Pular para o conteúdo principal

Mulheres são 80% das pessoas forçadas a migrar por mudança climática, informa a ONU

O ecofeminismo propõe nova perspectiva na qual a igualdade de gênero e a preservação do meio ambiente caminham juntas


JULIA VALERI | Jornal da USP
jornalista

O deslocamento forçado por causa das mudanças climáticas afeta mais de 1% da humanidade – em um planeta com 7 bilhões de pessoas, uma em cada 97 é forçada a deixar sua moradia. Segundo a ONU, aproximadamente 80% desses deslocados são mulheres, de acordo com o relatório do ACNUR (Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados)

A disparidade de gênero é muito grande e instiga a necessidade de compreender as causas do problema e contribuir com mudanças positivas para mudar esse cenário. Uma das respostas pode estar no ecofeminismo, movimento que não se identifica totalmente com o feminismo tradicional. 

O tema é debatido pela indígena Marcia Mura, do Coletivo Mura do Porto Velho e doutora em História Social pela USP. 

A definição do ecofeminismo é a busca por uma mudança de paradigma, questionando e superando as estruturas patriarcais e de exploração da natureza. 

O movimento propõe que essas mudanças sejam alcançadas através de políticas inclusivas, programas de capacitação e educação, bem como o fortalecimento do papel das mulheres nas comunidades.

Mulheres são as maiores
vítimas quando muda o clima,
como em outras circunstâncias

O ecofeminismo pode ser uma solução, uma vez que existem diversas razões que contribuem para a vulnerabilidade das mulheres nas situações de desastres socioambientais, como as desigualdades sociais, econômicas e culturais, e, como comenta o professor Márcio Henrique Ponzilacqua, da Faculdade de Direito da USP em Ribeirão Preto, “as mulheres tendem a ter menos acesso a recursos, oportunidades de emprego e educação, além de carregarem o peso das responsabilidades domésticas”.

Essa combinação de fatores coloca as mulheres em maior risco, levando a consequências desproporcionais quando ocorrem desastres naturais ou mudanças climáticas. 

O professor complementa, afirmando que a falta de autonomia e o aumento da violência de gênero também contribuem para a vulnerabilidade das mulheres nesses contextos.

O cenário de violência toma forma na guerra da Ucrânia contra a Rússia. Sima Bahous, diretora-geral da ONU Mulheres, destaca que as ucranianas estão sujeitas a riscos relacionados ao gênero, como o tráfico humano, violência sexual e acesso impedido a serviços e bens essenciais.

Na guerra da Ucrânia, 90% dos 10 milhões de deslocados são mulheres que fogem do conflito e buscam segurança em outros locais.

Marcia comenta que, devido à correlação entre a opressão de gênero e a degradação ambiental, o ecofeminismo propõe uma nova perspectiva, na qual a igualdade de gênero e a preservação do meio ambiente caminham juntas. 

“Valorizar o conhecimento tradicional das mulheres, principalmente as mulheres indígenas, e incentivar a participação ativa delas na tomada de decisões é crucial para enfrentar os desafios socioambientais.”

As ideias que a indígena defende buscam inspiração no ecofeminismo, “que tem um olhar não urbano e mais ligado a questões do meio ambiente”. 

O termo foi usado pela primeira vez pela francesa, escritora, ativista dos direitos trabalhistas, feminista e ambientalista Françoise d`Eaubonne, em 1974, e envolve a relação entre ciência, mulher e natureza. 

Adianta que ecologia é um assunto feminista, mas que as semelhanças entre feminismo e ecologia têm sido esquecidas pela ciência ecológica. E diz que “não adianta pensar em direitos das mulheres enquanto o modo de vida hegemônico destrói o ambiente em que vivemos”.

Ambientalista afirma que, apesar de considerar legítimo o movimento feminista, a palavra "feminismo" não pertence aos indígenas, dado que o feminismo, que chama de tradicional, nasceu na Europa, durante a Revolução Industrial, em 1789, enquanto as indígenas mulheres já lutavam contra a invasão europeia 200 anos antes.

Mulheres na política

Para o professor Ponzilacqua, as mulheres têm muito a oferecer na formulação de políticas relacionadas às questões socioambientais e deveriam ocupar altos cargos relacionados ao meio ambiente.

