Pular para o conteúdo principal

Só é ciência o que se aplica aos métodos científicos, e tudo mais é pseudociência. Simples assim

A lista de pseudociência é enorme, atende a interesse financeiro de muita gente e é uma ameaça à saúde dos pacientes


Wallisen Tadashi Hattori
doutor em Psicobiologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Stefan Vilges de Oliveira
doutor em Medicina Tropical pela Universidade de Brasíli

Comunica
portal de notícias da Universidade de Uberlândia, Minas

Quando tratamos de pseudociência, precisamos partir dos conceitos do que é ciência e entender o que é pseudociência. E até entender o que não é ciência. 

No âmbito da filosofia da ciência e para fins didáticos, podemos dizer que: a ciência é a aquisição de conhecimento a partir do uso do método científico, ou seja, utiliza-se um conjunto de regras bem estabelecidas e validadas para reavaliar conhecimentos já existentes ou produzir novos conhecimentos.

A pseudociência é um conjunto de crenças e práticas que se apresentam como científicas, mas, em geral, é um conhecimento ultrapassado ou que não permite a reprodução dos seus resultados através do uso dos métodos científicos. 

Como características, essas práticas não permitem ser testadas e decorrem do “conhecimento” empírico, carregadas de apelo emocional e não sustentam críticas. Também se apresentam como verdades absolutas.

 Algumas pessoas incluem a negação do conhecimento científico como pseudociência, por exemplo, negar a eficácia das vacinas ou que estamos vivendo atualmente os efeitos das mudanças climáticas no planeta.

Assim, não é ciência tudo aquilo que foge da aplicação dos métodos científicos. Geralmente, conhecimento baseado em crença.

Por exemplo, a teoria da evolução é uma teoria científica, baseada em observações feitas a partir do método científico. 

Já a teoria do design inteligente é uma pseudociência, no sentido de que ignora certas evidências ou métodos científicos e considera a interferência de uma inteligência superior que não se pode comprovar ou medir pelo método científico. O criacionismo não é científico, uma vez que está baseado na crença pessoal.

Para ser válido, o método
científico tem de ser
reproduzido em qualquer 
laboratório, além o de origem 

Ao longo da história, o entendimento sobre as causas das doenças foram evoluindo, consequentemente as formas de tratá-las. Na antiguidade, acreditava-se que as doenças estavam associadas a concepções religiosas e desequilíbrio dos elementos — os tratamentos estavam pautados em rituais religiosos e algumas práticas que utilizavam o uso de plantas.

Na Idade Média, acreditava-se na teoria miasmática como causa das doenças (essa teoria defendia que as doenças eram produzidas pelas emanações fétidas e invisíveis que provinham de matéria orgânica em decomposição). Essa ideia impulsionou o desenvolvimento de melhorias na qualidade de limpeza urbana e saneamento, já que nessa época acreditava-se que essa era a origem das doenças.

Somente a partir do século XIX, com o surgimento da bacteriologia, houve entendimento de que as doenças estavam associadas a microrganismos e os tratamentos dos pacientes passaram a ser mais personificados.

No século XX, com compreensão de que existem múltiplos fatores determinantes da ocorrência das doenças, os desafios científicos foram ampliados, para buscar formas de desencadear ações de saúde no agente causal e atuar no que determina a ocorrência dessa doença. Firmou-se um olhar sobre a coletividade e nos determinantes socioeconômicos.

Muito do que temos hoje como pseudociência é fruto dessa evolução histórica do entendimento das doenças e de como tratá-las. 

A lista de pseudociências é enorme e movimenta um mercado significativo. Muitos profissionais ganham muito dinheiro oferecendo serviços ou tratamentos para as pessoas com ideias que parecem científicas, mas que se caracterizam como pseudociência. 

Podemos incluir astrologia, terapia de conversão (ou cura gay), constelação familiar, criptozoologia, além de diversas formas de medicina alternativa.

Um exemplo bastante debatido na área da Saúde é a homeopatia. Essa prática surgiu como ciência, em em substituição a algumas técnicas que geralmente não funcionavam, como a sangria. 

No passado, as pessoas retiravam uma quantidade de sangue de alguém doente como técnica de tratamento e, na maioria das vezes, isso não ajudava a pessoa doente. Então, alguém, lá no século XVIII, a partir de observações práticas, sugeriu oferecer água com alguma substância diluída em substituição à sangria. 

Naquela época, a homeopatia parecia mesmo uma alternativa melhor e foi considerada ciência.

Entretanto, com o avanço científico e tecnológico, hoje os cientistas conseguem provar que há alternativas melhores do que apenas oferecer água ou acreditar na memória da água, que não faz nenhum sentido, já que essa prática não pode ser testada pelo método científico. Conhecemos explicações científicas alternativas melhores que a homeopatia. 

Assim, a homeopatia passa a ser considerada pseudociência, com explicações baseadas, por exemplo, no efeito placebo e na dificuldade de comprovar a sua eficácia pelo método científico.

