RELIGIÓN DIGITAL | Jesús Bastante Ele é um dos maiores conhecedores da “alma religiosa” dos Estados Unidos e um dos intelectuais católicos que mais e melhor destacaram os perigos do trumpismo e sua relação com os setores mais ultraconservadores (senão sedevacantistas) da Igreja Católica dos Estados Unidos e as razões dos ataques dessa ala da Igreja ao papa Francisco.
Trata-se de Massimo Faggioli, historiador, estudioso de religião e professor na Universidade Villanova, no estado da Pensilvânia, EUA. Ele autor do recém-lançado livro "Biden e o catolicismo nos Estados Unidos" [ainda sem tradução em português].
Conversei com ele sobre o ‘efeito Trump’, o apoio da mídia ultracatólica à invasão do Capitólio e como a eleição de Biden, um católico, poderá mudar as relações Estados Unidos-Vaticano.
ENTREVISTA
O que significa a eleição de Joe Biden para os católicos norte-americanos? Ele é o primeiro presidente católico da história depois de JFK (John Fitzgerald Kennedy).
Nos primeiros duzentos e trinta anos da sua história, a grande maioria dos presidentes dos Estados Unidos pertencia a Igrejas cristãs não católicas: Episcopal, Presbiteriana, Metodista e Batista. Biden torna-se parte da história de um grupo religioso específico na América, a de uma Igreja há muito considerada estranha e hostil ao projeto americano. Ele não é apenas o segundo católico eleito depois de Kennedy (1961-1963), mas também o quarto a se candidatar às eleições (Al Smith, em 1928, e John Kerry, em 2004) para ocupar o cargo político, mas também moral e religioso, que é a presidência americana em um momento de transição delicado para a nação e para a Igreja. Biden fez da fé católica uma parte central de sua campanha, não deixando dúvidas sobre onde estão suas raízes e o que o ampara.
Por que tantas críticas ao líder democrata por parte de um setor do catolicismo norte-americano?
O tema central da crítica é o aborto, já que Biden é a favor do aborto legal, mas recentemente surgiram também novas questões sobre a liberdade religiosa e os direitos de gays, lésbicas, bissexuais e transexuais.
O que significa a eleição de Joe Biden para os católicos norte-americanos? Ele é o primeiro presidente católico da história depois de JFK (John Fitzgerald Kennedy).
Nos primeiros duzentos e trinta anos da sua história, a grande maioria dos presidentes dos Estados Unidos pertencia a Igrejas cristãs não católicas: Episcopal, Presbiteriana, Metodista e Batista. Biden torna-se parte da história de um grupo religioso específico na América, a de uma Igreja há muito considerada estranha e hostil ao projeto americano. Ele não é apenas o segundo católico eleito depois de Kennedy (1961-1963), mas também o quarto a se candidatar às eleições (Al Smith, em 1928, e John Kerry, em 2004) para ocupar o cargo político, mas também moral e religioso, que é a presidência americana em um momento de transição delicado para a nação e para a Igreja. Biden fez da fé católica uma parte central de sua campanha, não deixando dúvidas sobre onde estão suas raízes e o que o ampara.
Por que tantas críticas ao líder democrata por parte de um setor do catolicismo norte-americano?
O tema central da crítica é o aborto, já que Biden é a favor do aborto legal, mas recentemente surgiram também novas questões sobre a liberdade religiosa e os direitos de gays, lésbicas, bissexuais e transexuais.
Os bispos estadunidenses depositaram grandes esperanças em Trump e no final saíram não apenas derrotados, mas severamente prejudicados em sua autoridade, tendo ganhado muito pouco com esa presidência.
Do regime fascista de Mussolini, a Igreja e o papado obtiveram, a um custo muito elevado (pago em grande parte por outros), algumas conquistas, como a Concordata e a resolução da “Questão Romana”. A Igreja estadunidense, ao contrário, não recebeu nada de Trump, exceto por um punhado de juízes da Suprema Corte que deixaram claro que a revogação da legalização do aborto não será alcançada por meios legais.