“Elas são transmissoras de conhecimentos relativos à natureza e também à sua proteção, e, geralmente, por serem ligadas diretamente à subsistência familiar em muitas sociedades, desde coletar água para cozinhar e limpar, usar a terra para o gado, buscar alimentos em rios e recifes e coletar lenha, as mulheres, em todo o planeta, usam e interagem com os recursos naturais e ecossistemas melhor que os homens”.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e outras agências da ONU informam que as mulheres são as primeiras a sentir os efeitos da mudança climática ao percorrer distâncias cada vez maiores para encontrar o que necessitam para alimentar suas famílias. 

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

Seleção feminina de vôlei não sabe que Brasil é laico desde 1891

Título original: O Brasil é ouro em intolerância Jogadoras  se excederam com oração diante das câmeras por André Barcinski para Folha Já virou hábito: toda vez que um time ou uma seleção do Brasil ganha um título, os atletas interrompem a comemoração para abrir um círculo e rezar. Sempre diante das câmeras, claro. O mesmo aconteceu sábado passado, quando a seleção feminina de vôlei conquistou espetacularmente o bicampeonato olímpico em cima da seleção norte-americana, que era favorita. O Brasil é oficialmente laico desde 1891 e a Constituição prevê a liberdade de religião. Será mesmo? O que aconteceria se alguma jogadora da seleção de vôlei fosse budista? Ou mórmon? Ou umbandista? Ou agnóstica? Ou islâmica? Alguém perguntou a todas as atletas e aos membros da comissão técnica se gostariam de rezar o “Pai Nosso”? Ou será que alguns se sentiram compelidos a participar para não destoar da festa? Será que essas manifestações públicas e encenadas, em vez de prop...

Neymar paga por mês R$ 40 mil de dízimo à Igreja Batista

Dinheiro do jogador é administrado por seu pai O jogador Neymar da Silva Santos Júnior (foto), 18, paga por mês R$ 40 mil de dízimo, ou seja, 10% de R$ 400 mil. Essa quantia é a soma de seu salário de R$ 150 mil nos Santos com os patrocínios. O dinheiro do jogador é administrado pelo seu pai e empresário, que lhe dá R$ 5 mil por mês para gastos em geral. O pai do jogador, que também se chama Neymar, lembrou que o primeiro salário do filho foi de R$ 450. Desse total, R$ 45 foram para a Igreja Batista Peniel, de São Vicente, no litoral paulista, que a família frequenta há anos. Neymar, o pai, disse que não deixa muito dinheiro com o filho para impedi-lo de se tornar consumista. “Cinco mil ainda acho muito, porque o Juninho não precisa comprar nada. Ele tem contrato com a Nike, ganha roupas, tudo. Parece um polvo, tem mais de 50 pares de sapatos”, disse o pai a Debora Bergamasco, do Estadão. O pai contou que Neymar teve rápida ascensão salarial e que ele, o filho, nun...

‘Psicóloga cristã’ faz desafio: ‘Quero ver se tem macho para me cassar’

Profissional abusa de vocabulário inadequado Marisa Lobo, que mistura psicologia com pregação religiosa e diz ser 'psicóloga cristã', escreveu em seu Twitter: “Quero ver se tem alguém macho para me cassar por que falar de Deus no meu TT. Nenhum código de ética está acima da Constituição do Brasil”.  Trata-se de um desafio ao CRP (Conselho Regional de Psicologia) do Paraná, que deu 30 dias para que ela desvincule na internet a profissão de sua crença religiosa. Ela corre o risco de ter cassado o seu registro profissional. O código de ética da profissão diz que ao psicólogo é vedado "induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais". Até agora, desde que foi advertida, no começo do mês, Marisa tem apostado no confronto com a entidade de classe, usando no Twitter um vocabulário no mínimo estranho para alguém que insiste em...

Padre acusa ateus de defenderem com 'beligerância' a teoria da evolução

O padre Paulo Ricardo de Azevedo Jr . (foto) advertiu os seus fiéis de que não podem ser “ingênuos” quando estiverem debatendo a teoria da evolução porque o seu interlocutor pode ser um ateu “beligerante”.

