Até 2050, o número mundial de pessoas com lombalgia deve chegar a 843 milhões, segundo a OMS; ortopedista alerta para cuidados antes de iniciar atividade
Fernanda Bassette
A dor lombar crônica é a queixa mais comum nos consultórios de ortopedia: estima-se que oito em cada 10 pessoas terão no mínimo um episódio pelo menos uma vez na vida. Diante de uma escassez de tratamentos eficazes e da dependência contínua de acompanhamento e cuidados de saúde, a busca por intervenções preventivas é crescente.
É por isso que o ortopedista ressalta a importância de uma supervisão profissional médica, fisioterápica ou de um educador físico nessa transição do sedentarismo para o início da atividade física. “É preciso ter um olhar mais de perto para esse paciente com dor lombar crônica. Para muitos, é difícil incluir a atividade física na rotina. Quando ele ultrapassa essa primeira barreira e decide se exercitar, esse início pode causar dores. Isso pode ser um fator desestimulante e fazê-lo desistir”, alerta o ortopedista.
Cada caso é um caso
A caminhada é a solução para todo caso de dor lombar? Nem sempre. De acordo com Lenza, existem casos de lombalgia mais específicos, que podem depender de tratamento cirúrgico. Os mais urgentes, com sintomas neurológicos, são chamados de síndrome da cauda equina, caracterizada por dor lombar acompanhada de perda de força progressiva, alterações esfincterianas e dormência. Esses precisam ser operados para descompressão dos nervos em até 48 horas para uma boa recuperação.
Existem ainda os quadros de hérnia de disco, mais comuns, caracterizados pela perda de força progressiva — eles podem causar um déficit de motricidade dos membros inferiores. Em alguns casos, é preciso cirurgia para corrigir; em outros, a adoção de novos hábitos pode funcionar.
Fernanda Bassette
jornalista
Agência Einstein
serviço de apoio à imprensa na cobertura de saúde e ciência
Agora, um novo estudo publicado na revista científica The Lancet aponta que caminhar regularmente 30 minutos por dia, cinco vezes na semana, é uma boa forma de evitar o problema.
Intitulada WalkBack (caminhar de volta, em tradução livre), a pesquisa foi realizada por cientistas das universidades Macquarie e de Sydney, ambas na Austrália. Para chegar aos resultados, os pesquisadores avaliaram 701 adultos (idade média de 54 anos) que haviam se recuperado recentemente de um episódio de dor lombar baixa — a mais comum que existe, aquela dor na parte de baixo da coluna, entre a última costela e a região glútea.
Intitulada WalkBack (caminhar de volta, em tradução livre), a pesquisa foi realizada por cientistas das universidades Macquarie e de Sydney, ambas na Austrália. Para chegar aos resultados, os pesquisadores avaliaram 701 adultos (idade média de 54 anos) que haviam se recuperado recentemente de um episódio de dor lombar baixa — a mais comum que existe, aquela dor na parte de baixo da coluna, entre a última costela e a região glútea.
Eles relataram muitos episódios anteriores de dor nas costas (de 30 a 36 por participante), sugerindo terem dor lombar crônica, definida como aquela que persiste ou recorre por mais de três meses.
Os participantes foram divididos em dois grupos: um que recebeu orientações de um fisioterapeuta durante seis meses, para estabelecer um programa individualizado e progressivo de caminhada, que fosse adequado às necessidades e preferências de cada um. O outro grupo era controle, ou seja, não recebeu orientações profissionais nem tratamento preventivo — o que reflete a maioria dos casos de pessoas com dor lombar.
Entre os participantes com orientação, foram feitas seis sessões com um fisioterapeuta, que monitorava o progresso e ajudava na solução de possíveis barreiras com o programa de caminhada. O objetivo era auxiliar as pessoas para uma melhor compreensão da dor e reduzir o medo associado à prática de exercícios físicos. Por isso, a ideia dos pesquisadores era que o programa fosse gerenciável: a meta era caminhar 30 minutos por dia, pelo menos cinco vezes na semana, durante seis meses.
