Pular para o conteúdo principal

Pesquisas indicam que o Mal de Alzheimer pode ser o diabetes tipo 3

A nova abordagem não é consenso na comunidade científica, mas ela significa outra linha de  enfrentamento à doença


Javier Sánchez Perona
membro do CSIC (Conselho Superior de Investigações Científicas), agência estatal da Espanha

The Conversation
plataforma de informação e análise produzida por acadêmicos e jornalistas

Poucas doenças têm um impacto tão devastador como o Mal de Alzheimer. Sabemos que com a idade perderemos a memória, mas ficamos aterrorizados com a ideia de que eventualmente não seremos capazes de reconhecer os nossos entes queridos ou a nós mesmos.

Essas memórias, que ficaram armazenadas no cérebro, vão se apagando até desaparecerem por completo. Embora os esforços para encontrar um tratamento ainda não tenham produzido os resultados desejados, aprendemos muito ao longo do caminho.

Pesquisas recentes propuseram uma nova abordagem para o desenvolvimento da doença de Alzheimer. Ists pode não ser apenas uma questão da acumulação de placas beta-amilóides e de emaranhados de tau hiperfosforilados, como se pensava anteriormente, mas também sobre como as nossas células cerebrais interagem com a insulina.

A insulina é um hormônio que regula as concentrações de glicose no sangue, estando intimamente ligada a outra doença, o diabetes mellitus. Na verdade, ambas as doenças partilham fatores de risco: idade avançada, dieta, obesidade e inflamação crônica.

Poderia haver uma relação entre o cérebro e o pâncreas que ligasse as duas doenças?

Vamos imaginar por um momento que as conexões neurais se assemelham a cabos em uma rede elétrica através dos quais as informações do pensamento e da memória seriam transmitidas. Esses cabos partem de neurônios e chegam a outros. 

Problemas metabólicos
associados à insulina
causas diabetes e também
interferem no cérebro

Os neurônios são células que precisam de combustível para funcionar, e o combustível essencial é, justamente, a glicose. A insulina atua como um sino na porta das células. Quando a campainha toca, a célula sabe que deve abrir a porta para a entrada da glicose. Sem essa campainha, mesmo que haja glicose abundante no sangue, a célula não percebe, não abre a porta e não recebe o combustível.

Quando a célula recebe mais glicose do que necessita, acaba gerando resistência à insulina. Ou seja, ele fica relutante em abrir a porta. É por isso que a resistência à insulina, ligada ao futuro diabetes tipo 2, promove o acúmulo de açúcar no sangue. Além disso, promove a formação de placas beta-amilóides, características do Alzheimer.

Estudos com ratos revelaram que a administração de estreptozocina, medicamento utilizado para induzir diabetes em modelos animais, gera resistência à insulina e neurodegeneração semelhante à do Alzheimer

A ligação da inflamação

Um estado crônico de inflamação de baixo grau gerado pela resistência à insulina também ligaria ambas as doenças. A inflamação é um processo fundamental para combater as agressões externas e reparar os danos causados. Quando se torna crônico, pode levar a alterações associadas a doenças metabólicas como obesidade, doenças cardiovasculares, diabetes e Alzheimer.

Neste cenário de resistência à insulina, estresse oxidativo e inflamação, as células entram em apoptose (morte celular programada). Se isso acontecer, se as células morrerem, a rede de cabos ficará emaranhada e o cérebro não funcionará adequadamente. Então o paciente começa a esquecer e para de processar as informações. Aparece o Alzheimer.

Tudo isso sugere que os problemas metabólicos podem ser a chave para ambas as doenças. Por esse motivo, alguns pesquisadores sugeriram que o Alzheimer fosse considerado um novo tipo de diabetes.

O novo tipo de diabetes seria chamado de “diabetes tipo 3”. Uniria-se ao tipo 1, de origem mais genética do que ambiental; tipo 2, com mais influência ambiental do que genética; e gestacional, que ocorre em algumas gestantes.

O termo surgiu em 2005 na Universidade de Rhode Island, cujos pesquisadores propuseram que o Alzheimer poderia ser uma forma de diabetes cerebral, caracterizada por resistência à insulina e disfunção metabólica.

Embora esse termo não seja aceito por toda a comunidade científica, é uma hipótese que pode servir para contribuir para uma visão mais completa da doença.

As ligações entre as duas doenças são fortes, mas ainda há muito a descobrir, especialmente sobre como utilizar essa informação em benefício dos pacientes. 

Uma vez que a resistência à insulina e a inflamação desempenham papéis centrais, poderiam partilhar estratégias terapêuticas. Nesse sentido, a promoção de estilos de vida saudáveis, incluindo a alimentação, poderia ter um impacto positivo na prevenção e no tratamento da diabetes e da doença de Alzheimer.

A ligação entre Alzheimer e diabetes pode transformar a nossa compreensão de ambas as doenças. A ideia do diabetes tipo 3, embora não tenha consenso científico, pode abrir novas portas para pesquisas que liguem as duas doenças, com a resistência à insulina e a inflamação no centro das atenções, bem como tratamentos eficazes. 

