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Audiência no Senado para promover a constelação familiar sai pela culatra

Físico explica por que a terapia é uma pseudociência

PAULO LOPES
jornalista

O que aparentemente seria um palco de show para as "consteladores familiares", a audiência pública no Senado para propagandear os supostos benefícios dessa prática terapeuta se tornou em um registro enfático de contestação a uma pseudociência que se expande no Brasil, com infiltração em políticas públicas.

A audiência convocada pelo senador Eduardo Girão (Podemos/CE) e realizada por ele no dia 24 de março de 2022 era para ter depoimentos de apenas pessoas favoráveis às constelações familiares — pessoas que, direta ou indiretamente, se beneficiam pecuniariamente ou com prestígio com uma prática sem comprovação científica.

O bolsonarista Girão se notabilizou na CPI da Covid por defender a cloroquina para tratar da Covid, mesmo não havendo nenhuma evidência da eficácia do medicamento contra a doença.

Ao convocar a audiência para promover a constelação familiar, Girão demonstrou ter gostado do holofotes sobre ele como porta-voz do negacionismo científico no Senado.

Alertado sobre a farsa, o senador Sérgio Petecão (PSD/AC) conseguiu, às vésperas da audiência, que Girão convidasse para depor cientistas e estudiosos que atuam contra a adoção de pseudociências como políticas públicas de saúde.

E assim o que se observou na audiência de mais de seis horas transmitida pela internet foi uma exposição da consistência do método científico contra argumentos falaciosos e anedóticos da terapia criada pelo alemão Bert Hellinger (1925-2019). Uma lição sobre como se faz ciência.

Primeiro a falar do grupo de questionadores, após o depoimento dos chamados "consteladores", Marcelo Yamashita, físico da USP e diretor científico do IQC (Instituto Questão de Ciência), partiu de um trecho do próprio requerimento para a realização da audiência para ressaltar o caráter falacioso da constelação familiar.

O trecho, a seguir, do texto é do tipo que quem não o entende acha que a culpa é sua: "[...] essa terapia impressiona por sua ação no nível anímico e isso ocorre porque forma um campo quântico no qual a telepatia atua como resultado da interconexão entre os níveis energéticos das mentes humanas".

Yamashita argumentou que tal afirmação sem nexo é típica de pseudociências que se valem de conceitos complexos, misturando de "maneira incorreta e imprecisa termos da física", para "se fantasiar de ciência".

"Pessoas que acreditam em fenômenos que não podem ser aplicados pelas regras clássicas, newtonianas, gostam de apelar para o jargão quântico para dar a impressão de que suas crenças são plausíveis."

Em referência aos relatos favoráveis (e fervorosos) em defesa da constelação que acabara de ouvir na audiência, Yamashita ressaltou que ciência não se faz assim, mas com investigação cuidadosa, com amostra e coleta de dados adequadas, com bom tratamento estatístico. 

Experimentos, enfim, que, segundo ele, possam ser repetidos por diferentes grupos de estudiosos do mundo. 

O cientista afirmou que relatos individuais não têm nenhum valor científico. "Não adianta eu dizer que na minha casa tenho um moto perpétuo quântico e que ele só funciona quando estou sozinho."

Nesse sentido, ressaltou, não existe nenhum estudo feito pelo método científico que comprova a existência da telepatia, à qual o requerimento da audiência faz referência.

"Qualquer raciocínio que com base em premissas absurdas não deve ser levado a sério. Se aceito que 1 é igual a 2, eu posso concluir qualquer absurdo a partir daí."

Além de Yamashita, participaram da audiência Paulo Almeida (diretor executivo do IQC), Tiago Tatton (diretor científico da Iniciativa Mindfulness no Brasil), Daniel Gontijo, psicólogo e membro fundador da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências) Gabriela Bailas (física e divulgadora científica) e Mateus Cavalcante de França (pesquisador e mestre em Sociologia do Direito).

Os depoimentos favoráveis à constelação familiar foram de Sophie Hellinger (viúva de Bert), Renato Shaan Bertate (médico e presidente do Instituto Brasileiro de Constelação Familiar), Inácio Junqueira (diretor de uma faculdade, a Innovare, que mantém cursos de formação em Constelação Familiar), Rose Militão (psicóloga e consteladora do Instituto Militão), Daniela Migliari (jornalista e consteladora) e Sami Storch (juiz do Tribunal de Justiça da Bahia que adotou a pseudociência em sua magistratura).








Comentários

Siulfe disse…
ose

Saudações!

Podemos afirmar que as pesquisas que indicam o favoritismo do Nine ou Nove dedos leves também seriam baseadas em "pseudos" trabalhos de campo? Pergunto isso, pelo fato de o Lula não vir realizar um trabalho num local público, como a avenida Paulista em São Paulo ou no Vale do Anhangabaú, conforme iria no famoso 7 de setembro passado. Quem esperava o 9 Dedos ou Nine, como prêmio 🏆 de consolação poderia levar para casa uma dúzia de bananas verdes. Um abraço e ótima semana! Espero que o Brasil se acelere, afinal já passamos os dois carnavais. Hora de produzir mais.

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