Os participantes foram monitorados mensalmente, por até três anos, a depender da data que ingressaram na pesquisa, e foram estimulados a continuar a caminhada mesmo após o término do programa. Nesse período, os pesquisadores coletaram informações sobre novas recorrências de dor lombar, incluindo casos de afastamento do trabalho e uso dos serviços de saúde.
Ao final da análise, os resultados mostraram que o grupo que aderiu ao programa de caminhada demorou, em média, 208 dias para ter uma nova recorrência da dor. Por outro lado, os voluntários do grupo controle tiveram um novo episódio de dor em uma média de 112 dias depois – praticamente metade do tempo.
Diferentes tipos de dor lombar
A lombalgia é uma questão de saúde pública: em 2020, o problema afetava 619 milhões de pessoas (o equivalente a 10% da população mundial) e, até 2050, esse número deve chegar a 843 milhões de indivíduos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com os autores do estudo australiano, a maioria das pesquisas se concentra no tratamento de episódios de dor, não na prevenção de futuras dores — e a caminhada demonstrou ser uma intervenção preventiva acessível e de baixo custo.
Existem diferentes tipos de dores na região lombar, mas elas são divididas basicamente em três: a mais comum é a lombalgia mecânica, que engloba a maioria das condições de coluna e está normalmente associada a problemas de postura; existe também a lombociatalgia, que é a dor lombar que irradia para os membros inferiores devido à compressão de uma raiz dos nervos e costuma estar relacionada às hérnias de disco; por fim, a estenose do canal lombar, caracterizada pelo envelhecimento da região baixa da coluna, pode alterar o canal lombar causando um estreitamento da região por onde passam as raízes nervosas. Essa última costuma atingir mais os idosos e gera dificuldade para caminhar.
De acordo com o ortopedista Mario Lenza, gerente-médico de Ortopedia do Hospital Israelita Albert Einstein, quando a dor lombar não está acompanhada de sintomas neurológicos, o tratamento costuma ser conservador e da forma como os autores do estudo programaram: mudança de estilo de vida e prática de exercícios físicos, de preferência com o acompanhamento de um fisioterapeuta ou educador físico.
Os participantes foram divididos em dois grupos: um que recebeu orientações de um fisioterapeuta durante seis meses, para estabelecer um programa individualizado e progressivo de caminhada, que fosse adequado às necessidades e preferências de cada um. O outro grupo era controle, ou seja, não recebeu orientações profissionais nem tratamento preventivo — o que reflete a maioria dos casos de pessoas com dor lombar.
Entre os participantes com orientação, foram feitas seis sessões com um fisioterapeuta, que monitorava o progresso e ajudava na solução de possíveis barreiras com o programa de caminhada. O objetivo era auxiliar as pessoas para uma melhor compreensão da dor e reduzir o medo associado à prática de exercícios físicos. Por isso, a ideia dos pesquisadores era que o programa fosse gerenciável: a meta era caminhar 30 minutos por dia, pelo menos cinco vezes na semana, durante seis meses.
Os participantes foram monitorados mensalmente, por até três anos, a depender da data que ingressaram na pesquisa, e foram estimulados a continuar a caminhada mesmo após o término do programa. Nesse período, os pesquisadores coletaram informações sobre novas recorrências de dor lombar, incluindo casos de afastamento do trabalho e uso dos serviços de saúde.
Ao final da análise, os resultados mostraram que o grupo que aderiu ao programa de caminhada demorou, em média, 208 dias para ter uma nova recorrência da dor. Por outro lado, os voluntários do grupo controle tiveram um novo episódio de dor em uma média de 112 dias depois – praticamente metade do tempo.
Diferentes tipos de dor lombar
A lombalgia é uma questão de saúde pública: em 2020, o problema afetava 619 milhões de pessoas (o equivalente a 10% da população mundial) e, até 2050, esse número deve chegar a 843 milhões de indivíduos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com os autores do estudo australiano, a maioria das pesquisas se concentra no tratamento de episódios de dor, não na prevenção de futuras dores — e a caminhada demonstrou ser uma intervenção preventiva acessível e de baixo custo.
