Pular para o conteúdo principal

Pseudoterapias, estresse e câncer: uma combinação perigosa, fuja disso

Tendências médicas que afirmam ter evidências científicas que corroboram o absurdo, como biodecodificação e constelações familiares


Gulhermo López Lluch 
professor na área de biologia, pesquisador em metabolismo do envelhecimento, Universidade de Pablo de Olavide, Espanha 

The Conversationl
plataforma de informação produzida por acadêmicos e jornalistas

O mundo da pseudociência está repleto de mensagens errôneas que indicam que nossos sofrimentos podem ser encontrados em experiências traumáticas anteriores.

Adornam-no com uma série de palavras estranhas e esotéricas que parecem conter algo importante como “bioneuroemoção”, “biodecodificação”, “constelações familiares”, “nova medicina germânica”… 

O maior problema de todas essas correntes pseudocientíficas é que negam a natureza biológica das nossas doenças. E, entre eles, o do câncer.

Vamos dar uma rápida olhada nesta constelação de absurdos.

Estresse como álibi para uma infinidade de pseudoterapias

Tal como acontece com todas as pseudociências, há sempre um grão de verdade que faz com que estes movimentos pareçam basear-se em algum conhecimento científico. A base que todos compartilham é o estresse psicológico e físico.

É verdade que muitos estudos associam o estresse ao agravamento de múltiplas doenças, principalmente as crônicas. E podemos afirmar que o início e o desenvolvimento de certos tipos de câncer são alimentados de certa forma pelo estresse, mas por um estresse muito diferente: aquele que é mediado por desequilíbrios celulares associados a danos oxidativos, infecções virais, danos por substâncias nocivas ou desequilíbrio hormonal, entre outros.

Mas não é nisso que essas pseudoterapias estão interessadas. De acordo com a biodecodificação, o câncer é causado por um conflito biológico muito intenso, no qual o manejo do estresse não resultou em um sintoma leve. Alguém realmente entende o que exatamente isso significa?

Poderíamos interpretar isso como se o estresse que causou o câncer pudesse ter sido mais benigno e causado menos danos. Nesse caso, a transformação que fez com que uma célula acabasse virando câncer não teria sido gerada. Sim, é lógico, mas como podemos reverter isso após ocorrido? É aí que reside o problema: remover o estresse não fará com que as células cancerígenas voltem ao normal. Isso não vai acontecer.

Segundo algumas fontes, a biodecodificação postula que cada tipo de tumor corresponde a um conflito específico. Portanto, não estamos falando de estresse biológico, mas sim de questões psicológicas que nada têm a ver com a causa da doença.

Assim, o câncer de pulmão teria a ver com o medo de morrer e suponho que não teria nada a ver com o fumo ou a poluição. O câncer de fígado ocorre com a falta de alimentação e não com o consumo de álcool, hepatite ou dietas desequilibradas. E o rim com a solidão ou o abandono e não com a função principal do rim, que é filtrar todas as toxinas do corpo.


As pseudoterapias são
mais perigosas do que
se imagina porque podem
impedir que as pessoas
usem o tratamento
adequado para sua doença

Sem cabeça ou cauda

Como você compreenderá, essas relações entre o câncer e a vida normal não têm importância do ponto de vista científico. As causas do câncer estão nos danos causados ​​ao DNA das células por agentes físicos, químicos ou biológicos, e nada mais.

Mas não faltam tendências médicas que afirmam ter evidências científicas que corroboram o absurdo. O médico alemão Ryke Geerd Hamer é considerado o pai da chamada Nova Medicina Germânica. 

Segundo essa corrente, Hamer demonstrou em 1981, por meio de uma simples tomografia cerebral, que podem ser observadas alterações em áreas específicas do cérebro causadas pelo impacto emocional. O curioso do caso é que o bom médico não parece ter deixado para depois a literatura científica publicada, mas sim as suas próprias experiências e as de outros pacientes.

Desse conceito de sofrimento causador do câncer e de outras doenças, surgem outros níveis, como as chamadas constelações familiares. Essa pseudoterapia baseia-se no fato de que muitos dos nossos conflitos vêm das relações familiares, portanto, descobrir esses conflitos seria a chave para evitar e até curar o câncer.

