Pular para o conteúdo principal

A cada mil pessoas com chikungunya, uma delas morre. É alta letalidade

O vírus ataca todos os órgãos do corpo e chega ao cérebro com uma estratégia para enganar as células de defesa, de acordo com estudo


Júlio Bernardes
jornalista

Jornal da USP

Os mecanismos biológicos por trás dos casos graves e fatais de chikungunya são revelados em um estudo internacional com participação de pesquisadores da USP. Os resultados mostram que o vírus 

CHIKV, causador da doença, infecta as células de defesa do organismo e as usa como “cavalo de Troia” para invadir o sistema nervoso central e danificar o cérebro.

“A cada 1.000 pessoas diagnosticadas com chikungunya, uma delas morre, em média. Essa taxa é um pouco maior do que a da dengue, outra doença viral transmitida pelo mosquito Aedes aegypti”, afirmam os pesquisadores Ingra Morales Claro, William Marciel de Souza e a professora Ester Sabino, do Instituto de Medicina Tropical (IMT) e da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), que integram a equipe responsável pelo estudo. 

Souza é professor assistente na University of Kentucky (Estados Unidos) e Ingra Morales Claro é pesquisadora associada no Imperial College London (Reino Unido).

“Portanto, esta pesquisa investigou quais fatores do vírus e da pessoa infectada podem levar à morte por chikungunya”, apontam os cientistas. 


O vírus CHIK causa
danos no cérebro, levando
o infectado à morte
FOTO: DIVULGAÇÃO

“A doença pode se apresentar de diferentes formas: aguda, subaguda ou crônica. Na maioria dos casos, a pessoa tem febre alta, dores musculares e nas articulações, dor de cabeça e manchas na pele por até três semanas.”

“Algumas vezes, os sintomas podem durar mais tempo, com fadiga e dores nas articulações persistindo por até 90 dias. Mais preocupante ainda, a chikungunya pode afetar outros órgãos e sistemas do corpo, como os olhos, coração e também o sistema nervoso”, observam os pesquisadores.

“Neste estudo encontramos o vírus no sistema nervoso central de pacientes que morreram em decorrência da doença, incluindo danos no cérebro. Porém, mais pesquisas são necessárias para entender qual a frequência em que essas complicações ocorrem.”

Cavalo de Troia

A pesquisa foi realizada com amostras de sangue, líquido cefalorraquidiano (fluido biológico produzido e armazenado no cérebro) e tecidos de 32 pacientes mortos por chikungunya no Estado do Ceará. 

“Também foram analisadas amostras de sangue de 39 pacientes que não evoluíram para casos graves e 15 doadores de sangue saudáveis”, explicam os cientistas. “Além disso, realizamos experimentos in vitro para determinar os mecanismos de entrada do vírus no sistema nervoso central.”

De acordo com os pesquisadores, o vírus CHIKV invade o sistema nervoso central e causa danos neurológicos por dois mecanismos distintos. 

“Os monócitos, células do sistema imunológico, são infectados pelo vírus e, de modo similar ao cavalo de Troia da mitologia grega, as células infectadas o levam para dentro do sistema nervoso central, onde o CHIKV é liberado e causa danos neurológicos”, relatam.

“Essa estratégia permite que o vírus disperse as defesas do sistema imunológico, o que pode tornar o tratamento da infecção ainda mais desafiador.”

O estudo também mostra que o vírus CHIKV infecta as células da barreira hematoencefálica, formada por células que formam uma barreira justa e compacta para proteger o sistema nervoso central e o cérebro. 


“Ela funciona como um filtro, permitindo a entrada de nutrientes e oxigênio, enquanto bloqueia a entrada de toxinas e patógenos presentes no sangue”, destacam os cientistas. 

“O vírus altera duas proteínas, a PECAM-1, que fica na membrana e mantém as células unidas, mas é fragmentada pelo CHIKV, criando brechas na barreira. Já a ZO-1, que está no interior da célula, também ajuda na união, porém é aumentada e deslocada para a membrana pela infecção.”

“Essas alterações aumentam a permeabilidade da barreira hematoencefálica, permitindo a entrada do CHIKV no sistema nervoso central e contribuindo para complicações neurológicas”, concluem os pesquisadores.

“A pesquisa esclarece sobre os mecanismos biológicos por trás dos casos graves e fatais de chikungunya, fornecendo conhecimento para o desenvolvimento de novos tratamentos eficazes. Também identificou potenciais biomarcadores de risco, que podem ajudar a identificar pacientes com alto risco de complicações.”

Os cientistas enfatizam que o estudo pode contribuir para melhores práticas clínicas. 

“É essencial compreender a doença, pois as epidemias provavelmente continuarão caso não haja a implementação de programas de imunização."

A pesquisa foi conduzida por uma equipe internacional e multidisciplinar de virologistas, médicos, epidemiologistas, clínicos e físicos médicos. 

Ao todo foram 56 pesquisadores da University of Kentucky e University of Texas Medical Branch (Estados Unidos), USP, Unicamp, Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará e Imperial College London (Reino Unido).

> Com informação de estudo publicado no site Science Direct.Mais informações com William de Souza (wmdesouza@uky.edu. com).

