Pular para o conteúdo principal

Legalizada pelo governo, a ozonioterapia pode ter graves consequências

A terapia do ozônio não possui comprovação científica de que faça bem ao paciente e pode resultar em até óbito


DAISY MOTTA SANTOS
doutora em Ciências Biológicas
e pesquisadora do Centro de
Telessaúde da UFMG

MELANIA AMORIM
professora associada doutora 
da UFCG

AGÊNCIA BORI

A terapia com O3 (ozônio, também conhecido como trioxigênio) envolve a introdução de ozônio no corpo por meio de diversos métodos via intramuscular, subcutânea ou intravenosa. No entanto, a FDA, agência reguladora ligada ao Departamento de Saúde do governo dos Estados Unidos, proíbe o seu uso médico devido à falta de comprovação de segurança e eficácia, destacando a natureza tóxica do ozônio.

Segundo a agência estadunidense, efeitos fisiológicos indesejáveis têm sido relatados no sistema nervoso central, coração e visão. A irritação das mucosas é um efeito predominante do ozônio.

A inalação de ozônio pode ainda causar irritação nos pulmões o suficiente para resultar em edema pulmonar. O início do edema pulmonar geralmente é adiado por algumas horas após a exposição; portanto, a resposta sintomática não é um aviso confiável de exposição a concentrações tóxicas de ozônio. 

O odor de ozônio não é um índice confiável da concentração do elemento químico na atmosfera. Inclusive esse nome ozônio, vem da palavra grega “ozein”, que significa cheiro.

Apesar disso, a terapia com ozônio tem sido promovida para o tratamento de várias doenças, incluindo o câncer, porém carece de evidências e pode levar a efeitos adversos graves, incluindo a morte. Não é de hoje que a Associação Americana de Câncer se manifesta contrária a agentes hiperoxigenantes como o ozônio.

A “terapia de hiperoxigenação” – também chamada de “xicimedicina”, “bio-oxidativaterapia”, “terapia oxidativa” e “oxidologia” – é um método de gerenciamento do câncer baseado no conceito errôneo de que a doença é causada pela deficiência de oxigênio e pode ser curada expondo as células cancerígenas a mais oxigênio do que elas podem tolerar.

Outro fator preocupante no uso de terapias alternativas sem evidências científicas comprovadas é de que muitos pacientes, incluindo os com câncer que se beneficiariam com o tratamento convencional, acabam abandonando terapias que foram comprovadas cientificamente – como radio e quimioterapia.

Em 2018, a Associação Brasileira de Ozonioterapia (ABOZ) solicitou à Comissão para Avaliação de Novos Procedimentos em Medicina (CFM) a revisão de mais de 26 mil estudos relacionados ao assunto. Após a análise, o órgão concluiu que são requeridas pesquisas adicionais com metodologia apropriada, incluindo comparações com procedimentos placebos, além de estudos que demonstrem eficácia em relação a diferentes doses e métodos de aplicação de ozônio.

O governo brasileiro legalizou a ozonioterapia como terapia complementar em agosto de 2023, apesar da falta de evidências científicas e de manifestações contrárias de mais de 26 entidades e associações de saúde como a Sociedade Brasileira de Reumatologia, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) e o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Terapia do ozônio é vendida
com falsas promessas,
indicada até para autismo

Alegam os ozonioterapeutas que “há muitos estudos” sobre a prática. Embora surjam mais de 4.400 estudos sobre o tema numa busca simples no Pubmed – principal base de dados de estudos de saúde – a maioria destes estudos não foram feitos em humanos e não são ensaios clínicos, etapa primordial para atestar a segurança e eficácia do tratamento. 

Em busca realizada no portal no dia 9 de agosto de 2023, inserindo esses filtros, ficam apenas 268 estudos. Muitos deles são realizados em animais, revisões narrativas e estudos pré-clínicos, nenhum dos quais podem ser considerados evidências científicas.

O mesmo acontece quando pesquisamos modalidades de ozonioterapia, como retal e vaginal: não há evidências convincentes de ensaios clínicos randomizados. São estudados, em geral, desfechos substitutivos. As revisões narrativas, embora aleguem “efeito promissor”, não podem comprovar nenhum efeito.

Não custa lembrar que não é porque existe um artigo que há comprovação científica, até porque existem hoje muitas revistas científicas não confiáveis, conhecidas como “predatórias”. Esse tipo de revista não apresenta uma revisão por pares, sistema em que o estudo é revisado por outros pesquisadores, que garante a qualidade do estudo e o aceite do artigo para publicação.

Por outro lado, não encontramos nenhum artigo científico no Pubmed com os termos “ozone therapy and autism”, ou seja, não há qualquer estudo que tenha sido realizado e publicado para avaliar ozonioterapia em crianças autistas. Infelizmente essa tem sido uma suposta “indicação” frequente para uma prática invasiva que, ademais, fere a integridade corporal de crianças.

Vendida com a falsa promessa de “cura” do autismo, seus defensores iludem pais e famílias vulneráveis com a teoria de que crianças autistas estão “intoxicadas” e a terapia com ozônio eliminaria “todas as toxinas que afetam o organismo”. No entanto, nem autismo é causado ou agravado por toxinas, nem ozonioterapia pode ser propagandeada para “desintoxicar” autistas e curar o que não é doença, é condição.

> A Agência Bori é um serviço brasileiro de apoio à imprensa na cobertura da ciência.

• Lei da ozonioterapia sancionada por Lula ignora a racionalidade

• Ozonioterapia: conflitos entre ciência e regulamentação de prática sem eficácia comprovada

• Lei da Ozonioterapia: faltam evidências e sobram atropelos

Comentários

CBTF disse…
É triste que tanto a direita quanto a esquerda no Brasil foram pro lado de apoiar a pseudociência.