A questão é como e onde encontramos a bioneuroemoção, que consiste em terapias de relaxamento e meditação que levam à assunção de conflitos. Isso fará com que o estresse que sofremos e esses pensamentos prejudiciais desapareçam. E, com eles, o câncer.

O estresse que causa câncer

Como já mencionei, existe uma relação entre estresse biológico e câncer. Originalmente, agentes físicos — como os raios X ou ultravioleta —, agentes químicos — como muitas substâncias que interagem com o DNA — ou agentes biológicos — como os vírus — causam danos ao DNA e provocam mutações que acabam produzindo transformação celular e levam ao câncer.

Ainda mais tarde, as células cancerosas causam estresse em seu ambiente para crescerem melhor. Assim como os alienígenas dos filmes que invadem a Terra, modificando o ambiente conforme sua conveniência, as células cancerígenas modificam o ambiente em que se encontram, liberando substâncias como o lactato, que geram estresse metabólico. Isso faz com que, entre outras coisas, as células cancerígenas possam crescer melhor, eliminando as células normais, alimentando-se melhor, gerando novos vasos sanguíneos e evitando o ataque do sistema imunológico.

Mesmo diferentes compostos liberados pelas células cancerígenas modificam a atividade dos macrófagos, a fim de melhorar as condições para o crescimento do tumor. Esses macrófagos possuem perfil pró-inflamatório que afeta a atividade de outras células, incluindo linfócitos que deveriam ser capazes de atacar e eliminar células tumorais.

Outro componente é o estresse oxidativo, bastante conhecido em tratamentos antioxidantes que funcionam para tudo. O problema do estresse oxidativo é que ele é uma faca de dois gumes em relação ao câncer. Pode ser usado como terapia para eliminar células, mas também é um fator importante para causar sua transformação em tumores.

As pseudoterapias são muito perigosas, especialmente quando se tem câncer.

Como você viu, os hábitos de vida e a exposição a agentes de todos os tipos que não podemos evitar podem nos afetar seriamente. O stress crônico da vida quotidiana pode agravar o efeito destes agentes e pode obviamente ser importante no caso do câncer, embora não seja de todo claro. 

Obviamente, encarar a doença de uma forma mais positiva pode ajudar a reduzir os efeitos nocivos do estresse crônico, mas culpar a família ou o fato de termos medo de alguma coisa não é solução.

Não se deixem enganar: as pseudoterapias, qualquer uma delas, até mesmo a homeopatia, colocam em risco os pacientes que, na tentativa de combater o câncer, se jogam nos braços de quem lhes abre uma porta de esperança, abandonando a medicina que funciona e ataca o câncer. da forma mais específica, o medicamento que conhece as causas e aborda cada tipo de câncer com o tratamento mais eficaz.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

Dawkins é criticado por ter 'esperança' de que Musk não seja tão estúpido como Trump

Tibetanos continuam se matando. E Dalai Lama não os detém

O Prêmio Nobel da Paz é "neutro" em relação às autoimolações Stephen Prothero, especialista em religião da Universidade de Boston (EUA), escreveu um artigo manifestando estranhamento com o fato de o Dalai Lama (foto) se manter neutro em relação às autoimolações de tibetanos em protesto pela ocupação chinesa do Tibete. Desde 16 de março de 2011, mais de 40 tibetanos se sacrificaram dessa dessa forma, e o Prêmio Nobel da Paz Dalai Lama nada fez para deter essa epidemia de autoimolações. A neutralidade, nesse caso, não é uma forma de conivência, uma aquiescência descompromissada? Covardia, até? A própria opinião internacional parece não se comover mais com esse festival de suicídios, esse desprezo incandescente pela vida. Nem sempre foi assim, lembrou Prothero. Em 1963, o mundo se comoveu com a foto do jornalista americano Malcolm Wilde Browne que mostra o monge vietnamita Thich Quang Duc colocando fogo em seu corpo em protesto contra a perseguição aos budistas pelo