A cada nova descoberta ficamos um pouco mais perto de tratar doenças que afetam milhões de pessoas em todo o mundo. Estaremos no limiar de uma nova era na investigação da doença de Alzheimer? Somente o tempo e a ciência poderão responder a esta pergunta.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

Dawkins é criticado por ter 'esperança' de que Musk não seja tão estúpido como Trump

Tibetanos continuam se matando. E Dalai Lama não os detém

O Prêmio Nobel da Paz é "neutro" em relação às autoimolações Stephen Prothero, especialista em religião da Universidade de Boston (EUA), escreveu um artigo manifestando estranhamento com o fato de o Dalai Lama (foto) se manter neutro em relação às autoimolações de tibetanos em protesto pela ocupação chinesa do Tibete. Desde 16 de março de 2011, mais de 40 tibetanos se sacrificaram dessa dessa forma, e o Prêmio Nobel da Paz Dalai Lama nada fez para deter essa epidemia de autoimolações. A neutralidade, nesse caso, não é uma forma de conivência, uma aquiescência descompromissada? Covardia, até? A própria opinião internacional parece não se comover mais com esse festival de suicídios, esse desprezo incandescente pela vida. Nem sempre foi assim, lembrou Prothero. Em 1963, o mundo se comoveu com a foto do jornalista americano Malcolm Wilde Browne que mostra o monge vietnamita Thich Quang Duc colocando fogo em seu corpo em protesto contra a perseguição aos budistas pelo

Veja os 10 trechos mais cruéis da Bíblia

TJs perdem subsídios na Noruega por ostracismo a ex-fiéis. Duro golpe na intolerância religiosa

Condenado por estupro, pastor Sardinha diz estar feliz na cadeia

Pastor foi condenado  a 21 anos de prisão “Estou vivendo o melhor momento de minha vida”, diz José Leonardo Sardinha (foto) no site da Igreja Assembleia de Deus Ministério Plenitude, seita evangélica da qual é o fundador. Em novembro de 2008 ele foi condenado a 21 anos de prisão em regime fechado por estupro e atentado violento ao pudor. Sua vítima foi uma adolescente que, com a família, frequentava os cultos da Plenitude. A jovem gostava de um dos filhos do pastor, mas o rapaz não queria saber dela. Sardinha então disse à adolescente que tinha tido um sonho divino: ela deveria ter relações sexuais com ele para conseguir o amor do filho, e a levou para o motel várias vezes. Mas a ‘profecia’ não se realizou. O Sardinha Jr. continuou não gostando da ingênua adolescente. No texto publicado no site, Sardinha se diz injustiçado pela justiça dos homens, mas em contrapartida, afirma, Deus lhe deu a oportunidade de levar a palavra Dele à prisão. Diz estar batizando muita gen

Proibido o livro do padre que liga a umbanda ao demônio

Padre Jonas Abib foi  acusado da prática de  intolerância religiosa O Ministério Público pediu e a Justiça da Bahia atendeu: o livro “Sim, Sim! Não, Não! Reflexões de Cura e Libertação”, do padre Jonas Abib (foto), terá de ser recolhido das livrarias por, nas palavras do promotor Almiro Sena, conter “afirmações inverídicas e preconceituosas à religião espírita e às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé, além de flagrante incitação à destruição e ao desrespeito aos seus objetos de culto”. O padre Abib é ligado à Renovação Carismática, uma das alas mais conservadoras da Igreja Católica. Ele é o fundador da comunidade Canção Nova, cuja editora publicou o livro “Sim, Sim!...”, que em 2007 vendeu cerca de 400 mil exemplares, ao preço de R$ 12,00 cada um, em média. Manuela Martinez, da Folha, reproduz um trecho do livro: "O demônio, dizem muitos, "não é nada criativo". (...) Ele, que no passado se escondia por trás dos ídolos, hoje se esconde no

Profecias de fim do mundo

O Juízo Final, no afresco de Michangelo na Capela Sistina 2033 Quem previu -- Religiosos de várias épocas registraram que o Juízo Final ocorrerá 2033, quando a morte de cristo completará 2000. 2012 Quem previu – Religiosos e teóricos do apocalipse, estes com base no calendário maia, garantem que o dia do Juízo Final ocorrerá em dezembro, no dia 21. 2011 Quem previu – O pastor americano Harold Camping disse que, com base em seus cálculos, Cristo voltaria no dia 21 de maio, quando os puros seriam arrebatados e os maus iriam para o inferno. Alguns desastres naturais, como o terremoto seguido de tsunami no Japão, serviram para reforçar a profecia. O que ocorreu - O fundador do grupo evangélico da Family Radio disse estar "perplexo" com o fato de a sua profecia ter falhado. Ele virou motivo de piada em todo o mundo. Camping admitiu ter errado no cálculo e remarcou da data do fim do mundo, que será 21 de outubro de 2011. 1999 Quem previu – Diversas profecias

Santuário Nossa Senhora Aparecida fatura R$ 100 milhões por ano

Basílica atrai 10 milhões de fiéis anualmente O Santuário de Nossa Senhora de Aparecida é uma empresa da Igreja Católica – tem CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) – que fatura R$ 100 milhões por ano. Tudo começou em 1717, quando três pescadores acharam uma imagem de Nossa Senhora no rio Paraíba do Sul, formando-se no local uma vila que se tornou na cidade de Aparecida, a 168 km de São Paulo. Em 1984, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) concedeu à nova basílica de Aparecida o status de santuário, que hoje é uma empresa em franca expansão, beneficiando-se do embalo da economia e do fortalecimento do poder aquisitivo da população dos extratos B e C. O produto dessa empresa é o “acolhimento”, disse o padre Darci José Nicioli, reitor do santuário, ao repórter Carlos Prieto, do jornal Valor Econômico. Para acolher cerca de 10 milhões de fiéis por ano, a empresa está investindo R$ 60 milhões na construção da Cidade do Romeiro, que será constituída por trê