E qual é o problema de acreditar em homeopatia? Ou melhor, qual é o problema da pseudociência na área da Saúde?

Do ponto de vista individual, o uso de conhecimentos pseudocientíficos pode trazer, por exemplo, atraso no diagnóstico e tratamento de doenças, exposição a riscos desnecessários e gastos pessoais elevados em tratamentos sem comprovação científica, que geralmente são muito caros.

Do ponto de vista coletivo, temos que considerar os recursos financeiros são limitados e investir dinheiro público em pseudociência ou tratamento pseudocientíficos pode trazer sérios prejuízos à saúde pública. 


Desde 2006, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde (SUS) determina que essas práticas, como homeopatia, sejam utilizadas como complementares, mas nunca devem substituir os tratamentos alopáticos, que têm embasamento científico.

Em 2011, foi criada a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias em Saúde (Conitec) que, no do SUS, guia o Ministério da Saúde na tarefa de incorporar, excluir ou alterar tecnologias em saúde de forma justa, transparente e baseada em evidências científicas. 

A Conitec tem imposto racionalidade ao processo de incorporação de tecnologias no SUS, substituindo decisões casuísticas por critérios técnicos rigorosos. Ao recomendar a incorporação de tecnologias com base em critérios técnicos, a Conitec evitou o desperdício de recursos públicos com tecnologias ineficazes ou de alto custo, liberando recursos para outras áreas prioritárias do SUS.

Em alguns outros países, como Reino Unido e França, o governo também não financia mais tratamentos pseudocientíficos com dinheiro dos cofres públicos. 

A Conitec precisa continuar aprimorando os seus métodos de avaliação para garantir que as decisões tomadas sejam sempre baseadas nas melhores evidências científicas disponíveis, além de garantir o uso racional do dinheiro público.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

Seleção feminina de vôlei não sabe que Brasil é laico desde 1891

Título original: O Brasil é ouro em intolerância Jogadoras  se excederam com oração diante das câmeras por André Barcinski para Folha Já virou hábito: toda vez que um time ou uma seleção do Brasil ganha um título, os atletas interrompem a comemoração para abrir um círculo e rezar. Sempre diante das câmeras, claro. O mesmo aconteceu sábado passado, quando a seleção feminina de vôlei conquistou espetacularmente o bicampeonato olímpico em cima da seleção norte-americana, que era favorita. O Brasil é oficialmente laico desde 1891 e a Constituição prevê a liberdade de religião. Será mesmo? O que aconteceria se alguma jogadora da seleção de vôlei fosse budista? Ou mórmon? Ou umbandista? Ou agnóstica? Ou islâmica? Alguém perguntou a todas as atletas e aos membros da comissão técnica se gostariam de rezar o “Pai Nosso”? Ou será que alguns se sentiram compelidos a participar para não destoar da festa? Será que essas manifestações públicas e encenadas, em vez de prop...

Neymar paga por mês R$ 40 mil de dízimo à Igreja Batista

Dinheiro do jogador é administrado por seu pai O jogador Neymar da Silva Santos Júnior (foto), 18, paga por mês R$ 40 mil de dízimo, ou seja, 10% de R$ 400 mil. Essa quantia é a soma de seu salário de R$ 150 mil nos Santos com os patrocínios. O dinheiro do jogador é administrado pelo seu pai e empresário, que lhe dá R$ 5 mil por mês para gastos em geral. O pai do jogador, que também se chama Neymar, lembrou que o primeiro salário do filho foi de R$ 450. Desse total, R$ 45 foram para a Igreja Batista Peniel, de São Vicente, no litoral paulista, que a família frequenta há anos. Neymar, o pai, disse que não deixa muito dinheiro com o filho para impedi-lo de se tornar consumista. “Cinco mil ainda acho muito, porque o Juninho não precisa comprar nada. Ele tem contrato com a Nike, ganha roupas, tudo. Parece um polvo, tem mais de 50 pares de sapatos”, disse o pai a Debora Bergamasco, do Estadão. O pai contou que Neymar teve rápida ascensão salarial e que ele, o filho, nun...

‘Psicóloga cristã’ faz desafio: ‘Quero ver se tem macho para me cassar’

Profissional abusa de vocabulário inadequado Marisa Lobo, que mistura psicologia com pregação religiosa e diz ser 'psicóloga cristã', escreveu em seu Twitter: “Quero ver se tem alguém macho para me cassar por que falar de Deus no meu TT. Nenhum código de ética está acima da Constituição do Brasil”.  Trata-se de um desafio ao CRP (Conselho Regional de Psicologia) do Paraná, que deu 30 dias para que ela desvincule na internet a profissão de sua crença religiosa. Ela corre o risco de ter cassado o seu registro profissional. O código de ética da profissão diz que ao psicólogo é vedado "induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais". Até agora, desde que foi advertida, no começo do mês, Marisa tem apostado no confronto com a entidade de classe, usando no Twitter um vocabulário no mínimo estranho para alguém que insiste em...