Malafaia católico acusa juízes de seguirem valores ateístas

Azevedo fala manso, mas é mais radical Malafaia Ao comentar a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul de retirar os crucifixos de suas instalações, o padre Paulo Ricardo de Azevedo Jr. (foto), da Arquidiocese de Cuiabá (MT), acusou os magistrados de imporem à sociedade uma “cultura ateia”, em detrimento dos valores cristãos.   Para ele, isso é uma “perversão que abala o princípio da própria Justiça”. Azevedo é um padre de fala mansa e gestos comedidos. Nesse aspecto, ele é bem diferente do espalhafatoso pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Mas Azevedo pode ser chamado de “o Malafaia da Igreja Católica” pela radicalidade de suas pregações e por suas ideias, que se situam à direita até mesmo em relação às do seu colega evangélico. Ambos sofrem dos males da teoria da conspiração contra os valores cristãos. Para Malafaia, o movimento gay quer dominar o Brasil e o mundo. Para Azevedo, os conspiradores preferenciais são os at...

CRP dá 30 dias para que psicóloga deixe de fazer proselitismo religioso

Petição pela retirada de Deus do real já tem mais de mil adesões

A referência ao Deus cristão é uma afronta ao Estado laico A petição on-line ao CMN (Conselho Monetário Nacional) da LiHS (Liga Humanista Secular do Brasil) pela retirada da expressão “Deus seja louvado” das cédulas do real já tem mais de mil adesões. A LiHS congrega céticos, agnósticos, ateus e livres-pensadores em torno de valores éticos. Tem se destacado na defesa do Estado laico. Em dezembro de 2011, o Ministério Público Federal em São Paulo encaminhou ao Banco Central pedido pela supressão das cédulas da frase de cunho religioso. Como resposta, o BC disse que se trata de uma questão da alçada do CMN. Algumas pessoas estão justificando sua adesão à petição, como Henrique Jucá. Ele disse que o Estado brasileiro deve estimular a diversidade, mas não pode privilegiar a divulgação de nenhum credo. Para Natasha Avital, é uma afronta aos brasileiros não cristãos terem de “passar adiante uma profissão de fé” toda vez que usam dinheiro. Rafael Andrade argumentou que, em um Es...

Líder religioso confirma que atirador foi da Testemunhas de Jeová

O superintendente do Circuito Rio de Janeiro-07 da Testemunhas de Jeová, Antônio Marcos Oliveira, confirmou ao UOL que Wellington Menezes de Oliveira, o atirador do Realengo, frequentou um templo da religião na Zona Oeste da cidade. Casa do atirador tinha publicações da TJs O líder religioso procurou minimizar esse fato ao ressaltar que Wellington foi seguidor da crença apenas no início de sua adolescência. Ele não disse até que ano Wellington foi um devoto. Na casa do atirador, a polícia encontrou várias publicações editadas pela religião. (foto) Essa foi a primeira manifestação da TJs desde que Wellington invadiu no dia 7 de abril uma escola e matou 12 estudantes e ferindo outros. Oliveira fez as declarações em resposta a um ex-TJ (e suposto amigo do atirador) ouvido pelo UOL. Segundo esse ex-fiel, Wellington se manteve na religião até 2008. Por essa versão, Wellington, que estava com 23 anos, permaneceu na crença até os 20 anos. Ou seja, já era adulto, e não um pré-ad...

Igreja Mundial vende por R$ 91 fronha milagrosa dos sonhos

O pastor Valdemiro Santiago está vendendo por R$ 91 em programas de emissoras de TV e nos templos de sua igreja, a Mundial, fronha milagrosa dos sonhos, para o fiel colocar no travesseiro de drogado, desempregado ou de enfermos. O pagamento é por meio de depósito na conta da Igreja. A entrega é feita pelos Correios. O valor é uma referência ao Salmo 91, que, entre outras coisas, diz: “Não terás medo do terror de noite nem da seta que voa de dia”. O preço do Valdemiro está bem acima do cobrado pelo mercado. Para se ter ideia, o site do Magazine Luiza está oferecendo uma fronha avulsa branca 100% algodão de 70 cm por 50 por R$ 5,73. Pastor recomenda a fronha para drogado e desempregado A arrecadação da fronha milagrosa  — segundo o chefe da Mundial — se destina à “obra de Deus”, que é a construção no Rio da Cidade Mundial, ancorada em 91 colunas. Valdemiro tem aconselhado a quem “não tem conseguido dormir por causa de problemas e dificuldades” a comprar mais de uma fronha. U...

Líder de igreja é acusado de abusar de dezenas de fiéis