Proibido o livro do padre que liga a umbanda ao demônio

Padre Jonas Abib foi  acusado da prática de  intolerância religiosa O Ministério Público pediu e a Justiça da Bahia atendeu: o livro “Sim, Sim! Não, Não! Reflexões de Cura e Libertação”, do padre Jonas Abib (foto), terá de ser recolhido das livrarias por, nas palavras do promotor Almiro Sena, conter “afirmações inverídicas e preconceituosas à religião espírita e às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé, além de flagrante incitação à destruição e ao desrespeito aos seus objetos de culto”. O padre Abib é ligado à Renovação Carismática, uma das alas mais conservadoras da Igreja Católica. Ele é o fundador da comunidade Canção Nova, cuja editora publicou o livro “Sim, Sim!...”, que em 2007 vendeu cerca de 400 mil exemplares, ao preço de R$ 12,00 cada um, em média. Manuela Martinez, da Folha, reproduz um trecho do livro: "O demônio, dizem muitos, "não é nada criativo". (...) Ele, que no passado se escondia por trás dos ídolos, hoje se esconde no

Condenado por estupro, pastor Sardinha diz estar feliz na cadeia

Pastor foi condenado  a 21 anos de prisão “Estou vivendo o melhor momento de minha vida”, diz José Leonardo Sardinha (foto) no site da Igreja Assembleia de Deus Ministério Plenitude, seita evangélica da qual é o fundador. Em novembro de 2008 ele foi condenado a 21 anos de prisão em regime fechado por estupro e atentado violento ao pudor. Sua vítima foi uma adolescente que, com a família, frequentava os cultos da Plenitude. A jovem gostava de um dos filhos do pastor, mas o rapaz não queria saber dela. Sardinha então disse à adolescente que tinha tido um sonho divino: ela deveria ter relações sexuais com ele para conseguir o amor do filho, e a levou para o motel várias vezes. Mas a ‘profecia’ não se realizou. O Sardinha Jr. continuou não gostando da ingênua adolescente. No texto publicado no site, Sardinha se diz injustiçado pela justiça dos homens, mas em contrapartida, afirma, Deus lhe deu a oportunidade de levar a palavra Dele à prisão. Diz estar batizando muita gen

Veja os 10 trechos mais cruéis da Bíblia

Profecias de fim do mundo

O Juízo Final, no afresco de Michangelo na Capela Sistina 2033 Quem previu -- Religiosos de várias épocas registraram que o Juízo Final ocorrerá 2033, quando a morte de cristo completará 2000. 2012 Quem previu – Religiosos e teóricos do apocalipse, estes com base no calendário maia, garantem que o dia do Juízo Final ocorrerá em dezembro, no dia 21. 2011 Quem previu – O pastor americano Harold Camping disse que, com base em seus cálculos, Cristo voltaria no dia 21 de maio, quando os puros seriam arrebatados e os maus iriam para o inferno. Alguns desastres naturais, como o terremoto seguido de tsunami no Japão, serviram para reforçar a profecia. O que ocorreu - O fundador do grupo evangélico da Family Radio disse estar "perplexo" com o fato de a sua profecia ter falhado. Ele virou motivo de piada em todo o mundo. Camping admitiu ter errado no cálculo e remarcou da data do fim do mundo, que será 21 de outubro de 2011. 1999 Quem previu – Diversas profecias

TJs perdem subsídios na Noruega por ostracismo a ex-fiéis. Duro golpe na intolerância religiosa

Santuário Nossa Senhora Aparecida fatura R$ 100 milhões por ano

Basílica atrai 10 milhões de fiéis anualmente O Santuário de Nossa Senhora de Aparecida é uma empresa da Igreja Católica – tem CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) – que fatura R$ 100 milhões por ano. Tudo começou em 1717, quando três pescadores acharam uma imagem de Nossa Senhora no rio Paraíba do Sul, formando-se no local uma vila que se tornou na cidade de Aparecida, a 168 km de São Paulo. Em 1984, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) concedeu à nova basílica de Aparecida o status de santuário, que hoje é uma empresa em franca expansão, beneficiando-se do embalo da economia e do fortalecimento do poder aquisitivo da população dos extratos B e C. O produto dessa empresa é o “acolhimento”, disse o padre Darci José Nicioli, reitor do santuário, ao repórter Carlos Prieto, do jornal Valor Econômico. Para acolher cerca de 10 milhões de fiéis por ano, a empresa está investindo R$ 60 milhões na construção da Cidade do Romeiro, que será constituída por trê