Alguns líderes cristãos (católicos e protestantes) teriam que pedir perdão por seu apoio, até o fim, às políticas de Donald Trump?
Por mais doloroso que seja admitir que essa violenta insurreição teve católicos nas fileiras dos insurgentes. Não só isso: também houve a tentativa de dar uma justificativa moral a esse ataque por parte da mídia católica (mais ou menos independente) dos Estados Unidos, como EWTN, Church Militant e Life Site News.
Do regime fascista de Mussolini, a Igreja e o papado obtiveram, a um custo muito elevado (pago em grande parte por outros), algumas conquistas, como a Concordata e a resolução da “Questão Romana”. A Igreja estadunidense, ao contrário, não recebeu nada de Trump, exceto por um punhado de juízes da Suprema Corte que deixaram claro que a revogação da legalização do aborto não será alcançada por meios legais.
Alguns líderes cristãos (católicos e protestantes) teriam que pedir perdão por seu apoio, até o fim, às políticas de Donald Trump?
Por mais doloroso que seja admitir que essa violenta insurreição teve católicos nas fileiras dos insurgentes. Não só isso: também houve a tentativa de dar uma justificativa moral a esse ataque por parte da mídia católica (mais ou menos independente) dos Estados Unidos, como EWTN, Church Militant e Life Site News.
O trumpismo se infiltrou na Igreja Católica e tem contado, desde 2015, com o apoio de membros do clero (incluindo alguns bispos), políticos e intelectuais católicos que não esconderam suas simpatias por uma pessoa que prometeu proteção especial à Igreja diante do poder político.
Houve ‘razões de fé’ após a invasão do Capitólio?O movimento que apoia Trump dá voz a ressentimentos de vários tipos: econômicos, para um país em declínio no mundo onde os Estados Unidos não são mais o único poder; culturais, pela crescente separação entre áreas urbanas e suburbanas, de um lado, e áreas rurais e desindustrializadas, de outro; religiosos, para a luta desenfreada entre as almas religiosas e secularistas.
Mas também existe – e este é o novo fator desde 2008 – um ressentimento étnico e racial que sai das margens e entra na corrente hegemônica.
A retórica triunfal da “eleição roubada” nada mais é do que a rejeição de um resultado eleitoral determinado pelo fato de as minorias afro-americanas e latinas terem votado esmagadora e amplamente em Biden. As tentativas dos republicanos (há uma década) de frustrar os direitos de voto das minorias falharam, pelo menos nas eleições de 2020.
Os discursos sobre a identidade racial e a religião estão totalmente entrelaçados nos Estados Unidos.
Como serão as relações Estados Unidos-Vaticano com Biden?Acredito que as relações serão boas porque tanto o papa quanto Biden são dois líderes em um momento de dificuldades políticas e culturais nas duas comunidades que representam.
Parte da Igreja dos Estados Unidos está por trás dos ataques a Francisco ou é apenas uma coisa de [arcebispo Carlo Maria Viganò] [ideólogo de extrema-direita] Steve Bannon?
Viganò e Steve Bannon são apenas a ponta do iceberg: há um catolicismo tradicionalista e golpista para quem tanto Biden como Francisco são os inimigos. Não é apenas uma questão de identidade política, mas também eclesial e teológica. Aqueles que agora se opõem a Biden são os mesmos que tentaram fazer com que o papa renunciasse em 2018: para deixar claro que esses católicos não obedecem às regras da política, nem da Igreja.
Alguns eclesiásticos e líderes de grupos ultraconservadores chegam a dizer que não vão dar a comunhão a Biden devido à sua postura sobre o aborto...
A eleição de Biden poderia finalmente pôr um fim às “guerras culturais”. O tema da comunhão é algo que já vimos no passado: a questão do aborto é uma questão moral séria, sobre a qual a Igreja deve se fazer ouvir, mas não recorrendo à “guerra das hostes” que, no final das contas, só prejudicará a Igreja.
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