Existem diferentes tipos de dores na região lombar, mas elas são divididas basicamente em três: a mais comum é a lombalgia mecânica, que engloba a maioria das condições de coluna e está normalmente associada a problemas de postura; existe também a lombociatalgia, que é a dor lombar que irradia para os membros inferiores devido à compressão de uma raiz dos nervos e costuma estar relacionada às hérnias de disco; por fim, a estenose do canal lombar, caracterizada pelo envelhecimento da região baixa da coluna, pode alterar o canal lombar causando um estreitamento da região por onde passam as raízes nervosas. Essa última costuma atingir mais os idosos e gera dificuldade para caminhar.
De acordo com o ortopedista Mario Lenza, gerente-médico de Ortopedia do Hospital Israelita Albert Einstein, quando a dor lombar não está acompanhada de sintomas neurológicos, o tratamento costuma ser conservador e da forma como os autores do estudo programaram: mudança de estilo de vida e prática de exercícios físicos, de preferência com o acompanhamento de um fisioterapeuta ou educador físico.
“Os resultados deste estudo confirmam, de maneira científica, os conselhos dos nossos avós: caminhar faz bem. Eles conseguiram provar aquilo que os médicos sempre recomendaram, que a caminhada efetivamente melhora os episódios de lombalgia crônica”, analisa Lenza.
Mas, apesar de a caminhada ser um exercício teoricamente simples e fácil de ser adotado, existem cenários que precisam ser levados em consideração, especialmente para aqueles pacientes com dor crônica que são sedentários. Nesses casos, incluir uma atividade física no dia a dia pode não ser indicado imediatamente e, mais que isso, trazer outros episódios de dor.
Sem acompanhamento adequado, aliás, há o risco até de se machucar. “Quem nunca caminhou precisa de orientação sobre como aquecer, como andar, qual o calçado adequado, entre outras coisas.”
Mas, apesar de a caminhada ser um exercício teoricamente simples e fácil de ser adotado, existem cenários que precisam ser levados em consideração, especialmente para aqueles pacientes com dor crônica que são sedentários. Nesses casos, incluir uma atividade física no dia a dia pode não ser indicado imediatamente e, mais que isso, trazer outros episódios de dor.
Sem acompanhamento adequado, aliás, há o risco até de se machucar. “Quem nunca caminhou precisa de orientação sobre como aquecer, como andar, qual o calçado adequado, entre outras coisas.”
É por isso que o ortopedista ressalta a importância de uma supervisão profissional médica, fisioterápica ou de um educador físico nessa transição do sedentarismo para o início da atividade física. “É preciso ter um olhar mais de perto para esse paciente com dor lombar crônica. Para muitos, é difícil incluir a atividade física na rotina. Quando ele ultrapassa essa primeira barreira e decide se exercitar, esse início pode causar dores. Isso pode ser um fator desestimulante e fazê-lo desistir”, alerta o ortopedista.
Cada caso é um caso
A caminhada é a solução para todo caso de dor lombar? Nem sempre. De acordo com Lenza, existem casos de lombalgia mais específicos, que podem depender de tratamento cirúrgico. Os mais urgentes, com sintomas neurológicos, são chamados de síndrome da cauda equina, caracterizada por dor lombar acompanhada de perda de força progressiva, alterações esfincterianas e dormência. Esses precisam ser operados para descompressão dos nervos em até 48 horas para uma boa recuperação.
Existem ainda os quadros de hérnia de disco, mais comuns, caracterizados pela perda de força progressiva — eles podem causar um déficit de motricidade dos membros inferiores. Em alguns casos, é preciso cirurgia para corrigir; em outros, a adoção de novos hábitos pode funcionar.
“Existe uma tendência de tentar resolver rapidamente um problema de coluna com cirurgia. Talvez, essas dores possam ser resolvidas com uma boa orientação de caminhada, fisioterapia e com a adesão do paciente. Quem sabe seja preciso insistir um pouco mais nesse programa de tratamento e de mudanças de estilo de vida, que é fundamental e relativamente simples”, diz o especialista.
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