. Já em Maio deste ano foi anunciada a descoberta da parte direita da mandíbula na gruta Baishiya Karst. Esta foi a primeira vez que se encontrou um fóssil de um denisovano fora da Sibéria.
Para se reconstituir a anatomia dos denisovanos, a equipe usou um processo de regulação epigenética chamado “metilação”, em que alterações químicas influenciam a atividade dos genes. Desta forma, comparou-se os padrões da metilação do ADN de denisovanos, neandertais (outros humanos já extintos) e humanos modernos e extraiu-se informação anatômica a partir dos padrões de atividade dos genes desses três grupos.
“Ao fazermos isto, conseguimos prever como é que as distintas partes do esqueleto são afetadas pela diferente regulação de cada gene — por exemplo, se um fêmur é maior ou mais pequeno”, esclarece David Gokhman, também da Universidade Hebraica de Jerusalém e autor do artigo, num comunicado sobre o trabalho.
Antes de avançar com o resultado final, — como forma de testar este método —, a equipe também o aplicou a neandertais e chimpanzés, que têm uma anatomia já conhecida.
Para se reconstituir a anatomia dos denisovanos, a equipe usou um processo de regulação epigenética chamado “metilação”, em que alterações químicas influenciam a atividade dos genes. Desta forma, comparou-se os padrões da metilação do ADN de denisovanos, neandertais (outros humanos já extintos) e humanos modernos e extraiu-se informação anatômica a partir dos padrões de atividade dos genes desses três grupos.
“Ao fazermos isto, conseguimos prever como é que as distintas partes do esqueleto são afetadas pela diferente regulação de cada gene — por exemplo, se um fêmur é maior ou mais pequeno”, esclarece David Gokhman, também da Universidade Hebraica de Jerusalém e autor do artigo, num comunicado sobre o trabalho.
Antes de avançar com o resultado final, — como forma de testar este método —, a equipe também o aplicou a neandertais e chimpanzés, que têm uma anatomia já conhecida.
Resultado: esta reconstituição teve uma precisão de cerca de 85%. A equipe sentiu-se então preparada para fazer a primeira reconstituição anatómica dos denisovanos.
Retratou-se assim uma jovem denisovana que viveu há cerca de 70 mil anos na gruta de Denisova. “Esta é a primeira reconstituição da anatomia do esqueleto dos denisovanos”, frisa Liran Carmel. “Em muitas coisas os denisovanos parecem neandertais, em alguns traços também se parecem conosco, mas em muitas outras características são únicos.”
Ao todo, encontraram-se 56 características anatómicas em que os denisovanos diferem dos humanos modernos ou dos neandertais e 34 delas são no crânio. Por exemplo, o crânio dos denisovanos deveria ser mais largo do que o dos neandertais e dos humanos modernos. Também teriam uma arcada dentária mais longa, como se confirmou com a mandíbula descoberta no Tibete.
“Em geral, os traços dos denisovanos assemelham-se mais aos dos neandertais do que aos nossos, o que já era esperado com base na sua filogenia [pois é uma espécie ‘irmã’ dos neandertais]”, refere Liran Carmel. Tal como os neandertais, teriam caras alongadas e pélvis largas.
Mesmo assim, este método não fornece medidas corporais exatas: “Podemos dizer [que os denisovanos tinham] dedos maiores [do que os dos humanos modernos], mas não podemos dizer que eram dois milímetros maiores”, esclarece Liran Carmel à revista Science.
No comunicado, a equipe assinala que este método pode agora ser usado para se reconstituírem características anatómicas desconhecidas de outros humanos. Também nos poderá vir a dar mais informações sobre a evolução dos hominíneos.
Retratou-se assim uma jovem denisovana que viveu há cerca de 70 mil anos na gruta de Denisova. “Esta é a primeira reconstituição da anatomia do esqueleto dos denisovanos”, frisa Liran Carmel. “Em muitas coisas os denisovanos parecem neandertais, em alguns traços também se parecem conosco, mas em muitas outras características são únicos.”
Ao todo, encontraram-se 56 características anatómicas em que os denisovanos diferem dos humanos modernos ou dos neandertais e 34 delas são no crânio. Por exemplo, o crânio dos denisovanos deveria ser mais largo do que o dos neandertais e dos humanos modernos. Também teriam uma arcada dentária mais longa, como se confirmou com a mandíbula descoberta no Tibete.
“Em geral, os traços dos denisovanos assemelham-se mais aos dos neandertais do que aos nossos, o que já era esperado com base na sua filogenia [pois é uma espécie ‘irmã’ dos neandertais]”, refere Liran Carmel. Tal como os neandertais, teriam caras alongadas e pélvis largas.
Mesmo assim, este método não fornece medidas corporais exatas: “Podemos dizer [que os denisovanos tinham] dedos maiores [do que os dos humanos modernos], mas não podemos dizer que eram dois milímetros maiores”, esclarece Liran Carmel à revista Science.
No comunicado, a equipe assinala que este método pode agora ser usado para se reconstituírem características anatómicas desconhecidas de outros humanos. Também nos poderá vir a dar mais informações sobre a evolução dos hominíneos.
“Pode ensinar-nos como é que grupos de humanos se adaptaram durante a evolução, quais os genes que definiram a sua morfologia e como é que as misturas genéticas afetaram os humanos modernos — isto porque hoje em dia o ADN dos denisovanos está em pessoas do Pacífico, da Austrália e do Leste da Ásia”, enumera Liran Carmel.
“Definitivamente, há muito mais a ser descoberto sobre como os denisovanos moldaram os humanos modernos.”
Apesar de ter achado esta reconstituição “inteligente”, Ludovic Orlando — arqueólogo da Universidade de Copenhaga (Dinamarca) e que não fez parte do estudo — avisa que é preciso ter cautela com as generalizações baseadas na reconstituição de um único indivíduo, assinalou à Science.
Apesar de ter achado esta reconstituição “inteligente”, Ludovic Orlando — arqueólogo da Universidade de Copenhaga (Dinamarca) e que não fez parte do estudo — avisa que é preciso ter cautela com as generalizações baseadas na reconstituição de um único indivíduo, assinalou à Science.
Por isso, Gabriel Renaud — também da Universidade de Copenhaga e que não fez parte do estudo — refere que os autores do estudo devem divulgar os métodos computacionais utilizados para que outros cientistas possam reproduzir a reconstituição dos denisovanos. A descoberta de novos fósseis poderá confirmar (ou não) os resultados.
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