Corey L Cook
professor de psicologia, Skidmore College, Estados Unidos
Não é nenhum segredo que os crentes geralmente nutrem atitudes extraordinariamente negativas em relação aos ateus.
Na verdade, dados de sondagens mostram que a maioria dos americanos vê os ateus como “ameaçadores”, inadequados para ocupar cargos públicos e inadequados para casar com alguém da sua família.
Mas quais são as raízes psicológicas da antipatia pelos ateus?
Historicamente, os psicólogos evolucionistas argumentam que os ateus foram difamados porque Deus serve como a fonte última de poder e influência social: Deus recompensa os comportamentos apropriados e pune os inadequados.
Pensa-se, então, que os crentes consideram os ateus fundamentalmente indignos de confiança porque não aceitam, afirmam e aderem aos imperativos morais divinamente ordenados (ou seja, “a palavra de Deus”).
A pesquisa confirmou a profunda desconfiança que os crentes sentem em relação aos ateus. Por exemplo, num estudo, estudantes universitários canadenses, que são tipicamente menos religiosos do que os seus homólogos norte-americanos, classificaram os ateus como mais indignos de confiança do que os muçulmanos — e tão indignos de confiança como os violadores!
Ainda assim, não está claro por que a desconfiança dos ateus é tão profunda. Decidimos descobrir, e, por dois estudos separados, descobrimos que o desprezo esmagador dos crentes pelos ateus pode vir de uma fonte surpreendente: o medo da morte.
A morte: é para fugir dela que pessoas adotam crenças que pregam a vida em outro mundo IMAGEM: REPRODUÇÃO DA REDE SOCIAL |
Conforme a teoria da gestão do terror, os seres humanos são únicos porque são autoconscientes e podem antecipar o futuro.
Na maior parte, essas são adaptações cognitivas altamente benéficas. Eles nos permitem formular planos e prever as consequências de nossas ações. Mas também nos fazem perceber que a morte é inevitável e imprevisível.
Esses pensamentos indesejáveis dão origem a um terror potencialmente paralisante: o medo da morte. Esse medo, então, é “gerido” pela adoção de cosmovisões culturais — crenças sobre a realidade que partilhamos com os outros — que nos proporcionam uma sensação de conforto. Poderia significar envolver-se em religiões que defendem a imortalidade espiritual, ou valorizar fortemente a identidade nacional de alguém.
Esse processo também funciona ao contrário: quando confrontados com ameaças as suas crenças, cai o escudo protetor de “gestão do terrorismo” dos crentes, e ressurge a apreensão sobre a morte. Então, como em um círculo, ocorre maior apego às crenças religiosa, respondemos de forma mais negativa àqueles que as ameaçam.
Em um exemplo, a pesquisa mostra que, na sequência dos ataques terroristas de 11 de setembro, os símbolos islâmicos aumentaram os pensamentos de morte nos americanos não muçulmanos. Da mesma forma, a preocupação com a morte aumentou a hostilidade para com o Islã.
Então, como as preocupações existenciais sobre a morte se relacionam com o ateísmo?
Pesquisas anteriores mostraram que a hostilidade para com os ateus é parcialmente motivada pelo fato de muitos considerarem os ateus uma ameaça à moral e aos valores.
Portanto, os crentes raciocinam que, se os ateus ameaçam os seus valores, então provavelmente também ameaçam as crenças que moldam sua visão de mundo.
Colocamos então a hipótese de que os ateus, simplesmente por existirem, provavelmente suscitariam indícios de mortalidade — o que, por sua vez, promoveria um aumento da negatividade em relação aos ateus.
Testamos essa ideia em dois experimentos diferentes. No primeiro, recrutamos 236 alunos do College of Staten Island CUNY. Excluímos os poucos participantes que se declararam ateus ou agnósticos e pedimos a metade dos participantes restantes que respondessem a duas perguntas: “O que você acha que acontecerá com você quando morrer fisicamente?” e “Quais são as emoções que a ideia da morte causa em você?” A outra metade respondeu a perguntas semelhantes sobre sentir dores extremas.
Após pensarem sobre a morte ou a dor, metade dos 236 participantes foram convidados a fornecer as suas atitudes em relação aos ateus, enquanto a outra metade respondeu com as suas atitudes em relação aos quakers — um grupo religioso não ameaçador.
Os participantes relataram suas impressões gerais e níveis de confiança, indicando como se sentiam em relação a essas pessoas “se casarem com alguém da família” ou “trabalharem em seu escritório”.
Como esperado, os participantes foram mais negativos em relação aos ateus em geral do que aos quacres. Mais importante, porém, descobrimos que pensar sobre a morte aumentou a negatividade em relação aos ateus — mas não em relação aos quakers.
Aqueles que ponderaram sobre a sua própria morte mostraram menos entusiasmo, maior preconceito comportamental (também conhecido como distanciamento social) e maior desconfiança em relação aos ateus, enquanto os pensamentos de morte não afetaram as reações em relação aos quakers, um grupo teísta.
No segundo experimento, medimos diretamente se o simples pensamento sobre o ateísmo aumentaria os pensamentos inconscientes de morte. Pedimos a 174 estudantes de Staten Island (excluindo ateus e agnósticos) que descrevessem as suas emoções em relação a um de três tópicos: dor, morte ou ateísmo. Em seguida, apresentamos a eles uma tarefa de completar palavras destinada a capturar pensamentos de morte.
Não é de surpreender que aqueles que ponderaram sobre a sua própria mortalidade indicassem maiores pensamentos de morte do que aqueles que pensavam em sentir dor. No entanto, pensar sobre o ateísmo também aumentou os pensamentos sobre a morte — na mesma medida que pensar sobre a própria morte.
Essas descobertas sugerem haver algo mais profundo na esmagadora negatividade que as pessoas têm em relação aos ateus. Sim, no nível consciente, eles são considerados indignos de confiança porque, aos olhos dos crentes, não têm Deus nem valores.
Mas a um nível inconsciente, parece que os ateus ameaçam as crenças sobre a natureza da própria existência. Eles servem como um lembrete constante da morte, negando a presença de um poder sobrenatural que regula os assuntos humanos e monitora o portal para a imortalidade.
É claro que os ateus não são menos morais ou confiáveis do que os seus homólogos teístas. À luz destas descobertas, esperamos que talvez os crentes moderem o seu desprezo pelos ateus.
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