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

Dawkins é criticado por ter 'esperança' de que Musk não seja tão estúpido como Trump

Tibetanos continuam se matando. E Dalai Lama não os detém

O Prêmio Nobel da Paz é "neutro" em relação às autoimolações Stephen Prothero, especialista em religião da Universidade de Boston (EUA), escreveu um artigo manifestando estranhamento com o fato de o Dalai Lama (foto) se manter neutro em relação às autoimolações de tibetanos em protesto pela ocupação chinesa do Tibete. Desde 16 de março de 2011, mais de 40 tibetanos se sacrificaram dessa dessa forma, e o Prêmio Nobel da Paz Dalai Lama nada fez para deter essa epidemia de autoimolações. A neutralidade, nesse caso, não é uma forma de conivência, uma aquiescência descompromissada? Covardia, até? A própria opinião internacional parece não se comover mais com esse festival de suicídios, esse desprezo incandescente pela vida. Nem sempre foi assim, lembrou Prothero. Em 1963, o mundo se comoveu com a foto do jornalista americano Malcolm Wilde Browne que mostra o monge vietnamita Thich Quang Duc colocando fogo em seu corpo em protesto contra a perseguição aos budistas pelo

Proibido o livro do padre que liga a umbanda ao demônio

Padre Jonas Abib foi  acusado da prática de  intolerância religiosa O Ministério Público pediu e a Justiça da Bahia atendeu: o livro “Sim, Sim! Não, Não! Reflexões de Cura e Libertação”, do padre Jonas Abib (foto), terá de ser recolhido das livrarias por, nas palavras do promotor Almiro Sena, conter “afirmações inverídicas e preconceituosas à religião espírita e às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé, além de flagrante incitação à destruição e ao desrespeito aos seus objetos de culto”. O padre Abib é ligado à Renovação Carismática, uma das alas mais conservadoras da Igreja Católica. Ele é o fundador da comunidade Canção Nova, cuja editora publicou o livro “Sim, Sim!...”, que em 2007 vendeu cerca de 400 mil exemplares, ao preço de R$ 12,00 cada um, em média. Manuela Martinez, da Folha, reproduz um trecho do livro: "O demônio, dizem muitos, "não é nada criativo". (...) Ele, que no passado se escondia por trás dos ídolos, hoje se esconde no

Condenado por estupro, pastor Sardinha diz estar feliz na cadeia

Pastor foi condenado  a 21 anos de prisão “Estou vivendo o melhor momento de minha vida”, diz José Leonardo Sardinha (foto) no site da Igreja Assembleia de Deus Ministério Plenitude, seita evangélica da qual é o fundador. Em novembro de 2008 ele foi condenado a 21 anos de prisão em regime fechado por estupro e atentado violento ao pudor. Sua vítima foi uma adolescente que, com a família, frequentava os cultos da Plenitude. A jovem gostava de um dos filhos do pastor, mas o rapaz não queria saber dela. Sardinha então disse à adolescente que tinha tido um sonho divino: ela deveria ter relações sexuais com ele para conseguir o amor do filho, e a levou para o motel várias vezes. Mas a ‘profecia’ não se realizou. O Sardinha Jr. continuou não gostando da ingênua adolescente. No texto publicado no site, Sardinha se diz injustiçado pela justiça dos homens, mas em contrapartida, afirma, Deus lhe deu a oportunidade de levar a palavra Dele à prisão. Diz estar batizando muita gen

Veja os 10 trechos mais cruéis da Bíblia

Profecias de fim do mundo

O Juízo Final, no afresco de Michangelo na Capela Sistina 2033 Quem previu -- Religiosos de várias épocas registraram que o Juízo Final ocorrerá 2033, quando a morte de cristo completará 2000. 2012 Quem previu – Religiosos e teóricos do apocalipse, estes com base no calendário maia, garantem que o dia do Juízo Final ocorrerá em dezembro, no dia 21. 2011 Quem previu – O pastor americano Harold Camping disse que, com base em seus cálculos, Cristo voltaria no dia 21 de maio, quando os puros seriam arrebatados e os maus iriam para o inferno. Alguns desastres naturais, como o terremoto seguido de tsunami no Japão, serviram para reforçar a profecia. O que ocorreu - O fundador do grupo evangélico da Family Radio disse estar "perplexo" com o fato de a sua profecia ter falhado. Ele virou motivo de piada em todo o mundo. Camping admitiu ter errado no cálculo e remarcou da data do fim do mundo, que será 21 de outubro de 2011. 1999 Quem previu – Diversas profecias

TJs perdem subsídios na Noruega por ostracismo a ex-fiéis. Duro golpe na intolerância religiosa

Santuário Nossa Senhora Aparecida fatura R$ 100 milhões por ano

Basílica atrai 10 milhões de fiéis anualmente O Santuário de Nossa Senhora de Aparecida é uma empresa da Igreja Católica – tem CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) – que fatura R$ 100 milhões por ano. Tudo começou em 1717, quando três pescadores acharam uma imagem de Nossa Senhora no rio Paraíba do Sul, formando-se no local uma vila que se tornou na cidade de Aparecida, a 168 km de São Paulo. Em 1984, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) concedeu à nova basílica de Aparecida o status de santuário, que hoje é uma empresa em franca expansão, beneficiando-se do embalo da economia e do fortalecimento do poder aquisitivo da população dos extratos B e C. O produto dessa empresa é o “acolhimento”, disse o padre Darci José Nicioli, reitor do santuário, ao repórter Carlos Prieto, do jornal Valor Econômico. Para acolher cerca de 10 milhões de fiéis por ano, a empresa está investindo R$ 60 milhões na construção da Cidade do Romeiro, que será constituída por trê