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

Dawkins é criticado por ter 'esperança' de que Musk não seja tão estúpido como Trump

Tibetanos continuam se matando. E Dalai Lama não os detém

O Prêmio Nobel da Paz é "neutro" em relação às autoimolações Stephen Prothero, especialista em religião da Universidade de Boston (EUA), escreveu um artigo manifestando estranhamento com o fato de o Dalai Lama (foto) se manter neutro em relação às autoimolações de tibetanos em protesto pela ocupação chinesa do Tibete. Desde 16 de março de 2011, mais de 40 tibetanos se sacrificaram dessa dessa forma, e o Prêmio Nobel da Paz Dalai Lama nada fez para deter essa epidemia de autoimolações. A neutralidade, nesse caso, não é uma forma de conivência, uma aquiescência descompromissada? Covardia, até? A própria opinião internacional parece não se comover mais com esse festival de suicídios, esse desprezo incandescente pela vida. Nem sempre foi assim, lembrou Prothero. Em 1963, o mundo se comoveu com a foto do jornalista americano Malcolm Wilde Browne que mostra o monge vietnamita Thich Quang Duc colocando fogo em seu corpo em protesto contra a perseguição aos budistas pelo

TJs perdem subsídios na Noruega por ostracismo a ex-fiéis. Duro golpe na intolerância religiosa

Jornalista defende liberdade de expressão de clérigo e skinhead

Título original: Uma questão de hombridade por Hélio Schwartsman para Folha "Oponho-me a qualquer tentativa de criminalizar discursos homofóbicos"  Disputas eleitorais parecem roubar a hombridade dos candidatos. Se Fernando Haddad e José Serra fossem um pouco mais destemidos e não tivessem transformado a busca por munição contra o adversário em prioridade absoluta de suas campanhas, estariam ambos defendendo a necessidade do kit anti-homofobia, como aliás fizeram quando estavam longe dos holofotes sufragísticos, desempenhando funções executivas. Não é preciso ter o dom de ler pensamentos para concluir que, nessa matéria, ambos os candidatos e seus respectivos partidos têm posições muito mais próximas um do outro do que da do pastor Silas Malafaia ou qualquer outra liderança religiosa. Não digo isso por ter aderido à onda do politicamente correto. Oponho-me a qualquer tentativa de criminalizar discursos homofóbicos. Acredito que clérigos e skinheads devem ser l

Proibido o livro do padre que liga a umbanda ao demônio

Padre Jonas Abib foi  acusado da prática de  intolerância religiosa O Ministério Público pediu e a Justiça da Bahia atendeu: o livro “Sim, Sim! Não, Não! Reflexões de Cura e Libertação”, do padre Jonas Abib (foto), terá de ser recolhido das livrarias por, nas palavras do promotor Almiro Sena, conter “afirmações inverídicas e preconceituosas à religião espírita e às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé, além de flagrante incitação à destruição e ao desrespeito aos seus objetos de culto”. O padre Abib é ligado à Renovação Carismática, uma das alas mais conservadoras da Igreja Católica. Ele é o fundador da comunidade Canção Nova, cuja editora publicou o livro “Sim, Sim!...”, que em 2007 vendeu cerca de 400 mil exemplares, ao preço de R$ 12,00 cada um, em média. Manuela Martinez, da Folha, reproduz um trecho do livro: "O demônio, dizem muitos, "não é nada criativo". (...) Ele, que no passado se escondia por trás dos ídolos, hoje se esconde no

Condenado por estupro, pastor Sardinha diz estar feliz na cadeia

Pastor foi condenado  a 21 anos de prisão “Estou vivendo o melhor momento de minha vida”, diz José Leonardo Sardinha (foto) no site da Igreja Assembleia de Deus Ministério Plenitude, seita evangélica da qual é o fundador. Em novembro de 2008 ele foi condenado a 21 anos de prisão em regime fechado por estupro e atentado violento ao pudor. Sua vítima foi uma adolescente que, com a família, frequentava os cultos da Plenitude. A jovem gostava de um dos filhos do pastor, mas o rapaz não queria saber dela. Sardinha então disse à adolescente que tinha tido um sonho divino: ela deveria ter relações sexuais com ele para conseguir o amor do filho, e a levou para o motel várias vezes. Mas a ‘profecia’ não se realizou. O Sardinha Jr. continuou não gostando da ingênua adolescente. No texto publicado no site, Sardinha se diz injustiçado pela justiça dos homens, mas em contrapartida, afirma, Deus lhe deu a oportunidade de levar a palavra Dele à prisão. Diz estar batizando muita gen

Veja os 10 trechos mais cruéis da Bíblia

Profecias de fim do mundo

O Juízo Final, no afresco de Michangelo na Capela Sistina 2033 Quem previu -- Religiosos de várias épocas registraram que o Juízo Final ocorrerá 2033, quando a morte de cristo completará 2000. 2012 Quem previu – Religiosos e teóricos do apocalipse, estes com base no calendário maia, garantem que o dia do Juízo Final ocorrerá em dezembro, no dia 21. 2011 Quem previu – O pastor americano Harold Camping disse que, com base em seus cálculos, Cristo voltaria no dia 21 de maio, quando os puros seriam arrebatados e os maus iriam para o inferno. Alguns desastres naturais, como o terremoto seguido de tsunami no Japão, serviram para reforçar a profecia. O que ocorreu - O fundador do grupo evangélico da Family Radio disse estar "perplexo" com o fato de a sua profecia ter falhado. Ele virou motivo de piada em todo o mundo. Camping admitiu ter errado no cálculo e remarcou da data do fim do mundo, que será 21 de outubro de 2011. 1999 Quem previu – Diversas profecias