Padre acusa ateus de defenderem com 'beligerância' a teoria da evolução

O padre Paulo Ricardo de Azevedo Jr . (foto) advertiu os seus fiéis de que não podem ser “ingênuos” quando estiverem debatendo a teoria da evolução porque o seu interlocutor pode ser um ateu “beligerante”.

Malafaia católico acusa juízes de seguirem valores ateístas

Azevedo fala manso, mas é mais radical Malafaia Ao comentar a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul de retirar os crucifixos de suas instalações, o padre Paulo Ricardo de Azevedo Jr. (foto), da Arquidiocese de Cuiabá (MT), acusou os magistrados de imporem à sociedade uma “cultura ateia”, em detrimento dos valores cristãos.   Para ele, isso é uma “perversão que abala o princípio da própria Justiça”. Azevedo é um padre de fala mansa e gestos comedidos. Nesse aspecto, ele é bem diferente do espalhafatoso pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Mas Azevedo pode ser chamado de “o Malafaia da Igreja Católica” pela radicalidade de suas pregações e por suas ideias, que se situam à direita até mesmo em relação às do seu colega evangélico. Ambos sofrem dos males da teoria da conspiração contra os valores cristãos. Para Malafaia, o movimento gay quer dominar o Brasil e o mundo. Para Azevedo, os conspiradores preferenciais são os at...

Petição pela retirada de Deus do real já tem mais de mil adesões

A referência ao Deus cristão é uma afronta ao Estado laico A petição on-line ao CMN (Conselho Monetário Nacional) da LiHS (Liga Humanista Secular do Brasil) pela retirada da expressão “Deus seja louvado” das cédulas do real já tem mais de mil adesões. A LiHS congrega céticos, agnósticos, ateus e livres-pensadores em torno de valores éticos. Tem se destacado na defesa do Estado laico. Em dezembro de 2011, o Ministério Público Federal em São Paulo encaminhou ao Banco Central pedido pela supressão das cédulas da frase de cunho religioso. Como resposta, o BC disse que se trata de uma questão da alçada do CMN. Algumas pessoas estão justificando sua adesão à petição, como Henrique Jucá. Ele disse que o Estado brasileiro deve estimular a diversidade, mas não pode privilegiar a divulgação de nenhum credo. Para Natasha Avital, é uma afronta aos brasileiros não cristãos terem de “passar adiante uma profissão de fé” toda vez que usam dinheiro. Rafael Andrade argumentou que, em um Es...

CRP dá 30 dias para que psicóloga deixe de fazer proselitismo religioso

Líder de igreja é acusado de abusar de dezenas de fiéis

Líder religioso confirma que atirador foi da Testemunhas de Jeová

O superintendente do Circuito Rio de Janeiro-07 da Testemunhas de Jeová, Antônio Marcos Oliveira, confirmou ao UOL que Wellington Menezes de Oliveira, o atirador do Realengo, frequentou um templo da religião na Zona Oeste da cidade. Casa do atirador tinha publicações da TJs O líder religioso procurou minimizar esse fato ao ressaltar que Wellington foi seguidor da crença apenas no início de sua adolescência. Ele não disse até que ano Wellington foi um devoto. Na casa do atirador, a polícia encontrou várias publicações editadas pela religião. (foto) Essa foi a primeira manifestação da TJs desde que Wellington invadiu no dia 7 de abril uma escola e matou 12 estudantes e ferindo outros. Oliveira fez as declarações em resposta a um ex-TJ (e suposto amigo do atirador) ouvido pelo UOL. Segundo esse ex-fiel, Wellington se manteve na religião até 2008. Por essa versão, Wellington, que estava com 23 anos, permaneceu na crença até os 20 anos. Ou seja, já era adulto, e não um pré-ad...

Igreja Mundial vende por R$ 91 fronha milagrosa dos sonhos

O pastor Valdemiro Santiago está vendendo por R$ 91 em programas de emissoras de TV e nos templos de sua igreja, a Mundial, fronha milagrosa dos sonhos, para o fiel colocar no travesseiro de drogado, desempregado ou de enfermos. O pagamento é por meio de depósito na conta da Igreja. A entrega é feita pelos Correios. O valor é uma referência ao Salmo 91, que, entre outras coisas, diz: “Não terás medo do terror de noite nem da seta que voa de dia”. O preço do Valdemiro está bem acima do cobrado pelo mercado. Para se ter ideia, o site do Magazine Luiza está oferecendo uma fronha avulsa branca 100% algodão de 70 cm por 50 por R$ 5,73. Pastor recomenda a fronha para drogado e desempregado A arrecadação da fronha milagrosa  — segundo o chefe da Mundial — se destina à “obra de Deus”, que é a construção no Rio da Cidade Mundial, ancorada em 91 colunas. Valdemiro tem aconselhado a quem “não tem conseguido dormir por causa de problemas e dificuldades” a comprar mais de uma fronha. U...